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segunda-feira, 10 de junho de 2013

Tagore e Nossa Senhora


in Wikipédia
Tu és infinitivamente variada no exuberante mundo, Senhora da Múltipla Magnificência. O teu caminho está regado com luzes, o teu contacto palpita em mil flores, a cauda do teu vestido gira em remoinhos de dança em meio às estrelas, e a tua música de inumeráveis tons ecoa sinais e cores em mundos sem conta.
És solitária e única na insondável quietude da alma, Senhora do Silêncio e da Solidão. Tu és uma visão palpitante de luz, um solitário lótus desabrochado no talo do amor.
Rabindranath Tagore
in, A Fugitiva
Tagore é um poeta místico, natural da Índia milenar, país com uma grande diversidade religiosa alicerçada sobre um hinduísmo politeísta entroncado na ancestral cultura védica, tendo sofrido no decorrer dos séculos XIII a XIX, influências estranhas que tiveram a sua origem com a dominação muçulmana, entre os anos 1200 e 1757 e, depois, com a dominação britânica, de 1757 a 1947, que deram origem a inúmeras variantes de religiosidade.
Esta Senhora da Múltipla Magnificência que a pena de Tagore esculpiu é, sem dúvida, guardadas as diferenças de cultura e de ordem filosófico-teológico,  uma alusão à Mãe universal – considerada para o hinduísmo uma deusa salvadora – que terá influenciado o filósofo indiano S. Radhakrishnan ([1]) a dizer  que a experiência de Deus é psicologicamente mediada e, na mesma linha assenta a reflexão de Mahatma Gandhi, ao afirmar solenemente: acredito na verdade fundamental de todas as grandes religiões do mundo. Acredito que todas elas foram inspiradas por Deus, e que eram necessárias para os povos a quem foram reveladas.
Tagore, para além de poeta de um misticismo contagiante, foi um homem de cultura diversificada - contista, dramaturgo e crítico de arte hindu – e que ao prosseguir a orientação do pai, o reformador  Devendranath Tagore,  honrou o passado de uma  família de  brilhantes líderes religiosos e sociais que a todo custo procuraram libertar a Índia dos preconceitos milenares que esmagavam o povo, devendo-se-lhe a fundação de uma escola de filosofia em  Santiniketan – mais tarde, Universidade - destinada a encorajar um encontro do Ocidente com o Oriente que facilitasse uma síntese criativa das artes e das ciências, com vista ao desenvolvimento do país
Tendo oferecido ao mundo uma mensagem humanitária e universalista, entende-se que ao dirigir-se à Senhora da Múltipla Magnificência, nos leve a concluir que aquela Senhora que o poeta descreve como tendo o caminho regado com luzes, tinha na sua alma mística, similitudes com Nossa Senhora, Mãe de Deus, solitária e única na insondável quietude da alma, levando em linha de conta que ela guardava tudo no seu coração, de acordo com os Evangelhos, numa profunda quietude da alma, que fez dela a Senhora do Silêncio e da Solidão.
No seu livro “O Coração de Deus” sem deixar de tecer o seu amor pelo hinduísmo e, até, a sua reverência a Buddha, não deixa de ter presente um fraterno respeito por Jesus, de que é exemplo uma poesia a que chamou:
Uma Parábola
Eu mendigava de porta em porta,
pelo caminho da aldeia,
quando um carro de ouro surgiu à distância
e parecia um sonho esplêndido.
Perguntei a mim mesmo quem seria esse Rei de todos os reis.
Minhas esperanças subiram ao céu.
Eu pensava: terminaram os meus dias nefastos.
E tive esperança de esmolas espontâneas e de riquezas soltas na areia.
O carro parou onde eu estava.
Ele me olhou e disse sorrindo.
Eu senti que afinal chegara o dia da minha felicidade.
E de repente estendeu-me a mão direita, perguntando:
 "Que tens para mim?"
Ah, teu gesto real de estender a mão direita a um mendigo!
Confuso, perplexo, meti a mão na sacola
 e, devagar, retirei um pequeno grão de trigo, que lhe ofereci.
Mas, à tardinha, foi enorme a minha surpresa.
Esvaziando a minha sacola,
vi um grão de ouro entre os de trigo.
Chorei lágrimas amargas e lamentando-me dizia:
"Por que não lhe dei tudo?"
É por esta magia de palavras entretecidas de um amor profundo pela divindade, que somos levados a concluir que na alma de Tagore,  a Mãe de Jesus,  viveu no seu pensamento por um outro prisma, que não sendo o do católico, tinha nele a auréola de ser uma visão palpitante de luz, como de facto foi a vida de Nossa Senhora.
Rendido à sua majestade da Rainha do Céu, Tagore,  havia de a chamar, por um nome que nenhum cristão até hoje lhe chamou: um solitário lótus desabrochado no talo do amor, linguagem muito própria dos hindus que têm pelo lótus - o nenúfar que fecha ao anoitecer e se submerge na água para submergir e voltar a florir sempre que amanhece -  um carinho sagrado, como ele confessa ter por aquela que sendo infinitivamente variada no exuberante mundo, mantém na unidade que ela representa uma música de inumeráveis tons, onde a eterna canção do amor humano se funde num amplexo enternecido com o amor divino de que Jesus.
Ele que é o expoente maior dessa dádiva, tornou-se na alma do poeta esse Rei de todos os reis, como lhe chamam todos os católicos e Tagore, que não se furtou a tratar deste modo o Filho excelso daquela a quem apelidou de Senhora da Múltipla Magnificência, uma variação diferente das múltiplas invocações porque é conhecida a Mãe de Jesus entre os católicos.

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