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Tu és
infinitivamente variada no exuberante mundo, Senhora da Múltipla Magnificência.
O teu caminho está regado com luzes, o teu contacto palpita em mil flores, a
cauda do teu vestido gira em remoinhos de dança em meio às estrelas, e a tua
música de inumeráveis tons ecoa sinais e cores em mundos sem conta.
És solitária e única na insondável quietude da alma,
Senhora do Silêncio e da Solidão. Tu és uma visão palpitante de luz, um
solitário lótus desabrochado no talo do amor.
Rabindranath Tagore
in, A Fugitiva
Tagore é um poeta
místico, natural da Índia milenar, país com uma grande diversidade religiosa
alicerçada sobre um hinduísmo politeísta entroncado na ancestral cultura
védica, tendo sofrido no decorrer dos séculos XIII a XIX, influências estranhas
que tiveram a sua origem com a dominação muçulmana, entre os anos 1200 e 1757
e, depois, com a dominação britânica, de 1757 a 1947, que deram origem a inúmeras
variantes de religiosidade.
Esta Senhora da Múltipla Magnificência que a
pena de Tagore esculpiu é, sem dúvida, guardadas as diferenças de cultura e de
ordem filosófico-teológico, uma alusão à
Mãe universal – considerada para o hinduísmo uma deusa salvadora – que terá
influenciado o filósofo indiano S. Radhakrishnan ([1])
a dizer que a experiência de Deus é psicologicamente mediada e, na mesma linha
assenta a reflexão de Mahatma Gandhi, ao afirmar solenemente: acredito na verdade fundamental de todas as
grandes religiões do mundo. Acredito que todas elas foram inspiradas por Deus,
e que eram necessárias para os povos a quem foram reveladas.
Tagore, para além de
poeta de um misticismo contagiante, foi um homem de cultura diversificada -
contista, dramaturgo e crítico de arte hindu – e que ao prosseguir a orientação
do pai, o reformador Devendranath
Tagore, honrou o passado de uma família de
brilhantes líderes religiosos e sociais que a todo custo procuraram
libertar a Índia dos preconceitos milenares que esmagavam o povo,
devendo-se-lhe a fundação de uma escola de filosofia em Santiniketan – mais tarde, Universidade -
destinada a encorajar um encontro do Ocidente com o Oriente que facilitasse uma
síntese criativa das artes e das ciências, com vista ao desenvolvimento do país
Tendo oferecido ao
mundo uma mensagem humanitária e universalista, entende-se que ao dirigir-se à Senhora da Múltipla Magnificência, nos
leve a concluir que aquela Senhora que o poeta descreve como tendo o caminho regado com luzes, tinha na sua alma
mística, similitudes com Nossa Senhora, Mãe de Deus, solitária e única na insondável quietude da alma, levando em linha
de conta que ela guardava tudo no seu coração, de acordo com os Evangelhos,
numa profunda quietude da alma, que
fez dela a Senhora do Silêncio e da
Solidão.
No seu livro “O Coração
de Deus” sem deixar de tecer o seu amor pelo hinduísmo e, até, a sua reverência
a Buddha, não deixa de ter presente um fraterno respeito por Jesus, de que é
exemplo uma poesia a que chamou:
Uma Parábola
Eu mendigava de porta em porta,
pelo caminho da aldeia,
quando um carro de ouro surgiu à distância
e parecia um sonho esplêndido.
Perguntei a mim mesmo quem seria esse Rei de todos os reis.
Minhas esperanças subiram ao céu.
Eu pensava: terminaram os meus dias nefastos.
E tive esperança de esmolas espontâneas e de riquezas
soltas na areia.
O carro parou onde eu estava.
Ele me olhou e disse sorrindo.
Eu senti que afinal chegara o dia da minha felicidade.
E de repente estendeu-me a mão direita, perguntando:
"Que tens para
mim?"
Ah, teu gesto real de estender a mão direita a um mendigo!
Confuso, perplexo, meti a mão na sacola
e, devagar, retirei
um pequeno grão de trigo, que lhe ofereci.
Mas, à tardinha, foi enorme a minha surpresa.
Esvaziando a minha sacola,
vi um grão de ouro entre os de trigo.
Chorei lágrimas amargas e lamentando-me dizia:
"Por que não lhe dei tudo?"
É por esta magia de
palavras entretecidas de um amor profundo pela divindade, que somos levados a
concluir que na alma de Tagore, a Mãe de
Jesus, viveu no seu pensamento por um
outro prisma, que não sendo o do católico, tinha nele a auréola de ser uma visão palpitante de luz, como de
facto foi a vida de Nossa Senhora.
Rendido à sua majestade
da Rainha do Céu, Tagore, havia de a
chamar, por um nome que nenhum cristão até hoje lhe chamou: um solitário lótus desabrochado no talo do
amor, linguagem muito própria dos hindus que têm pelo lótus - o nenúfar que
fecha ao anoitecer e se submerge na água para submergir e voltar a florir
sempre que amanhece - um carinho
sagrado, como ele confessa ter por aquela que sendo infinitivamente variada no exuberante mundo, mantém na unidade que
ela representa uma música de inumeráveis
tons, onde a eterna canção do amor humano se funde num amplexo enternecido
com o amor divino de que Jesus.
Ele que é o expoente
maior dessa dádiva, tornou-se na alma do poeta esse Rei de todos os reis, como
lhe chamam todos os católicos e Tagore, que não se furtou a tratar deste modo o
Filho excelso daquela a quem apelidou de Senhora
da Múltipla Magnificência, uma variação diferente das múltiplas invocações
porque é conhecida a Mãe de Jesus entre os católicos.
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