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segunda-feira, 17 de junho de 2013

O vento ajuda quem canta melhor!



Desde os tempos da meninice, em Itabuna, bem perto da costa atlântica, Jorge Amado viveu com as gentes do cais, que ele honrou, sobremaneira, nas histórias que ouviu e conheceu na Baía de Todos os Santos, onde o Oceano Atlântico se recolhe e como que morre, num recôncavo natural que é o seu abraço salgado à terra baiana, imortalizada nesse belo poema em prosa que é o livro Mar Morto.

Nele, o celebrado autor relata a  historia de muitos homens e mulheres, mas tem o fulcro principal em Guma e Lívia, que encarnam na trama do romance a vida do cais, do mar e das embarcações que nas suas rotas escondiam as idílicas cenas de amor dos velhos canoneiros e mestres de saveiros.

Guma era um experimentado marinheiro. Era dono do “Valente”, o saveiro que conhecia todos os segredos da baía e do Mar Grande; no entanto, aconteceu, um dia, ter perdido uma corrida para o saveiro “Viajante sem Porto”, numa aposta que Guma fizera com Manuel, o mestre daquela embarcação.
Com desejo da desforra, na véspera do dia aprazado, Guma abeirou-se de Lívia deste jeito:

-Tu quer ir comigo amanhã (...) é uma aposta que a gente fez. Uma vez a gente apostou corrida, ele ganhou (...) e tu vai cantar para “Valente” correr...

- E adianta cantar? sorriu ela.

- Tu não sabe? O vento ajuda quem canta melhor.


E aconteceu que no dia da corrida, a caminho de Itaparica, a ilha que é uma mancha verde no amar azul, o “Valente” ganhou a corrida.
Conta, agora, reflectir um pouco em cima desta historia do cais, que é, no seu lirismo puro uma bela história do amor que unia aqueles dois seres.
Guma era considerado um herói pela gente da beira cais, mas naquele dia tão importante para si, não prescindiu de levar consigo a mulher que ele amava e, sobretudo, do seu canto, porque a sua fé e o amor que tinha por ela, lhe segredava que o vento ajuda quem canta melhor.

É sempre assim o amor verdadeiro. Faz milagres, ao contrário do amor – se assim se pode chamar  àquele sentimento lascivo, tão em moda nos nossos tempos e, infelizmente, tão impróprio para a concertação do mundo -  de tão às avessas que se apresenta e tão contrário à crença daquele mestre de saveiro que amava a mulher e o seu modo de cantar, de tal modo, que indo com ele, o vento – segundo a sua fé - o ajudaria na corrida com o seu rival, Manuel.
Importa, retirar da história de Jorge Amado, esta ilação importante: na vida do homem, do homem de todos os tempos, a mulher sempre teve – e tem de continuar a ter  - esse papel fundamental de perpetuar entre os dois, a centelha do amor ardente provinda da velha crença que um e outro, são entre si, a cara-metade, que unida para a vida, faz do todo uma força poderosa e imbatível.

É um poder gigantesco, capaz de arrostar com todos os perigos do mundo, gerando milagres de fé no destino que faz de ambos os agentes da vida, seres capazes de a viver contra todos os perigos e percalços.
A fé na mulher e no seu canto que serve para embalar os filhos e adocicar a vida, é a parte angelical de todo o par enamorado pela vida, com a serenidade de quem sabe que hão-de chegar ao porto sonhado, como aconteceu com Guma e Lívia, os dois embarcados na vida e, naquele dia, no saveiro, para ganharem a corrida. Em cima do “Valente” o mestre do saveiro contornou todos os perigos do mar ao ouvir o canto da mulher amada, que era na corrida, a força que o empurrava para a vitória.

É esta a moral da história e a sua parte mais importante.
Devia servir-nos para que dela retirássemos o encanto e o carinho que nos devem merecer todas aquelas mulheres que verdadeiramente caminham ao lado dos homens, cantando e sofrendo às vezes, mas sem deixar de fazer nunca das horas menos boas um canto de amor ao encontro de cantos melhores que a vida sempre tem.
Lívia é um exemplo, Guma é uma força e, os dois, um  amor ganhador.

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