Nota: Este texto tem alguns anos, mas a violência que foi o retirar das salas de aula dos Crucifixos no tempo do primeiro governo de José Sócrates, ainda hoje, assinala o desaforo que constituiu a afronta feita aos católicos portugueses de, como foi possível ter existido em Portugal o desprezo de certos homens públicos pelo símbolo maior de uma crença que mudou o mundo e ajudou à fraternidade universal, razão, porque, este texto não poderá jamais ser ignorado pela minha consciência que um dia o ditou e o no tempo o fez publicar.
Que a Democracia é o melhor sistema político, ninguém tenha
dúvidas.
E, porque é assim, bem
merece, que sobre ela se faça um pouco da sua história, porque o título desta
crónica – embora o não pareça tem muito
a ver com este sistema político – parecendo-nos que a recente invectiva governamental
contra o Crucifixo devia ter merecido a atenção democrática de um Estado que se
afirma laico, mas que não pode esquecer valores nacionais, sejam ou não
religiosos, porque aquela parte do povo que se afirma laica é uma minoria e não
pode nem deve esquecer a outra, que é maioritária, porque ao fazê-lo, a
democracia sai feriada, pela simples razão de não se respeitar a maior parte.
Mas vamos a um pouco de história. A democracia começou
no tempo em que a cidade de Atenas, a mais evoluída das cidades-estados (1)
da Grécia Ocidental era governada pelo regime tirânico de Pisístrato (2)
que tomara o poder ilegalmente, exercendo um poder oligárquico.
Apesar de fazer cumprir os códigos de Sólon (3)
o seu poder ditatorial continuado em 527 a .C. pelos seus dois filhos Hípias e
Hiparco, foi extinto a partir do assassinato de Hiparco por dois jovens, Amódio
e Aristógiton - heróis gregos da
Democracia que a História conhece como os
“tiranicidas” e cujo acto extremo levou à fuga de Hípias para a Pérsia,
abrindo o caminho a que o “Partido dos Ricos” chefiado por Iságoras e o dos
populares, chefiado por Clístenes passassem a disputar entre si o controle
político da pólis, até ao momento em que Iságoras, que era apoiado por
Cleómenes – rei de Esparta – conseguiu desterrar o seu rival, Cleómenes.
Valeu neste passo, o povo, que tendo-se revoltado,
trouxe de volta o seu líder a quem foram dados poderes constituintes com o fim
de se experimentar algo que era inédito: o regime governado directamente pela
vontade maioritária do povo: A Democracia.
Em traços larguíssimos esta é a história dos primeiros
passos democráticos e que levaria Péricles (4)
a declarar: Vivemos sob a forma de governo que não se baseia nas
instituições de nossos vizinhos; ao contrário, servimos de modelo a alguns ao
invés de imitar os outros. Seu nome, como tudo o que depende não de poucos mas
da maioria, é democracia.
O que veio a seguir,
é que importa, sobretudo, o tempo actual, onde o modelo da democracia ateniense
deu lugar às mais diversas, como a nossa, que tem 30 anos e ainda tem muito
caminho a percorrer para ser um regime puro, sem recorrer a atitudes que deixem
ficar no povo dúvidas quanto à clareza das intenções confinadas a atitudes
exercidas, ainda que pela força do voto.
Vem isto a propósito
da recente medida do Governo em mandar retirar das Escolas estatais o
Crucifixo. (nota: ver a data do texto em rodapé)
Porquê?
-- Não será que o Crucifixo faz parte do património
cultural do povo português que ao longo da sua História viveu com ele?
Faz e vejamos porquê: Os simples Crucifixos mandados
retirar pelo Governo integram-se na memória colectiva do povo português em
honra à Cruz do Calvário que foi a inspiradora da cruz que andou nas caravelas
e nas naus dos Descobrimentos e está, ainda hoje, nalguns lados erecta nos
padrões que assinalam a chegada dos nautas e em muitos dos monumentos nacionais
cinzelada nas cantarias.
Por outro lado, bem recentemente, a Assembleia da
República, no tempo do Governo do Eng. António Guterres fez aprovar o seguinte
Diploma:
DATA: Sábado, 8 de Setembro de 2001
NÚMERO: 209/01 SÉRIE I-A
EMISSOR: Assembleia da República
DIPLOMA/ACTO: Lei n.º 107/01
SUMÁRIO: Estabelece
as bases da política e do regime de protecção e valorização do património
cultural
PÁGINAS DO DR: 5808 a 5829
A Assembleia da República decreta, nos termos da
alínea c) do artigo 161.º da Constituição, para valer como lei geral da
República, o seguinte:
E segue todo o articulado do texto.
Nele, e quando se trata de aferir valores
patrimoniais, encontram-se nos princípios basilares (art. 1º)
algo que se lê do seguinte modo: Integram, igualmente, o património cultural
aqueles bens imateriais que constituam parcelas estruturantes da identidade e
da memória colectiva portuguesas.
E, mais à frente, no Artigo 3º, com o título: Tarefa
fundamental do Estado, é dito entre outras a seguinte recomendação: Através
da salvaguarda e valorização do património cultural, deve o Estado assegurar a
transmissão de uma herança nacional cuja continuidade e enriquecimento unirá as
gerações num percurso civilizacional singular.
Os sublinhados são
nossos.
Postas as coisas
neste pé, representando o Crucifixo um bem imaterial que faz parte da
cultura da Nação desde a sua origem – e a Lei, como acima refere o que dela se
copiou, obriga o Estado a defendê-lo – não se compreende, portanto, a sanha do Governo actual, que está a ferir
- segundo o nosso entendimento - não
apenas a Lei da protecção e valorização do Património Cultural,
como a alínea “e” do art. 9º da Constituição
que começa por dizer o seguinte, como uma das missões que lhe cabe ao Estado: Proteger e valorizar o
património cultural do povo português(...) e nisto nada tem a ver o nº 3 do art. 43º onde se
diz que o ensino público não será confessional, porque
a Cruz não impõe a prática de uma determinada confissão religiosa, mas é,
apenas a representação de um símbolo de onde emergem valores, como o da
tolerância e do respeito pelas instituições – dai a Deus o que é de Deus e a
César o que é de César – disse o Homem, que se tornou, sem que o houvesse
pedido o autor desse símbolo histórico que marcou Povos e Nações ao longo dos
séculos e, particularmente, o povo de Portugal.
E vai continuar assim, porque a Cruz é eterna e os homens, finitos.
O Governo, é certo, tem
maioria democrática, mas parece ter agido com intolerância, como nenhum
outro tinha feito ao longo de trinta anos de Democracia em Portugal e, a ser assim, cambem por inteiro as
palavras de Gandhi: A intolerância é em si uma forma de violência (...) pelo facto de ninguém ter a certeza, qual
seria a resposta do povo português – no seu todo – se lhe fosse feita a
pergunta se estava de acordo em ser retirado o Crucifixo das salas de aula.
Esta dúvida deveria
ter bastado ao Governo para ter deixado ficar incólume a Cruz, por ser na sua
representação – não só a imagem de um credo religioso, que também é – mas por
ser na sua singeleza um valor patrimonial da Nação portuguesa, à sombra da qual
e da sua força espiritual se formou a Nação que somos. Há, no entanto, quem
diga e a voz do povo é voz de Deus - voz do símbolo que foi apeado
- que o Governo agiu assim para lançar
um motivo de discussão na campanha já em curso das próximas eleições
presidenciais, com propósitos de onde – a ser verdade - a Democracia sai
ferida. A ser assim e porque a política é um jogo, está em cima e às claras um
ponto escuro.
E ficam quatro perguntas:
- Será que se isto devia
ser permitido, mesmo a uma maioria - que afinal não sabe se a maioria real da
Nação, onde estão os que não votaram para a constituição democrática do actual
Governo – está do seu lado?
- Será – é lícito perguntar
se todos aqueles que ajudaram a formar a maioria governativa, onde há muitos
que têm respeito pela Cruz, estão de acordo com esta medida?
- Porque é que um pequeno
colégio pode mandar na consciência da globalidade dos seus eleitores?
- Ou o que aconteceu não
mexe com a consciência do homem?
É por isso, que o facto
pode revestir-se de alguma intolerância
e violência e ser obstáculo ao desenvolvimento do verdadeiro
espírito democrático.
Eu não queria –
sinceramente o declaro – que estas palavras atribuídas a Gandhi tivessem razão,
porque é meu desejo profundo que a Democracia cresça em Portugal para bem do
povo de que sou parte e ao qual me orgulho de pertencer.
(1) -
Nome dado à “pólis”
(2) - Pisístrato (600-527 a .C.) foi um líder
popular e tornou-se um tirano. Usurpou a autoridade que conseguiu manter à sua
morte.
(3)- Como legislador, Sólon em 594
a .C. iniciou uma reforma que proibiu a hipoteca da terra
e a escravidão por endividamento. Dividiu a sociedade pelo critério censitário
(pela renda anual) e criou o tribunal de justiça.
(4) - Político ateniense(495-429 a .C.) Chefe do partido
democrático exerceu uma profunda
influência entre os seus concidadãos. Foi Chefe do Estado (443-429).
Protegeu as artes e letras e embelezou Atenas com o Partenon.
15 de
Dezembro de 2005
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