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segunda-feira, 3 de junho de 2013

Escolher a alegria




Na primeira leitura da Eucaristia de hoje ouvi o seguinte: “…ponho diante de vós a vida e a morte, Escolhe a vida, para viveres, tu e a tua descendência, amando o Senhor, teu Deus, escutando a sua voz e apegando-te a Ele” (Dt 30, 19-20).
Como é que eu escolho a vida? (…) Um dos aspectos que uma opção de vida implica é escolher a alegria. A alegria beneficia a vida, mas a tristeza traz a morte. Um coração triste é um coração onde alguma coisa está a morrer. Um coração feliz é um coração em que está a nascer alguma coisa nova.
Henri J. M. Nouwen  (1)
A Caminho de Daybreak    



O Coro esfusiante do quarto andamento do Hino à Alegria da 9ª Sinfonia de Beethoven, canta enlevadamente:  Abracem-se milhões! Enviem este beijo para todo o mundo! Irmãos, além do céu estrelado mora um Pai Amado. Milhões se deprimem diante Dele? Mundo, você percebe seu Criador? Procure-o mais acima do Céu estrelado! Sobre as estrelas onde Ele mora.
O “Eureka” do antigo sábio grego plasmou-se, um dia, no grito de Beethoven: Consegui! Consegui! Enfim, encontrei a alegria!
Entendido como um grito de emancipação do tempo feudal o Hino à Alegria levou Romain Rolland a elevá-lo ao estatuto de uma ode humanista celebrando a fraternidade entre os povos, tendo merecido em 1985 a eleição de hino oficial da União Europeia, simbolizando os valores partilhados pelos Países membros, algo que já fora sentido e acarinhado por Beethoven.
Diz-se que ele, após ter encontrado a solução para um problema de vários anos, em que não conseguira encontrar talento para musicar os difíceis versos da an die Freude (Ode à Alegria) de Schiller, sentou-se ao piano e passou a dedilhar aquele hino à fraternidade humana, e que este ao ordenar Abracem-se milhões! Enviem este beijo para todo o mundo!, nos quer transmitir o modo como devemos escolher a vida, amando Deus, sentindo que além do céu estrelado mora um Pai Amado, como afirmam os versos que originaram algumas desesperanças do compositor e, depois, lhe deram tão grande contentamento.
Cheia de alegria, esta música genial de Beethoven leva-nos a Deus através da harmonia encontrada e que por fim deu sentido rítmico aos versos de Schiller, que deixara impresso no poema uma  sonho idealista onde a raça humana tenderia a ser, no futuro,  uma irmandade.
Estando esse desiderato longe de ser conseguido, continua, contudo, pela universalidade que lhe deu a genialidade da pauta musical, a ter para os homens de hoje, o mesmo sentido, num abraço de fraternidade, convidando-os a abandonar os versos difíceis que acontecem nas suas vidas onde se notam, aqui e ali, manchas de algum desencanto pela falta de Deus, que não se procurou ou foi abandonado e embora presente no mundo, visivelmente, em tantas acções humanas, tem, a Sua morada, como salienta Schiller,  acima do Céu estrelado!
É, para que esse Céu, através da alegria, possa existir como uma dádiva que os homens recebem gratuitamente d’Aquele que é Alfa e o Ómega, constituindo-se congregador e  distribuidor de todas as graças, que o sentimento alegre tem ser uma escolha consciente e meta para onde devem caminhar todas as atenções e empenhos humanos.
E, desse modo, a dicotomia referida por Henri J. M. Nouwen  e se lê no Deuteronómio, ponho diante de vós a vida e a morte, não deva ser nunca uma escolha de morte, mas de vida, algo que só existe, verdadeiramente, quando o homem, decifrados os versos de Deus e encontrada a harmonia de que nunca desistiu, à semelhança de Beethoven, possa lançar, alegremente, o seu grito de felicidade: Consegui! Consegui! Enfim, encontrei a alegria! 
Assim, como aconteceu com o compositor, não podemos abandonar jamais o desejo de conseguir a alegria, se acreditamos em Deus, Fonte da Vida, porque crendo n’Ele nada nos poderá empurrar para a morte.
Mas, atenção. Não confundamos alegria com hilaridade.
A alegria é um estado de alma que dá a quem a possui um contentamento permanente, traduzido naquele verso de Schiller, que contém um desejo ardente de levar a todos os homens esse sinal de felicidade: Enviem este beijo para todo o mundo! – apontando para a alegria verdadeira, aquela que fez explodir o génio musical de Beethoven, e é uma acção de graças, enquanto a hilaridade é, quase sempre,  um momento que passa, mas sem o poder de contagiar ninguém.
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(1)-Sacerdote católico, natural da Holanda. Assistiu a comunidade de deficientes mentais de L’Arche-Daybreak, em Toronto

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