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segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Uma liberdade poética de Mário Quintana




Passageiro Clandestino

No porta-mala do meu automóvel
Levo um anjo escondido...
Quando chegamos a um descampado,
Ele sai lá de dentro, estende as asas, belas como a vitória
E aí, então, nos seus ombros, dou uma longa volta pelos céus da cidade...

Mario Quintana
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A este brasileiro do Rio Grande do Sul que tem nele um expoente literário de grandeza intelectual, em que a Poesia teve um papel preponderante na sua Obra, deve-se entre muitas belezas do seu lúcido pensamento este "Passageiro Clandestino", um tema inserido na liberdade poética de que, ao longo dos tempos milenares, os Poetas se têm servido para explanar os seus sonhos quiméricos, mas onde, sem deixar de existir uma esperança irrealizável, têm o condão de dizer a todos os homens que é possível, por vezes, sair fora da realidade... e sonhar...

Mas, quando preciso for, descer à terra e ter a noção da vida real, que é por aí que todo o homem deve construir a vida, como ele disse, um dia, nesta reflexão que nos devia inquietar, sobretudo, àqueles que vivem a vida por demais descuidados:

Não faças da tua vida um rascunho. Poderás não ter tempo de o passares a limpo.

Mas do rascunho de que ele fala, se houver sempre o propósito de o passar a limpo, "não deixando para amanhã o que podemos fazer hoje",  que nos momentos de lazer o homem de compraza e vá - Passageiro Clandestino - embarcado nas asas do seu anjo num desejo irreprimível de ver de cima os telhados da sua cidade, que a vida também se vive dos sonhos que vamos tendo!

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Sonhar... mas ter os pés no chão!


Dalai Lama

Se os seus sonhos estiverem nas nuvens, não se preocupe, pois estão no lugar certo; agora construa os alicerces.
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O que distingue o homem superiormente dotado de dons espiritualmente elevados do homem comum, é que ele vê no longe aquilo que o outro, muitas vezes, nem de perto enxerga, tendo até a arte de o fazer pensar naquilo que lhe diz, como acontece neste pensamento do monge tibetano, que traduz com toda a carga espiritual aquilo que convém fazer a todo o sonho que se tem.
  • Construir os alicerces!
Ou seja, a base, que sem ela bem firme qualquer ideia que sonhemos, se não tiver essa firmeza, seja de atitude ou de acção, pode ser um "ídolo de pés de barro" e desmoronar-se em pedaços, por vezes, sem possibilidades de serem concertados...

Eis, porque sonhar é preciso - já disse o poeta Sebastião da Gama: "Pelo sonho é que vamos", mas se isso é um modo de nos fazer viver a aventura da vida, como diz Dalai Lama, mesmo que ele esteja nas nuvens, está "no lugar certo"... reatando, apenas, como condição "sine qua non", que para qualquer sonho lhe construamos o modo dele poder ser realidade.

E para isso que Deus nos chamou à vida: 
Sonhar, sim, mas com cabeça!

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

A morte não é nada!



A MORTE NÃO É NADA!

A morte não é nada.
Apenas passei ao outro lado do mundo.
Eu sou eu. Tu és tu.

O que fomos um para o outro, ainda o somos.
Dá-me o nome que sempre me deste.
Fala-me como sempre me falaste.
Não mudes o tom a um modo triste ou solene.

Continua rindo com aquilo que nos fazia rir juntos.

Reza, sorri, pensa em mim, reza comigo.              
Que o meu nome se pronuncie em casa
como sempre se pronunciou,
sem nenhuma ênfase, sem rosto de sombra.

A vida continua significando o que significou:
continua sendo o que era.
O cordão de união não se quebrou.
Por que eu estaria fora dos teus pensamentos,
apenas porque estou fora da tua vista?

Não estou longe, somente estou do outro lado do caminho.


Santo Agostinho
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Deixemos que as palavras de Santo Agostinho sobre a morte física dos nossos corpos perecíveis penetrem no mais fundo de cada um de nós e que continuemos rindo com aquilo
que nos fazia rir juntos, lembrando as anedotas que contávamos ou uma das quaisquer alegrias vividas em momentos felizes.

Deixemos, assim, que o sentimento de ninguém estar longe... mas, apenas, do outro lado do caminho seja uma verdade a ser vivida, porque a morte é isso que dá a quem parte: ficar a aguardar o que ficou, no outro lado do caminho...

sábado, 15 de outubro de 2016

Os ourives da palavra: Blaise Pascal


Os egípcios estavam infectados de idolatria e de magia; o próprio povo de Deus era influenciado por seus exemplos. No entanto, Moisés e outros acreditavam naquele que não viam e o adoravam olhando para os dons naturais que ele lhes preparava.

Os gregos e os latinos, em seguida, fizeram reinar as falsas divindades; os poetas fizeram cem diversas teologias: os filósofos se separaram em mil seitas diferentes: no entanto, havia sempre, no coração da Judéia, homens escolhidos que presidiam à vinda de um Messias que só por eles era conhecido.

Ele veio, enfim, na consumação dos tempos: e, desde então, viram-se nascer tantos cismas e heresias, tantos desmoronamentos de Estados, tantas mudanças em todas as coisas; e essa Igreja a que adora aquele que sempre foi adorado subsistiu sem interrupção. E o que é admirável, incomparável e inteiramente divino, é que essa religião que sempre durou foi sempre combatida. Mil vezes esteve na iminência de uma destruição universal; e, todas as vezes que se achou nesse estado, Deus tornou a levantá-la com golpes extraordinários de potência. É assombroso que assim seja e que ela se mantenha sem dobrar-se e curvar-se sob a vontade dos tiranos.

Pascal 
in, Pensamentos - Cap. III – artigigo 3º -Marcas da verdadeira religião

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Os ourives da palavra: Bossuet (Jacques)


A grande desgraça da vida humana é que ninguém se contenta em ser insensato só para si, mas quer transmitir a sua loucura aos outros; de modo que o que nos seria indiferente, muitas vezes, dada a nossa fraqueza, excita a nossa imprudente curiosidade, pelo ruído que disso se faz em torno de nós. Nessa estranha pressa em comunicarmos uns aos outros os nossos erros e loucuras, corrompe-se completamente o espírito.
in, Sermon pour la troisiéme dimanche de l'Advent
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Podemos, à luz do tempo que passa não estar de acordo com o radicalismo absolutista que foi defendido por Bossuet, mas isso não obsta que do ponto de vista da análise dos princípios sócio-culturais do homem, esta sua afirmação não seja exemplar, porque o é, se tivermos em conta que existe em certos homens e em determinados momentos da sua existência, um prazer perverso na contribuição que dão em espalhar desconforto nos seus iguais, a começar pelos que lhe estão mais próximos, como se a insensatez de um devesse ser propagada ao seu semelhante.

sábado, 10 de setembro de 2016

Por falar de personalidade...


No livro "Psicologia do Homem" de Mário Gonçalves Viana, no capítulo que o autor intitula: "A Personalidade Humana", após afirmar que a palavra personalidade está, actualmente, em moda, tece este sábio pensamento que é um aviso muito sério feito àqueles - muitos deles nossos conhecidos - que usam e abusam da personalidade que dizem ter e, a eles mesmo, se alcandoram a lugares do pensamento humano que são, simplesmente, desvios ou excessos de vaidade.

Diz, assim, Mário Gonçalves Viana:

Aqueles que mais falam em personalidade são, não raro, aqueles que a não possuem: falam nela com compensação verbal para a carência que, instintivamente, pretendem suprir.
A personalidade é uma síntese da pessoa humana; umas vezes essas síntese não existe, outras vezes esboça-se levemente; raras vezes atinge uma forma definida e integral. O que se verifica, com frequência, é a existência de indivíduos desejosos de "mascararem", sob o nome de personalidade, os seus desvios e os seus excessos.

É indispensável estar precavido contra essa vaidosa e vangloriosa tendência de atribuir a designação de personalidade aos caprichos e até às aberrações. Lembremo-nos daquilo que, com certa argúcia e ironia, afirmava Gustavo Bessiére: "Nada do que é humano pode tornar-se infinito, salvo, talvez, certos erros".

domingo, 17 de julho de 2016

Os ourives da palavra - Viver o dia de hoje!


Vive o Dia de Hoje!
Não penses para amanhã. Não lembres o que foi de ontem. A memória teve o seu tempo quando foi tempo de alguma coisa durar. Mas tudo hoje é tão efémero. Mesmo o que se pensa para amanhã é para já ter sido, que é o que desejamos que seja logo que for.  

É o tempo de Deus que não tem futuro nem passado. 

Foi o que dele nós escolhemos no sonho do nosso absoluto. Não penses para amanhã na urgência de seres agora. Mesmo logo à tarde é muito tarde. Tudo o que és em ti para seres, vê se o és neste instante. Porque antes e depois tudo é morte e insensatez. Não esperes, sê agora. Lê os jornais. O futuro é o embrulho que fizeres com eles ou o papel urgente da retrete quando não houver outro.

Vergílio Ferreira, in "Escrever"

Depois de ler e meditar neste texto de Vergílio Ferreira, de imediato procurei as reflexões em prosa do "Livro do Eclesiastes" - uma invulgar sabedoria do Antigo Testamento e no seu "Prefácio" ter encontrado a explicação de em grego "eclesiastes" significar: aquele que fala na assembleia, e encontrar axiomas, como estes:
  • O que foi tornará a ser, o que foi feito se fará novamente; não há nada novo debaixo do sol. (1,9)
  • Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu:
  • Tempo de nascer e tempo de morrer, tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou,  (3, 1.2)
E ao regressar ao texto do escritor fixei o meu pensamento na primeira frase: Vive o dia de hoje e ficar meditativo no quanto de verdade e realidade humana existe neste propósito que nos é aconselhado e ao conotá-lo com os pensamentos do "Eclesiastes" (aquele que fala na assembleia) agradecer a Vergílio Ferreira o modo como ele pareceu ir até aos tempos do rei David - quando se escreveu o Eclesiastes - para falar à assembleia dos que têm a graça de o ler, porquanto tudo o que ele nos diz, como: a memória teve o seu tempo quando foi tempo de alguma coisa durar... e, agora o que se torna preciso é não pensar para amanhã na urgência de seres agora, porque como diz o Eclesiastes para tudo há uma ocasião certa, o que exige viver o dia de hoje na plenitude como ele merece ser vivido.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Os ourives da palavra - Gabriel Garcia Marquez



Eis duas duas jóias trabalhadas na oficina mental de Gabriel Garcia Marquez:
  • A morte não chega com o fim da vida mas com o esquecimento.
  • Um homem só tem o direito de olhar o outro de cima para baixo quando o está ajudando a levantar-se.

O que embeleza a vida é saber que Deus na sua imensa Omnipotência cria génios como foi o grande homem de cultura colombiano Gabriel Garcia Marquez, que nestas duas jóias raras do seu pleclaro pensamento nos deixou guias de vida que deviam fazer pensar esta Humanidade frívola em que vivemos, atolada em lamaçais de onde é preciso sair, quanto antes.

Muito gostaria eu de tecer mais comentários, sobretudo, na segunda das jóias que se reproduzem, mas penso, iria roubar aos meus eventuais leitores momentos de introspecção que é preciso fazer para que nos encontremos a nós mesmos em cima da vida que temos e a saibamos viver na linha que nos traça o eminente pensador.

quinta-feira, 2 de junho de 2016

Os ourives da palavra - Winston Churchill


"Há um momento especial que acontece na vida de toda pessoa, o momento para o qual ela nasceu. Quando aproveitada, essa oportunidade extraordinária faz com que a pessoa cumpra sua missão - uma missão para a qual somente ela tem as qualificações necessárias. Nesse momento, a pessoa encontra a grandeza. Esse é seu mais maravilhoso instante."
                                                                                                Winston Churchill
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Os verdadeiros homens de Estado têm - se quiserem - nesta insigne personagem inglesa um exemplo que a todos devia interessar, pelo seu modo de vida de cidadão e de político a que aliou a sua faceta de pensador, tendo enriquecido a Humanidade neste campo onde se arquitectam todas as estratégias da vida pessoal ou comunitária.

Pensando nas "palavras de ouro" que ele plasmou e acima se reproduzem, elas merecem-me o seguinte comentário:

Quando celebramos o dia do nosso nascimento devíamos-nos lembrar que ele foi o marco maior que Deus plantou à beira do caminho que fomos convidados a percorrer, não só pelo acto de que resultou a apresentação concreta ao mundo da nossa vida visível, mas e com grande expressão pelo acto concepcional da nossa vida intra-uterina que permitiu pela gestação biológica mais uma vida que desde o início do cruzamento dos gâmetas masculino e feminino deram origem ao zigoto, a célula que formou o embrião e no qual - pela acção invisível de uma Natureza que só Deus comanda - a pessoa resulta com uma missão a cumprir e para a qual, como diz Churchill, somente ela tem as qualificações necessárias.

Quer isto dizer - tal como o sinto - que quando festejamos os nossos aniversários na garridice da festa devíamos ter presente não só o acto da vida de que ela resultou, mas sentindo-o acompanhado da missão que cada vida trouxe consigo, algo que nem sempre temos na devida conta quando se sabe, que a cada vida foi dada condições da mesma ser vivida dentro dos parâmetros traçados pela Natureza de Deus e, de entre, eles, como sejam, o Amor, a Santidade, a Justiça, a Benignidade, escolher pela Graça da Perfeição - que sendo todos atributos divinos - aqueles que actuem na nossa fragilidade humana com as condições que permitam corresponder às qualificações necessárias, com que Deus nos marcou a partir do acto da concepção, onde a vida começa, bem ao contrário do que pensam as mentalidades modernas.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Os ourives das palavras - Aristóteles


"Nós somos o que fazemos repetidas vezes. Portanto, a excelência não é um acto, mas um hábito."
Aristóteles
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A fama dos grandes homens de que a História nos dá conta, se começou por ser uma consequência directa daquilo que fizeram de palpável e ficou a falar por eles depois do seu desaparecimento físico, tal facto é o resultado daquilo que pensaram no silêncio das suas mentalidades por terem sido a base da imaterialidade que sustentou as obras materiais que nos deixaram.
Quer isto dizer que a obra física que ficou para ser admirada teve um nascimento espiritual, algo inacessível às mãos porque vive por dentro, num lugar escondido onde estas não chegam.

Aristóteles no pensamento que acima transcrevemos diz algo que pode ter duas leituras: a de fazer, repetindo acções fazedoras de coisas materiais até sermos excelentes em tudo quanto fazemos, fazendo delas um hábito, ou por outro lado, repetindo acções contidas numa linha de espiritualidade humana que nos tornam criaturas a ter em conta na sociedade onde vivemos, fazendo que a nossa excelência possa ser cotada como um hábito natural e, portanto, digno de nota.

É muito conhecido este pensamento do velho filósofo grego - uma das grandes figuras da Humanidade -  e só por isso devia merecer, quer uma, quer a outra leitura que ele sugere, pelo que este "ourives da palavra" bem merecia continuar a ser atendido por aquilo que fez e por aquilo que disse.

sábado, 14 de maio de 2016

Os Ourives da Palavra - (Um provérbio oriental)


Os sábios não dizem o que sabem, 
os tolos não sabem o que dizem.

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Sempre assim foi.

Os sábios costumam ser humildes e não se cansam de cultivar esse sentimento humano que os distingue dos tolos - os fala-barato - que por tudo e por nada emitem opiniões a parecer de sábios...

Olhemos à nossa volta e vejamos como os sábios são comedidos e como os tolos são verborreicos e, depois, veremos quanto é verdadeiro este provérbio oriental, que eu enfileiro, penso que com toda a justiça na rubrica:  "Os Ourives da Palavra" 

domingo, 10 de abril de 2016

Os ourives da palavra - Victor Hugo



O coração da mulher aperfeiçoa-se porque dá; 
o coração do homem desliga-se porque recebe. 
(Vitor Hugo)


segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Os ourives da Palavra: Santo Agostinho



Estreita é a casa de minha alma para que venhas até ela: que seja por ti dilatada. Está em ruínas; restaura-a. Há nela nódoas que ofendem o teu olhar: confesso-o, pois eu o sei; porém, quem haverá de purificá-la? A quem clamarei senão a ti? Livra-me, Senhor, dos pecados ocultos, e perdoa a teu servo os alheios! Creio, e por isso falo. Tu o sabes, Senhor. Acaso não confessei diante de ti meus delitos contra mim, ó meu Deus? E não me perdoaste a impiedade de meu coração? Não quero contender em juízos contigo, que és a verdade, e não quero enganar-me a mim mesmo, para que não se engane a si mesma minha iniquidade. Não quero contender em juízos contigo, porque, se dás atenção às iniquidades, Senhor, quem, Senhor, subsistirá?

(Confissões, Agostinho de Hipona, capítulo V)

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Os ourives da palavra: Sobre a Hipocrisia


Padre Manuel Bernardes

HIPOCRISIA

É hipócrita o mercador que dê esmolas em público e leva usuras em oculto; é hipócrita a viúva que sai mui sisuda no gesto e no hábito, e dentro em casa vive como ela quer e Deus não quer; é hipócrita o sacerdote que, sendo pontual e miúdo nos ritos e cerimônias, é devasso nos costumes; é hipócrita o julgador que onde falta a esperança do interesse é rígido observador do direito; é hipócrita o prelado que diz que faz o seu ofício por zelo da honra e glória de Deus, não sendo senão pela honra e glória própria. 

Hipócrita é o que não emenda em si o que repreende nos outros; o que cala como humilde, não calando senão como ignorante; o que dá como liberal, não dando senão como avarento solicitador das suas pretensões; o que jejua como abstinente, não se abstendo senão como miserável.

Assim é. Porém não cuide alguém que, à conta deste desengano, lhe é lícito contrair a doutrina a pessoas ou ações determinadas, dizendo ou julgando que fulano é hipócrita ou esta esmola deu por vanglória. Estes juízos são reservados a quem vê os corações que é só Deus, onde podemos chegar sem pecado e com prudência. É não nos fiar levemente do que aparece e onde podemos assentar com singeleza e sem prejuízo; é entender que todos são bons, conforme a graça de Deus se lhes comunicar.

in, Nova Floresta


Os ourives da palavra: "Segui em frente. A vida continua"




REFLEXÃO DE SANTO AGOSTINHO SOBRE A MORTE.

SIGUI EM FRENTE. A VIDA CONTINUA.

A morte não é nada.

É somente uma passagem de uma dimensão para outra.

Eu somente passei para o outro lado do caminho. Eu estou, agora noutra vida; não atormenteis essa minha passagem com tristeza e lágrimas.

Eu tenho que ter muita paz para purificar minha alma e andar tranquilo pelos jardins da dimensão em que me encontro.

Vós sois vós. Estais vivos. 
A vida não pode parar porque um membro da família partiu. O que era para vós, continuarei sendo.

Se dei bons exemplos, sigam-nos, se fui bom imitem-me, se deixei em vós saudades, quando se lembrarem de mim façam uma oração, peçam meu descanso, meu repouso e que meu encontro com Deus seja para minha glória.

Dêem-me o nome que sempre me deram, falem comigo como sempre fizeram.
As vossas lágrimas fazem-me um grande mal, cada um de nós tem seu dia marcado, o meu veio agora. Pensem simplesmente que nos encontraremos mais cedo ou mais tarde.

Vós continuais vivendo no mundo das criaturas, eu estou vivendo no mundo do Criador.
Não utilizem um tom solene ou triste, continuem a rir juntos.

Rezem, sorriam, pensem em mim.

Que o meu nome seja pronunciado como sempre foi, sem diferença por eu não estar presente.
Não saí da vossa vida porque quis, mas sim porque Deus determinou; aceitem para que eu não lamente, estar sendo motivo de sofrimento, pois jamais os magoaria por minha vontade.

Não tenham revoltas, não lamentem, apenas tentem compreender. 
Se não se lembrarem de mim com alegria, vou ficar no meio do caminho, sem poder ir para onde tenho que ir, sabendo que nada posso fazer para voltar para vós.

Não quero tristeza, não quero lágrimas. Quero orações.

A vida significa tudo o que ela sempre significou.
O fio não foi cortado.

Eu não estou longe, apenas estou do outro lado do caminho...

Vós que ficastes, sigui em frente!

A vida continua linda e bela como sempre foi!


Santo Agostinho

domingo, 22 de novembro de 2015

Os ourives da palavra - "Sinais dos Tempos"



Da Carta Encíclica "Pacem in Terris" 
- A paz de todos os povos na base da Verdade, Justiça, Caridade e Liberdade -  
do Papa S. João XXIII
11 de Abril de 1963

Sinais dos Tempos

39. Três fenômenos caracterizam a nossa época. Primeiro, a gradual ascensão econômico-social das classes trabalhadoras.

40. Nas primeiras fases do seu movimento de ascensão, os trabalhadores concentravam sua acção na reivindicação de seus direitos, especialmente de natureza económico-social, avançaram em seguida os trabalhadores às reivindicações políticas e, malmente, se empenharam na conquista de bens culturais e morais. Hoje, em toda parte, os trabalhadores exigem ardorosamente não serem tratados à maneira de meros objectos, sem entendimento nem liberdade, à mercê do arbítrio alheio, mas como pessoas, em todos os sectores da vida social, tanto no económico-social como no da política e da cultura.

41. Em segundo lugar, o facto por demais conhecido, isto é, o ingresso da mulher na vida pública: mais acentuado talvez em povos de civilização cristã; mais tardio, mas já em escala considerável, em povos de outras tradições e cultura. Torna-se a mulher cada vez mais conscia da própria dignidade humana, não sofre mais ser tratada como um objecto ou um instrumento, reivindica direitos e deveres consentâneos com sua dignidade de pessoa, tanto na vida familiar como na vida social.

42. Notamos finalmente que, em nossos dias, evoluiu a sociedade humana para um padrão social e político completamente novo. Uma vez que todos os povos já proclamaram ou estão para proclamar a sua independência, acontecerá dentro em breve que já não existirão povos dominadores e povos dominados.

43. As pessoas de qualquer parte do mundo são hoje cidadãos de um Estado autónomo ou estão para o ser. Hoje comunidade nenhuma de nenhuma raça quer estar sujeita ao domínio de outrem. Porquanto, em nosso tempo, estão superadas seculares opiniões que admitiam classes inferiores de homens e classes superiores, derivadas de situação económico-social, sexo ou posição política.

44. Ao invés, universalmente prevalece hoje a opinião de que todos os seres humanos são iguais entre si por dignidade de natureza. As discriminações raciais não encontram nenhuma justificação, pelo menos no plano doutrinal. E isto é de um alcance e importância imensa para a estruturação do convívio humano segundo os princípios que acima recordamos. Pois, quando numa pessoa surge a consciência dos próprios direitos, nela nascerá forçosamente a consciência do dever: no titular de direitos, o dever de reclamar esses direitos, como expressão de sua dignidade, nos demais, o dever de reconhecer e respeitar tais direitos.

45. E quando as relações de convivência se colocam em termos de direito e dever, os homens abrem-se ao mundo dos valores culturais e espirituais, quais os de verdade, justiça, caridade, liberdade, tornando-se cônscios de pertencerem àquele mundo. Ademais são levados por essa estrada a conhecer melhor o verdadeiro Deus transcendente e pessoal e a colocar então as relações entre eles e Deus como fundamento de sua vida: da vida que vivem no próprio íntimo e da vida em relação com os outros homens. 

sábado, 21 de novembro de 2015

Os ourives da palavra: Saudade

De um diaporama recebido

Nota: reflexão de Camilo Castelo Branco a uma poesia - A Minha Crença - 
do seu amigo e confidente de Viana do Castelo, José Barbosa e Silva.


A saudade!... Que sentimento e que palavra! Que doçura e que fel exprime! Que suave melancolia e que pungente desesperação revela! Não haverá, talvez, na língua humana palavra que melhor exprima as últimas gotas de seiva que nutrem o coração arado pelos desenganos e descrida da esperança em venturas deste desterro! Nem para o desgraçado há outra seiva que lhe faça abrolhar no coração a cândida flor da fé, pálido reflexo do formoso jardim de fores esperançosas, esfolhadas pelos ventos tempestuosos das paixões.

É então a saudade sublime de mágoa; e, se a sua doce irmã, a carinhosa esperança, não enxugasse as lágrimas do homem, a vida seria um lento agonizar, e a morte a consolação do ateu.

Há, porém, uma saudade, estremecida filha do céu, e embalada connosco no nosso berço de infância. Brincámos com ela no colo de nossas mães, ouvimos-lhe melodias que os anjos lhe emprestaram, beijámo-la em nossos sonhos, tememo-la em nossos temores infantis, viemos abraçados com ela até às portas do mundo, e ai... perdemo-la, chamamo-la em vão e lamentamo-la para sempre perdida.

Essa saudade é a crença religiosa que nos desceu ao coração filtrada pelos lábios maternaIs. Dessa crença o que ficou foi a cruel certeza de estar quebrado o santo prisma por onde a víamos; o que se perdeu foi o ideal da singela fé com que nossa mãe nos dourava as santas aspirações a um mundo, que não era, que não podia ser este.

E o coração do mancebo, que se sentou fatigado do mundo no longo caminho da sua peregrinação, tem instantes de enlevo que o transportam ao túmulo de sua mãe, pedindo-lhe palavras de conforto, hálito de vida para a fé em Cristo que sente morrer-lhe no espírito.
Os lábios do cadáver respondem-lhe pela voz da saudade; e o mancebo a quem Deus confiara uma lira tão cedo enlutada pelo véu do desalento, faz que o seu canto gema, faz que o seu estro se alevante do pó da terra e procure no céu o espírito de sua mãe.

Foi assim que eu compreendi a dorida poesia do meu amigo José Barbosa e Silva.

É o talento protestando contra a ignorância audaciosa dos que passam no mundo, vermes dum dia escarnecendo cinicamente a fé e amor dos que adoram a Cruz, farol divino da morada imortal dos justos.
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Do cap. XIII - "Bibliografias" do Livro "Horas de Paz" , 1º volume

Os ourives da palavra: Uma imagem de Jesus

De  um diaporama recebido 

Camilo Castelo Branco


À borda do lago de Tiberíades, um homem vestido com a túnica do povo, sentado nas ribas da montanha, alonga a vista pelas orlas do mar da Galeleia, e contempla as ondas espessas das multidões, que se lhe avizinham bradando clamores de vassalagem, como se a montanha fora um trono, e o homem do povo, o rei das multidões.

Este homem, saudado pelas turbas, fugira ao alarido que reclamava a coroa de David para aquela fronte real, onde a mão do Senhor escrevera os gloriosos destinos da Judeia.

Entre os que lhe apregoavam a majestade, estavam uns que juravam a grandeza daquele homem pela formosa luz, que a sua vontade omnipotente lhes abrira os olhos, cerrados desde o ventre materno. Outros, há pouco levantados do estrado da agonia, juravam a presença do Messias naquele homem, que os mandara erguer e caminhar, como se a sua voz tivesse o império da que se ouvira entre os relâmpagos do Sinai.

O filho da viúva de Nahim, invocando as regiões da morte pela voz daquele homem, jurava em nome de Deus, a divindade do que fora sentar-se no cimo da montanha, para dominar o universo como rei e autor da criação. As irmãs de Lázaro, rodeadas de povo, contavam a ressurreição do seu irmão; e Maria de Magdala rompia, veemente de amor, por entre as turbas, para derramar n ovas lágrimas aos pés daquele homem de Nazareth (...)

Do cap. VI - As Sete Palavras de N.S. Jesus Cristo" do Livro "Horas de Paz" , 1º volume


domingo, 15 de novembro de 2015

Os ourives da palavra: Parte do sermão de S. Roque (P. António Vieira)

De um diaporama recebido

Capela Real. Ano 1652.
Sermão de S. Roque
Tendo o autor pregado no dia do mesmo santo em S. Roque, 
Igreja da Casa Professa da Companhia de Jesus. 

 (...)
A primeira resolução de S. Roque, como se fora mais que homem, ou menos que homem, foi não querer servir a homens, nem mandar homens. Não querer servir a homens, ainda que fossem reis, parece muita soberba: não querer mandar homens, ainda que fossem vassalos, súditos, e criados próprios, parece pouco valor. Mas nem o primeiro foi arrogância, nem o segundo pusilanimidade: grande juízo, grande ânimo, grande generosidade, sim. Obrou S. Roque como homem, como cristão, como santo. 

E pois a mim me toca hoje declarar as razões que ele teve, e persuadir a que tenha imitadores, ao mesmo santo peço se digne de assistir com tal espírito ao meu discurso, que se não afaste muito dos meus pensamentos.

Primeiramente não quis S. Roque servir a homens, porque não quis deixar de ser homem. Ao homem fê-lo Deus para mandar: aos brutos para servir. E se os brutos se rebelaram contra Adão, e não quiseram servir ao homem, sendo tão inferiores, triste e miserável condição é haver um homem de servir a outro, sendo todos iguais. A primeira vez que se profetizou neste mundo haver um homem de servir a outros, foi com o nome de maldição.

Assim fadou Noé a seu neto Canaã, em castigo do pai e mais do filho. Ainda então se não sabia no mundo que coisa era servir; então se começou a entender a maldição pelo delito, e a miséria pelo castigo. 
Meios homens chamou depois o poeta lírico aos que servem, e disse bem. Toda a nobreza e excelência do homem consiste no livre alvedrio, e o servir, se não é perder o alvedrio, é cativá-lo. Razão teve logo S. Roque de não querer servir a homens, por não deixar de ser homem. (...)

O não querer servir a homens, seja embora prudente resolução, pelos motivos que apontamos; mas o não querer mandar homens, e tais homens, que fundamentos podia ter bastantes, não digo já, que aprovem uma tão extraordinária acção, mas que racionalmente a não estranhem, e ainda condenem? Bem creio que não ocorrerão facilmente as razões a ambição e apetite cego com que se governa o mundo, por isso tão mal governado. Respondo, porém, e digo que, se S. Roque teve grandes razões para não servir a homens, as mesmas, e muito maiores, teve para não querer mandar homens. E por que? Porque maior servidão é o mandá-los que o servi-los.

Falando el-rei Antígono com o príncipe seu filho sobre a administração e governo do reino, de que o havia de deixar por herdeiro, admirado o generoso moço de tamanhas obrigações e encargos, refere Eliano que lhe disse o pai: An non-novisti, fili mi, regnum nostrum esse nobilem servitutem? E ainda não sabias, filho meu, que o nosso reinar não é outra coisa que uma servidão honrada? — Honrada disse, e com grande juízo. 

Porque a servidão dos servos é servidão sem honra, e por isso menor e menos pesada. Mas, sobre o peso da servidão, haver de sustentar também o da honra, é muito maior sujeição e muito mais pesada carga. 

É servir a fama e às bocas dos homens, cujos gostos são tão vários e tão estragados, que até o maná os enfastia. Se um homem não pode servir a dois, como disse Cristo, como poderá servir a tantos mil? A cada homem deu Deus um anjo da guarda, e não mais que um homem a cada anjo: e se um anjo que move e governa com tanto concerto e ordem todo o céu das estrelas, não basta para guardar a um homem de si mesmo, e governar ordenada e concertadamente a um homem, entre os outros, como bastará um só homem para conter dentro das leis e manter em justiça a tantos homens? Não sabe o que são homens quem isto não considera e penetra; penetrou-o, porém, alta e profundamente S. Roque na verdura dos anos, com o siso e madureza que não vemos em tantas idades decrépitas.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Os ourives da palavra: Parte do sermão de Santo António aos Peixes (P. António Vieira)

De um diaporama recebido

Padre António Vieira


Vos estis sal terrae. S. Mateus, V, l3.

          
I

Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. 

Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!

Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar; que se há-de fazer a este sal e que se há-de fazer a esta terra? O que se há-de fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab hominibus. «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.» Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.

Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga. E à terra que se não deixa salgar, que se lhe há-de fazer? Este ponto não resolveu Cristo, Senhor nosso, no Evangelho; mas temos sobre ele a resolução do nosso grande português Santo António, que hoje celebramos, e a mais galharda e gloriosa resolução que nenhum santo tomou.

Pregava Santo António em Itália na cidade de Arimino, contra os hereges, que nela eram muitos; e como erros de entendimento são dificultosos de arrancar, não só não fazia fruto o santo, mas chegou o povo a se levantar contra ele e faltou pouco para que lhe não tirassem a vida. Que faria neste caso o ânimo generoso do grande António? Sacudiria o pó dos sapatos, como Cristo aconselha em outro lugar? Mas António com os pés descalços não podia fazer esta protestação; e uns pés a que se não pegou nada da terra não tinham que sacudir. Que faria logo? Retirar-se-ia? Calar-se-ia? Dissimularia? Daria tempo ao tempo? Isso ensinaria porventura a prudência ou a covardia humana; mas o zelo da glória divina, que ardia naquele peito, não se rendeu a semelhantes partidos. 

Pois que fez? Mudou somente o púlpito e o auditório, mas não desistiu da doutrina. Deixa as praças, vai-se às praias; deixa a terra, vai-se ao mar, e começa a dizer a altas vozes: Já que me não querem ouvir os homens, ouçam-me os peixes. Oh maravilhas do Altíssimo! Oh poderes do que criou o mar e a terra! Começam a ferver as ondas, começam a concorrer os peixes, os grandes, os maiores, os pequenos, e postos todos por sua ordem com as cabeças de fora da água, António pregava e eles ouviam. (...)
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Início do Sermão de Santo António aos Peixes
Pregado em São Luís do Maranhão