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domingo, 30 de setembro de 2018

Domingo XXVI do Tempo Comum - Ano B - 30 de Setembro de 2018 -


II Leitura do Dia - Carta de S. Tiago 5, 1-6

Vós, ricos, chorai e gemei por causa das desgraças que sobre vós virão. Vossas riquezas apodreceram e vossas roupas foram comidas pela traça. Vosso ouro e vossa prata enferrujaram-se e a sua ferrugem dará testemunho contra vós e devorará vossas carnes como fogo. Entesourastes nos últimos dias! Eis que o salário, que defraudastes aos trabalhadores que ceifavam os vossos campos, clama, e seus gritos de ceifadores chegaram aos ouvidos do Senhor dos exércitos. Tendes vivido em delícias e em dissoluções sobre a terra, e saciastes os vossos corações para o dia da matança!.Condenastes e matastes o justo, e ele não vos resistiu.

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Bem merece uma leitura meditada, palavra a palavra este pequeno passo da Carta de S. Tiago de um carácter - no dizer dos estudiosos - onde a exortação moral está presente com o seu sabor judaico, de uma viva e espontânea mensagem dirigida ao ambiente das primitivas comunidades cristãs.

Presumem os entendidos que o seu autor não é o Apóstolo do mesmo nome, mas uma personagem influente na comunidade de Jerusalém que defendia que a verdadeira religião consiste em não fazer da ambição humana da riqueza um fanal, pondo em seu lugar o uso das boas obras pela prática do bem pessoal em ordem ao colectivo, donde se pode inferir que a sua exortação no campo dos princípios continua actual e é, com crueza, uma chamada de atenção milenar à conquista desenfreada das riquezas, tantas vezes à custa dos trabalhadores, os que, como ele diz - ceifava os vossos campos - dirigindo-se aos ricos que entesouravam sem conta peso e medida.

É esta a segunda leitura deste XXVI Domingo do Tempo Comum e que a Igreja nos oferece como reflexão, não apenas para os fiéis mas para dentro de si mesma, porque o ouro e a prata dos ricos, um dia, serão ferrugem e serão testemunho contra vós, diz assim num dado ponto esta leitura cívica e moralista.

Entendamo-nos...


“O mandato de Procurador-Geral da República deve ser longo e único.”

Esta foi a frase da Ministra da Justiça, em entrevista à TSF em Janeiro de 2018, quando se referiu à possibilidade da Procuradora Geral da República, ainda em funções, Joana Marque Vdal poder ser reconduzida.
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in, Jornal de Notícias" de 21 de Setembro de 2018
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in, Constituição da República Portuguesa
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Entendamo-nos...

O nº 3 do artigo 220º da Constituição - a Lei Fundamental do País - diz (sic)) "O mandato do Procurador Geral da República tem a duração de seis anos", o que pode supor ser "único"... mas numa leitura que lá não está..., pelo que o "único" é uma criação da Ministra da Justiça e do Primeiro-Ministro com o fim de dar mais acerto ao que pretendiam fazer, ou seja a não promoção para um novo mandato da Procuradora Geral da República.

A Lei diz que o cargo tem a "duração de seis anos" mas não diz que a mesma pessoa não pode ser reconduzida para um novo mandato, pelo que o "único" é uma artimanha arranjada a "trouxe-mouche"...

Entendamo-nos.

Prova isto que a nossa Lei Fundamental omite o que lá devia estar, pelo que, embora tenha a "duração de seis anos", um segundo mandato é possível se houver vontade, em primeiro lugar, de quem termina a duração temporal duma primeira nomeação, e de quem nomeia ou aceita a sua recondução para um novo mandato com a mesma duração temporal.

Que se saiba a Joana Marques Vidal não foi posta a questão de um novo mandato e, parece, que a Senhora Procuradora o aceitaria.
Não foi isso que aconteceu, pelo que o "longo e único" - palavras da Ministra da Justiça e do seu Chefe de Governo é uma interpretação exorbitada da Lei, tendo entrado neste arremedo o Chefe do Estado, pelo que eu, um modesto e velho cidadão deste Pais que tanto amo, não posso aceitar que para fazer valer um propósito se ponham na lei palavras que não estão lá.

Razão, porque, me sinto defraudado pelo Presidente da República que mereceu o meu voto mas nunca mais o volta a ter se o seu futuro político mo pedir.

Entendamo-nos.

sábado, 29 de setembro de 2018

"Falta-me Algo" - Um poema de Alírio Polo

Falta-me Algo


Mergulhado nas profundezas
de infinitas incertezas,
longe de mim,
perdido no além
da inconstância do meu sentir
e com o carma de um ser refém.

Rasgo o tempo
na procura de um sentido,
desbravo o mar
tentando achar um caminho
que me conduza à um destino sem endereço
onde o meu vazio eu possa completar,
mas cada vez mais esmoreço
por não haver caminho a trilhar.

Sou como um pedaço de papel jogado ao ar,
voo sem rumo e sem lugar para pousar,
seguindo apenas o soprar dos ventos
que me levam à lugares que desconheço.

Paro, então, no topo de uma montanha
incapaz de continuar seguindo os ventos pelo estado amassado
e só assim descubro que tenho minhas próprias asas,
invento o meu caminho e jogo-me até à beira de um lago.

Vejo o meu rosto reflectido na água cristalina
e encontro o que, há muito, eu procurava,
no olhar profundo de minha retina
descubro que é de mim mesmo que eu sinto falta.

Alírio Polo
in,  "Escritos da Madrugada" - Uma conversa com a alma

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Que dizer?

Que não conheço o autor, mas conheço por esta poesia a que ele deu sem rodeios o nome "Falta-me Algo" que no modo como conduz o seu pensamento para o desfecho final em que ao falar com a sua alma - sub-título do nome do seu Livro de poemas - há no encadear das estrofes um ritmo humano de grande verdade consigo mesmo  e ao dizer "Paro, então, no topo de uma montanha" - sem ser esta um acidente físico da orografia - ela constitui, na sua mente, o momento exacto em que é preciso que o homem suba ao mais alto de si mesmo para perceber que Deus para além do seu corpo lhe deu "asas" para ele poder voar, como fez o Poeta até cair "à beira de um lago"...

De que serviu este "vôo"?

Para ele nos dizer que foi a partir de ter aberto as suas "asas" e depois de ter visto o seu rosto "reflectido na água cristalina" - que é, apenas, o lago existencial onde vive, não a "retina" dos seus olhos, mas a que existe no seu destemor de perguntar a si mesmo o que lhe fazia falta, num êxtase, descobriu que ela existia dentro do seu próprio ser e é nesta constatação cheia de sentido humanista que o Poeta adverte todos os homens, para a necessidade de cada um se buscar dentro de si mesmo, porque só depois desse encontro é que se pode jogar com altruísmo o jogo existencial da vida que Deus nos deu.

O meu "bem-haja" a Passos Coelho!



A notícia é de agora.
O facto que a originou tem já algum tempo...

Conta o Jornal "Expresso" que cinco meses depois de ter deixado o lugar de Primeiro-Ministro - mercê de um jogo de sombras  orquestrado pelo seu actual sucessor, António Costa, que perdeu as eleições legislativas para a coligação que ele encabeçava - o actual Presidente da República sondou-o para o condecorar com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo, uma distinção só concedida a quem tenha prestado "destacados serviços em cargos de soberania" da Administração Pública, na Magistratura e na Diplomacia.

Se alguém a merecia ele que chefiou um governo herdeiro de uma hecatombe administrativa socialista que nos levou à pré-bancarrota, e cujas medidas supervisionadas de três em três meses pela banca internacional que refez, como empréstimo, a liquidez monetária necessária para Portugal continuar a viver, e mesmo assim, com a austeridade que se impôs, conseguiu endireitar as contas públicas, tirando-nos da queda abissal que sem ele ao leme do executivo do Estado, podia ter sido desastrosa.

Passos Coelho recusou a condecoração.

Era cedo demais e para o seu carácter de ser, a meu modo, - o político mais asisado da sua geração - e ter entendido que era novo demais para receber tal insígnia, deixando perceber que tais honras devem ser dadas - se merecidas - para dignificar um final de carreira.

Marcelo Rebelo de Sousa enganou-se com o carácter deste homem que hoje,  está a dar aulas no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), da Universidade de Lisboa. como docente  na área de Administração Pública. ou seja, Passos Coelho, agora professor, com este acto está a preparar, um dia, o seu regresso - ainda mais sábio - às funções do Estado, numa nova candidatura politica.

Que seja quando ele entender.

Derrotado não nas urnas em 2015 - jamais me cansarei de o expressar - Passos Coelho fez muito bem  ter rejeitado a condecoração, porque não está em fim de carreira, e Portugal continua a precisar de homens inteiros que "não embandeiram em arco" quando lhe acenam com uma medalha honorífica, seja ela qual for, porque a honra maior para certos homens - o que pela sua recusa ele encarna - é a de continuar , quando o tempo político se desanuviar das sombras que o derrotou, a servir a República, não a qualquer preço, mas no campo de um sol aberto, porque é aqui que se joga a democracia do direito adquirido na campo da luta partidária, antes do jogo começar e não depois, quando ele acabou.

Gostava que Deus não me fechasse os olhos sem ver este homem a dirigir, de novo, a barca do Estado em qualquer das suas funções mais altas, porque ele bem o merece.

O meu "bem-haja" a Passos Coelho!

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

O Apocalipse de S. João Evangelista numa livre interpretação de Pietro Ubaldi




Este título "A batalha final entre Jesus e Satã" resume em poucas palavras o conteúdo escatológico do último Livro da Bíblia "APOCALIPSE" escrito por S. João Evangelista na sua caverna da Ilha de Patmos em pleno Mar Egeu para onde foi deportado quando evangelizava em Éfeso, na Ásia Menor pelo Imperador Domiciano no ano 95 d. C., na ferocidade como atacou as Igrejas da Ásia

Diz a tradição dos habitantes daquela ilha que foi ali, que João recebeu a revelação para escrever o APOCALIPSE, como é atestado na Introdução deste Livro nos versículos 4 a 11:  João às sete igrejas que estão na Ásia: a vós, graça e paz da parte daquele que é, que era e que vem da parte dos sete Espíritos que estão diante do seu trono e da parte de Jesus Cristo, testemunha fiel, primogénito dentre os mortos e soberano dos reis da terra. Àquele que nos ama, que nos lavou de nossos pecados no seu sangue e que fez de nós um reino de sacerdotes para Deus e seu Pai, glória e poder pelos séculos dos séculos! Amém. Ei-lo que vem com as nuvens. Todos os olhos o verão, mesmo aqueles que o traspassaram. Por sua causa, hão de lamentar-se todas as raças da terra. Sim. Amém. Eu sou o Alfa e o Ómega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que vem, o Dominador. Eu, João, vosso irmão e companheiro nas tribulações, na realeza e na paciência em união com Jesus, estava na ilha de Patmos por causa da palavra de Deus e do testemunho de Jesus. Num domingo, fui arrebatado em êxtase, e ouvi, por trás de mim, voz forte como de trombeta, que dizia: O que vês, escreve-o num livro e manda-o às sete igrejas: a Éfeso, a Esmirna, a Pérgamo, a Tiatira, a Sardes, a Filadélfia e a Laodicéia." 

Quis o destino que neste Verão passado, obedecendo a um impulso do coração fiel a Jesus Cristo tivesse demandado a Turquia meridional, na costa virada para o Mar Egeu, de visita a Éfeso e mais concretamente ao local que é hoje, um Santuário mariano, que foi a última morada terrestre de Nossa Senhora que para ali foi levada pelo Apóstolo S. Joâo, no cumprimento de uma ordem de Jesus agonizante na Cruz do Calvário, quando ao virar-se para ele lhe disse: "Eis a tua Mãe", pelo que tendo aquele Apóstolo rumado a Éfeso levou consigo a Mãe de Jesus.

Na continuação da viagem o navio tomou o rumo da Ilha de Patmos, um dos locais que fazia parte da viagem e foi ali, que na visita à "Caverna de S. Joao", todo o encadeado do último Livro da Bíblia se abriu no meu pensamento, com as sombras que ele contém que são interrogações que Deus na sua omnipresença quis deixar aos homens.

E tudo isto, neste afã de reler e entender melhor o Livro do Apocalipse me dirigiu até ao Livro de Pietro Ubaldi PROFECIAS que trata nos seus capítulos VI e VII, precisamente do texto de S. Joâo.
Num dado ponto da sua leitura o autor adverte: Para facilitar sua compreensão, poderemos dividir o Apocalipse em três partes. A 1.ª parte contém avisos às sete igrejas da Ásia Menor e abrange os três primeiros capítulos do Apocalipse. A 2.ª parte descreve a grande luta entre o bem e o mal,até a chegada do prometido Reino de Deus. Este é o trecho maior do Apocalipse, o que mais se relaciona connosco, porque toca nosso tempo e o futuro próximo. Vai do capítulo IV ao XIX. A 3.ª parte refere-se a um futuro remoto, até o juízo final, e vai do capítulo XX ao XXII, que é o fim.

Com algumas descontinuidades do texto - mas sem interferir na sua linha condutora - apresenta-se a seguir a sua leitura que mereceu de mim todo o interesse cultural entrançado na sua escatologia própria, tirando desta leitura todo o proveito intelectual e eclesial que devia merecer a todos os homens - crentes ou não - o enredo visionário tecido por S. João Evangelista no seu exílio forçado.

Vamos até ao autor, Pietro Ubaldi.

 1ª Parte

O Apocalipse é a história da volta, representa o caminho da reascensão, dividido em episódios de luta e conquista, até à meta. Esta profecia confirma os conceitos dos precedentes capítulos, a respeito do pensamento e da vontade da história, faz deles, como nós, uma coisa viva, pensante,inteligente; mostra-nos que o verdadeiro senhor dos acontecimentos é Deus, o verdadeiro guia deles é Sua Lei;sobretudo nos conforta nossa precedente interpretação da hora histórica actual, avançando num mar tempestuoso para mais altos destinos. Lampeja no Apocalipse o grande conceito da real chegada à Terra do Reino de Deus, conceito que é o da Nova Civilização do terceiro milénio.

(...)

O Apocalipse confirma o significado profundo da vinda de Cristo à Terra, e reforça as conclusões do Evangelho, em torno do qual gira a presente obra. Pode parecer que o estilo violento de batalha do Apocalipse não se possa conciliar com o estilo pacífico do Evangelho. E no entanto, os dois livros se elevam sobre o mesmo conceito. Só que no Evangelho estamos no terreno dos princípios, altos e celestes, ao passo que no Apocalipse estamos no da luta, na Terra, por sua realização. Aqui desencadeia-se,para os surdos ao apelo do amor, a reacção da justiça de Deus. Se os maus quisessem fazer mau uso do amor de Deus, nem por isso a Lei poderia ficar violada para sempre. Achamo-nos diante de duas fases do mesmo pensamento.

O Evangelho é a Boa Nova aos homens de boa vontade, para que a Lei se cumpra por compreensão, espontaneamente. No Apocalipse, a Lei «deve»cumprir-se, impondo-se com a força. O Evangelho é a voz do Céu, proferida por um anjo vestido de bondade, que se dá aos homens pelo amor.

O Apocalipse é um drama que se desenrola no inferno terrestre, reino de Satanás. O Evangelho anuncia o Reino de Deus. O Apocalipse narra a luta, para implantá-lo na Terra. O Evangelho termina com o sacrifício de Cristo para a salvação dos bons. O Apocalipse termina com a vitória de Cristo, com a condenação dos maus. Assim, Evangelho e Apocalipse concordam, indicando dois caminhos diferentes para alcançar a mesma vitória do bem. O Apocalipse mostra-nos que chegamos à plenitude dos tempos, à hora da realização daquela Boa Nova; diz-nos que o Reino de Deus, anunciado pelo Evangelho, não será sempre uma utopia e está verdadeiramente às portas.

(,,,)

Estamos, pois, na plenitude dos tempos. Nos anteriores volumes estudamos a estrutura da Lei. Agora vêmo-la entrar em acção, porque ela não é teoria abstracta, mas é vida que quer realizar-se entre nós. A elasticidade da Lei tem um limite e suas forças, comprimidas pela desobediência dos homens, e deixadas livres por Deus,Chefe e Dirigente, romperão os diques da divina misericórdia,semeando a destruição nas fileiras do mal rebelde.

É a hora do juízo e da justiça. Deus, esquecido e negado, reaparece terrível sobre os horizontes da história e manifesta-se em acção. Sua paciência e Sua misericórdia, embora possam parecer ilimitadas, não podem ser traídas indefinidamente; e ai do homem que confunde essa espera da Lei — que só por compaixão difere a reacção — com a ausência de um princípio divino, dirigente e senhor do mundo. Ai dele, porque este princípio, após longa espera, em que os homens se acomodam,porque pensam que são eles os vencedores e senhores do mundo, reage para restabelecer o equilíbrio e explode com uma violência tanto maior, quanto mais demoradamente tiver sido violada e comprimida.

Após haver estudado nos volumes precedentes a estrutura e o funcionamento da Lei, estudamos agora, aqui, seu  aspecto histórico, neste nosso tempo, que é a hora de sua realização. Foi dito e repetido que o Evangelho jamais foi aplicado até hoje na Terra, que o anunciado Reino de Deus é ainda sonho remoto e que, se tivéssemos que a ter-nos aos fatos,a vinda de Cristo à Terra teria sido quase inútil.. Mas será possível que a realização da Boa Nova jamais deva chegar?Com efeito, o mundo hoje, com suas religiões, é substancialmente materialista.

A concepção espiritual da vida é hoje utopia, está fora da realidade vivida. Entretanto, ninguém pode acreditar que a vinda de Cristo à Terra possa ter sido frustrada em seus principais objetivos. O fato é que o Evangelho representa essa revolução biológica, que não pode realizar-se toda em 2.000 anos. Mas qual das ideias nascidas no mundo, poderemos dizer, ter atingido imediatamente sua plena realização? Cada ideia nova é um impulso que se infiltra na corrente espiritual da vida, que já é uma força que resiste por inércia, tendendo a conservar sua trajetória precedente. Após haver sido lançada a nova ideia, é ela espalhada e com isto se funde a outras ideias, depois é alterada, às vezes renegada, mais arde ressurge transformada, mas assimilada em parte. Sê-lo-á dez por cento, ou vinte, aqui mais, ali menos. É-o bem pouco.Mas esta percentagem se fixa na raça, a qual porém a adapta a si, ao seu tipo e às suas necessidades. Será talvez uma adaptação, mas ao menos em parte, a ideia tornou-se realidade.

Ao Cristianismo ocorreu o mesmo. Terá realizado a percentagem mínima, mas realizou-a. Mais do que isso, em 2.000 anos, a natureza humana não podia assimilá-la. Por isso,certas ideias, como o inferno, certos fatos, como as guerras santas, o poder temporal, as formas materiais do rito, foram mais exigências dos tempos, sendo responsável disso o grau involuído da maioria humana, do que mesmo criação e responsabilidade de dirigentes piores que a mediania. Isto acontece em todos os campos, e é culpa da natureza humana,muito preguiçosa para evoluir. Assim, por exemplo, o farisaísmo, o dogmatismo, o jesuitismo são qualidades que todos os homem podem ter. Não inculpemos, portanto, um grupo particular, se ele tem os defeitos da natureza humana. É essa nossa velocidade de assimilação, o passo lento de nossa caminhada ascensional. Nestas condições, o Cristianismo teve que limitar-se à função da conservação dos princípios, à defesa do património recebido.

Explica-se, assim, ainda que se não justifique, sua intransigência e seu dogmatismo. Mas com isso,não queremos dizer que a caminhada se detenha e que o Cristianismo possa ficar cristalizado na imobilidade. Se hoje os superficiais podem ter a impressão da falência de Cristo, nem por isso a partida está perdida e a vida se detém. O Apocalipse nos fala justamente deste amanhã, em que ocorrerá a realização do Reino de Deus na Terra.Se o Evangelho tem fins didáticos e se, pelo caminho do amor, quer ensinar aos homens a viver, propondo o próprio Cristo como exemplo vivo e modelo para alcançar o Reino de Deus, o Apocalipse traça a história da realização desse Reino,fazendo ressaltar, pelo caminho das ameaças, a inflexibilidade final da justiça de Deus, mostrando-nos Cristo também em seu aspecto de poder e triunfo.

Só assim o quadro estará completo,quando resultar da fusão de seus dois elementos complementares: Evangelho e Apocalipse. Se o Evangelho nos traça a linha de conduta, deixando-nos livres de aceitá-la ou não, o Apocalipse entra na história e narra as vicissitudes da realização na Terra daquele novo reino, que foi anunciado no Evangelho.

Delineia-se assim o desenrolar-se daquela luta cósmica, entre o bem e o mal, em que se concretizam os mais altos destinos da vida, e dessa luta ele nos prevê e garante o desfecho. A linguagem do Apocalipse se transmuda de amorável como a do Evangelho, em trágica e violenta, porque exprime uma força que se ergue como espada flamejante, para derrotar definitivamente o furibundo assalto das forças do mal.

O Apocalipse move-se num terreno de batalha, a maior do universo, aquela empenhada entre Deus e Satanás, e na qual Deus vence. O mal deve ser destruído, mas ele está armadíssimo e resiste com todos os meios. Este é o maior drama do ser, em que tomam parte céu e terra, fundidos na mesma tempestade e no mesmo desenvolvimento lógico. Agita-se o mundo das causas primeiras, que movimentam seus exércitos constituídos de poderes imponderáveis, que tomam forma no desencadeamento dos elementos destruidores, manifestação da rebelião de Satanás.

A estes contrapõem-se outros exércitos,constituídos de potências espirituais, o braço direito de Deus,com que Ele fulmina os maus, rebeldes à Sua ordem. A evolução não é tranquila ascensão pacífica, mas luta cruenta,em que Satanás se empenha a fundo, para permanecer rebelde e para não ser destruído.Entoa-se assim entre o céu e a terra uma orquestração de poder cósmico. Debatem-se na Terra exércitos de homens e demónios, guiados por formas monstruosas. Mas outros exércitos lutam no céu, feitos de Anjos, e as forças do bem e do mal se medem, e só Deus, o grande general, dirige a batalha.Esta abarca o universo, transcende do plano físico ao plano moral, e deste aos mais altos planos espirituais. Treme todo o edifício do cosmos, sacudido desde os alicerces.

O pensamento de Deus, relampejante, guia a ação; Sua vontade emite centelhas de cósmico poder, as quais, exprimindo Sua ação na batalha, cintilam e ferem, ora aqui ora ali, descendo até o espaço e o tempo, em nosso mundo concreto, e fulminando os rebeldes. As falanges celestes movem os elementos num desencadear terrificante. Responde sobre a Terra o desencadeadas forças do mal. A humanidade está presa entre dois fogos,sem escapatória, fugitiva, destruída. É a hora do Juízo, a hora em que será feita justiça. O mal já se aproveitou muito, e tanto se orgulhou disso, como de uma vitória sua, que ousou subir os degraus do trono de Deus, e de desafiá-lo face a face. A medida está cheia. Uma bondade ulterior não é compatível com a ordem e o bem.

A ordem tem que ser reconstituída, para não acabar no caos. Os bons esmagados, vilipendiados, atormentados, devem ser reerguidos à sua dignidade de filhos de Deus, que lutaram e deram seu sangue para reascender, e portanto mereceram o auxílio. E Deus lhes estende o braço de Seu poder e os reergue para o alto. Esta é a hora da justiça. Fecham-se as portas da misericórdia, detém-se o porvir, para e conclui o caminho da evolução, e então se fixam as posições conquistadas por cada um, no longo caminhar, e são feitas as contas, para cada um,segundo o que lhe cabe de direito, por suas obras.

É a hora do juízo.

O Apocalipse fala de plenitude dos tempos. Estamos hoje nessa plenitude dos tempos. Deus se exprime no pensamento e na vontade da história, como uma onda que tudo arrasta e que se impõe aos homens e aos acontecimentos, e pende como um destino ameaçador sobre o mundo, porque a medida de suas iniquidades está cheia e esta é a hora de prestar contas. Vivemos em tempos apocalípticos, em que a Lei deve cumprir-se. Por muitos séculos esperou Cristo a realização de seu Evangelho. O Reino de Deus tem que chegar, custe o que custar. Não é concedido ao homem o poder de tornar vã a vinda de Cristo sobre a Terra. O drama do Apocalipse é nosso, deste nosso tempo. As forças do mal chegaram até diante do trono de Deus e, orgulhosas disso, seguras de vencê-Lo, lançam o último ataque contra Ele mesmo.

O olho de Deus, sempre aberto, olha e ainda espera. Mas a hora de Sua cobrança está próxima,porque chegamos à madureza do tempo e o Deus invencível se prepara para Seu triunfo. Ele é sempre o centro de tudo e, nomeio da grande batalha, tem em mão o cetro de comando, para que o bem vença e os bons triunfem.Achamos, hoje, no Apocalipse, uma tremenda ameaça para os maus e uma grande promessa para os bons. Já vimos no volume «Deus e Universo», que a destruição final dos primeiros, se não se converterem ao bem, faz parte integrante do próprio sistema. Está, portanto, garantida a vitória dos segundos. Ela é a vitória de Deus.

O fim do mal significa também o fim da dor, e outra saída não pode haver no extremo da caminhada. Relegar Satanás e os maus, num inferno eterno,não é ato digno de Deus, já que não podemos admitir que Sua criação possa ter, nem mesmo apenas em parte, um fim tão desgraçado. A esta sua destruição final o Apocalipse alude,como veremos, (Ap. XX:14-15) quando nos fala da segunda morte, para todos os que não foram achados escritos no livro da vida (Deus e o Bem).Doutro lado, para os bons, o Apocalipse conclui com sua felicidade e triunfo nos céus, num tripudio* de aleluias diante do trono de Deus.

Esta é a inevitável solução do conflito,inevitável porque está implícita no determinismo, o qual, como vimos, está implícito da perfeição da Lei. Ora, saibam os bons,para seu conforto e esperança que, quando tudo tiver sido feito para salvar os maus, estes, livres por sua própria natureza, se quiserem ainda permanecer rebeldes, serão destruídos. Então os bons triunfarão. Este é o conforto que o Apocalipse traz aos bons. E saibam os maus que se eles persistirem na revolta,espantosas provas os esperarão, até que sejam eliminados. Este é o aviso que o Apocalipse traz para os maus. Isto tem a função de confortar os bons, para que tenham coragem e perseverem, ede avisar aos maus para que invertam a rota. São assim oferecidos a cada um todos os meios, para subir até o bem.

O Apocalipse, assim, se pode parecer um livro duro de ameaças,pela férrea realização da Lei, é ao invés um livro imparcial de justiça; porque se a prova que ele prediz é uma solução trágica para os maus, para os bons esta é apenas um deserto de sofrimentos que tem que ser atravessado, para atingir a inefável alegria de reviver em Deus.Confortem-se, pois, os bons, porque, se hoje vivemos nos duros tempos apocalípticos, eles têm consigo este grande livro, hoje, como nunca, actual, que os sustentará nas provas,com a visão das grandes metas que devem ser alcançadas. E constitui uma maravilha da ordem que tudo rege, que o mesmo cataclismo, enviado por Deus à Terra, possa servir para sanar e reorganizar tudo — ou seja, como agente de depuração do mundo, dos maus que assim são eliminados do terreno que eles infectavam — e ao mesmo tempo, como uma prova para maior purificação dos bons, para que mais cedo e melhor possam eles tornar-se aptos a ascender para os planos mais felizes da vida. A Terra, com o homem qual é hoje, não pode ser lugar de paraíso,tão involuído é seu ambiente. Felizes os que o consideram apenas como um purgatório, para purificar-se e subir!

Os bons,portanto, nada têm que temer dos tremendos presságios do Apocalipse, porque estes não lhes dizem respeito, mas só aos maus. Embora estejam todos misturados, juntos, Deus saberá executar a delicada operação cirúrgica de cortar fora os maus,salvando os bons. Estes, até exultem, porque o Apocalipse lhes recorda que, por mais que na Terra reine o mal e pareça vencer,o bem é rei do universo; que por mais cruenta que seja a luta entre Deus e Satanás, Deus é o mais forte e estes bons vencerão com Ele; recorda-lhes que o dia da destruição dos maus será o dia da ressurreição para os bons; que por mais que domine na Terra a injustiça e a desordem, há planos de vida muito mais altos, a que os bons, purificando-se na dor, chegarão, e nos quais reina justiça e ordem. Recorda-lhes que, no fim, cada um receberá segundo seu merecimento, e não de acordo com sua prepotência, porque o verdadeiro senhor não é o homem, mas Deus que, por trás da história, está Sua sabedoria, que salva tudo do egoísmo humano.

Recorda-lhes que virá a justiça tão invocada, que reparará todos os erros, virá a verdade tão procurada, que varrerá para sempre todas as mentiras.Se aqui na Terra tudo é imperfeição, no alto estão os planos perfeitos de Deus, e o sistema da Lei, feita de bondade,dirige tudo e nada lhe pode escapar. Em nenhum livro, tanto como no Apocalipse, se sente a bondade férrea de Deus que, no momento oportuno, impõe justiça; se sente Sua invencível potência, a impor que seja respeitada a ordem; se sente, como na hora da criação, a gigantesca presença de Deus, que retoma em suas mãos as rédeas do universo, não mais para lhe dar o primeiro impulso, mas para concluir a longa caminhada seguida e julgar.

A luta cósmica entre o bem e o mal chega ao seu epílogo e se resolve na vitória de Deus sobre todas as forças,que assim são reconduzidas do caos à Sua ordem. Os problemas primeiros e últimos se reúnem na mesma solução. A última palavra do tema cósmico é o trovão do poder de Deus, é lampejo de Seu pensamento triunfante. Assim a sinfonia se realiza. Sua orquestração é um perfeito processo lógico, em que se desenvolve o funcionamento orgânico do universo, no transformismo evolutivo, até este triunfo final do bem, até nos planos mais altos, lá onde a vida é vitória do espírito.

2.ª Parte

Examinemos, agora, mais de perto, o texto do Apocalipse. Lendo-o segundo o espírito, mais do que segundo a letra, veremos seu verdadeiro pensamento, que é claro em suas grandes linhas. Esse pensamento é o mesmo que o da primeira mensagem espiritual, de Natal de 1931, com que se iniciou nossa primeira Obra. Com o Apocalipse, que apenas agora conhecemos, verificamos que ele nos repete o mesmo pensamento central que vimos desenvolvendo, desde aquela mensagem até agora, pensamento do qual uma grande profecia nos dá a mais clara confirmação.Transcrevemos a mensagem de Natal, outra vez citada em parte no cap. IV: «.... O homem chegará a um tal sentimento de orgulho e força, que os trairá... Vejo uma elevação da tensão,lenta mas constante, que preludiará o inevitável estouro do raio.

A explosão é a última consequência de todo o movimento... Em outras ocasiões, os cataclismos da história podiam ficar circunscritos; mas agora não ......«Mas a destruição é necessária. Será apenas destruição do que é forma, incrustação, cristalização, de tudo o que deve cair, para que fique apenas o conceito que resume o valor das coisas. Um grande número de dores é necessário, para que a humanidade torne a achar o equilíbrio que livremente violou;grande mal, condição de um bem maior».«Depois, a humanidade purificada, aliviada, mais seleccionada por ter perdido seus piores elementos, agrupar-se-á em torno dos desconhecidos que hoje sofrem e semeiam em silêncio e recomeçará, renovada, o caminho ascensional.

Começará uma nova era, em que dominará o espírito, e não mais a matéria, que estará reduzida à escravidão. Então aprendereis a ver-nos e nos ouvireis; nós desceremos em multidão e vós vereis a verdade».* * *Para facilitar sua compreensão, poderemos dividir o Apocalipse em três partes.A 1.ª parte contém avisos às sete igrejas da Ásia Menor e abrange os três primeiros capítulos do Apocalipse. A 2.ª parte descreve a grande luta entre o bem e o mal,até a chegada do prometido Reino de Deus.

Este é o trecho maior do Apocalipse, o que mais se relaciona connosco, porque toca nosso tempo e o futuro próximo. Vai do capítulo IV ao XIX.A 3.ª parte refere-se a um futuro remoto, até o juízo final, e vai do capítulo XX ao XXII, que é o fim.Antes de ouvirmos o Apocalipse, orientemo-nos. O caminho da evolução do pensamento religioso humano pode dividir-se em três etapas ou idades:(4)1.ª idade, de Deus como senhor. É a idade anterior a Cristo. Temos um Deus forte, terrível, guerreiro, vingativo,ciumento, protector apenas de seu povo. É o Deus dos exércitos.Deve-se-Lhe obediência servil, só pelo medo que inspira, sem compreensão nem amor, por despiedada lei de talião. 

Época violenta e feroz, em que o homem, em seu estado involuído de egocentrismo estreito e de dura insensibilidade, não podia responder senão pelo egoísmo, interesse ou temor de seu prejuízo, seguindo seus instintos de guerra, nem sabia obedecer,só compreendendo a força e o comando absoluto do mais forte.Só por isso Deus é respeitado, só porque é o mais forte e porque, como tal, tem o poder de punir. Não fora o mais forte,todos se revoltariam contra Ele. Amor e compreensão ainda não nasceram na alma humana. Os povos não podem compreender senão a obediência cega, pela força e pelo terror.2.ª idade, de Deus Pai. É a idade depois de Cristo até hoje.

Temos um Deus bom e mais pacífico, mais universal.Deve-se-Lhe obediência filial, por amor e fé. Ele pune, não por vingança, mas por justiça, e para ensinar, conhece a bondade, a misericórdia e a providência do pai para com seus filhos. Ele aproximou-se de nós em compreensão e amor, conceitos que dantes eram ignorados. Foi isto possível pela maior evolução humana, pelo que pode fazer-se apelo ao sentimento e ao coração, forças antes desconhecidas e latentes, e só hoje chamadas a agir. Pode apelar-se também à cultura e à inteligência, e surge uma doutrina e uma teologia, uma reorganização filosófica. Época também da codificação,trabalho particularmente de defesa e conservação das verdades reveladas. Mas também época de mistérios, em que se deve crer sem explicações racionais, época dos dogmas, da disciplina obrigada do pensamento, sem o que, sendo o homem o que é,não se manteria a ordem. 

Ele não sabe ainda guiar-se de per si,por livre compreensão e necessita de uma coação, ainda que seja apenas moral, para não perder-se na anarquia.3.ª idade, de Deus em nós. É a idade do Reino de Deus,na Terra, da Nova Civilização do Milénio, a civilização do espírito. Deus sai dos templos fechados e revela-Se presente em cada alma pura. Temos um Deus amigo, com quem nos unimos em colaboração, porque compreendemos que, fazer Sua vontade significa nossa felicidade. Ele tornou-se mais do que vizinho a nós, que nos fundimos n'Ele, porque em nós, pela evolução,ocorreu um despertar, pelo qual adquirimos a consciência de que Ele está em nós e de que nós estamos n'Ele.

Desaparecem não só as coações da força da 1.ª idade, mas também as morais da 2.ª idade, porque o homem progrediu e tornou-se capaz de guiar-se a si mesmo, por livre compreensão, sem necessidade de constrangimentos, para que a ordem seja mantida. A disciplina é livre, feita apenas de inteligência e amor, porque o homem compreendeu. Caem os mistérios e os dogmas de fé, porque sensibilidade, cultura e inteligência estarão mais desenvolvidos no homem, que poderá intuir a verdade directamente, por si,sentir a presença de Deus, ou pelo menos entender por meios racionais, as verdades que serão todas claramente demonstradas, porque a época dos véus e das exclusões iniciáticas já terão terminado. Esta será a época da luz do espírito, do conhecimento, da obediência, livre porque convicta.Por evolução, o Reino de Deus nascerá em nós como um despertar. Deus, então, não pune mais, mas cada homem se corrige a si mesmo, pela necessidade de harmonizar-se à Lei na qual unicamente reside a felicidade. Época da liberdade consciente, da disciplina espontânea, da convicta adesão à ordem de Deus.Esta ascensão é lógica, como o é o desenvolvimento de uma semente.

Assim se passa do terror da primeira idade, à fé da segunda, ao conhecimento da terceira; passa-se de um regime de força, a um de amor, e enfim a um de inteligência e espiritualidade. É um processo de liberação progressiva, que só pode realizar-se quando o permitir a evolução humana. Tudo é função dela. As religiões não podem ser nem mais altas, nem mais livres, do que é a natureza humana, que abaixa tudo, até o conhecimento de Deus, ao seu nível. Este último salto para a espiritualização é o grande acontecimento que nos aguarda no fim deste milénio e na alvorada do terceiro, é o grande acontecimento da instauração na Terra do Reino de Deus. É isto, justamente, o que nos anuncia o Apocalipse.

Comecemos, então, o exame da segunda parte do Apocalipse.

Nos primeiros dois milénios, a obra de Cristo na  Terra foi uma fase preparatória do próximo advento do Reino de Deus. Nesta fase devia realizar-se: l.º a experimentação biológica dos novos princípios do Evangelho, para que a vida,evoluindo, conseguisse aos poucos aprender e, ao menos uma pequena parte, a eles adaptar-se; 2.º, a assimilação, para que ditos princípios novos começassem, com a repetição e a técnica dos automatismos, a fixar-se um pouco nos instintos; 3.º, a conservação do património espiritual herdado, para que as verdades reveladas pudessem, através das tempestades dos séculos, chegar intactas aos novos tempos. Desta fase preparatória, passa hoje à realização. Se, na penetração do Evangelho na vida, pouco se fez em 2.000 anos, ele continua entretanto a amadurecer nas almas, continua sua obra de elaboração interior, para que o mundo ressurja, na aurora do terceiro milénio, tal como Cristo ressurgiu na aurora do terceiro dia.Mas esta vitória dos seguidores, nos quais se personificam no pensamento de Cristo na Terra, não é pacífica. 

É ao contrário uma luta gigantesca, a qual, no entanto, é apenas o momento terrestre de uma batalha cósmica, em que se agita e treme o universo. É luta de Satanás contra Deus. O Apocalipse narra-nos suas vicissitudes. Eis o esquema geral. Até certo momento, Deus olha e espera, deixando o homem livre para experimentar, a fim de que aprenda. Esta é a livre ação dos homens contra Deus (os primeiros 4 selos). Há depois a acção oposta dos amigos de Deus (5.º e 6.º selos). E finalmente há a acção directa de Deus que, saturada a medida, intervém directamente, breve, instantâneo. «Está feito», diz o Apocalipse.

O reino de Satanás é destruído, e Deus venceu. Esta é, nas grandes linhas, o plano da 2.a parte do Apocalipse, a de que agora nos ocupamos.Tudo isto é expresso com 4 símbolos maiores: os selos,as trombetas, os portentos, as taças da ira de Deus. Esses símbolos, cada um em número de sete, exprimem o desenrolar-se da acção da grande batalha. O mesmo ritmo, com que avançam esses símbolos, várias concordâncias em seu conteúdo, e até idênticas palavras às vezes repetidas no mesmo ponto de seu ciclo, autorizam-nos a entender estes quatro símbolos, como expressão diversa, segundo vários mirantes, dos mesmos acontecimentos. 

Quisemos, por isso, emparelhar selos,portentos, trombetas e taças, para ler neles os mesmos fatos,mais bem demonstrados em aspectos diferentes.Imaginemos o Apóstolo João, que já pousara a cabeça no peito de Jesus e o vira morrer, velho, após uma vida de acção e paixão, orando a Deus de joelhos, diante das florestas da ilha de Patmos, com a cabeleira desgrenhada pelos ventos do mar e a alma presa na tempestade imensa das vicissitudes do mundo.Arrebatado na imensa visão, supera o tempo e o espaço e projecta seu olhar fulgurante no futuro. Olham-no os céus luminosos do oriente fantástico, e mais no alto, o olho de Deus,diante do qual ele treme e se inclina, ora, humilha-se e se incendeia.

Ouve então uma voz que lhe diz : «O que vires,escreve-o num livro....». E ele viu e narrou: «...e vi, e depois disso, vi....».Começa assim o Apocalipse. Abrem-se os céus. «Eu sou o alfa e o ómega*, diz o Senhor Deus, o que é, que era e que será, o Omnipotente». Eis que aparece a visão do trono de Deus,diante do qual se eleva o cântico: «Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Omnipotente»... João vê na direita d’Aquele que estava sentado sobre o trono, um livro fechado e selado com sete selos.

O Divino Cordeiro toma-o da mão direita d’Aquele que estava sentado sobre o trono e o abre, rompendo um selo após o outro. João olha e conta.Assim, após este prelúdio poderoso, começa a desenrolar-se a história espiritual do mundo. Soam as sete trombetas, aparecem visões terrificantes, monstros espantosos,rasgam-se os céus donde chove destruição, e sete anjos derramam sobre a Terra as sete taças da ira de Deus,aniquilando os exércitos do mal. No entanto, os bons têm paciência, são escolhidos, reúnem-se e, enquanto ruem todas as sumptuosas construções de Satanás, cantam por fim sua vitória no céu, Cristo chefiando-os triunfa e Satanás é acorrentado.Verdadeiramente, as portas do inferno não prevalecerão.

Desenrola-se a acção ao mesmo tempo na terra e no céu, que se fundem num único drama. E é este seu epílogo feliz: após uma luta apocalíptica, um final cósmico em que lampeja a potência vingativa de Deus. Se o livro é terrificante em suas vicissitudes e pode parecer uma cruel e desapiedada mensagem da ira de Deus, na realidade ele narra a história da salvação do mundo,por aquela inteligência que tudo guia, imposta à multidão humana que, desesperadamente, luta para destruir tudo e perder-se, enquanto é absoluta a vontade de Deus que tudo seja reconstruído. Mas sigamos as vicissitudes mais de perto. Os selos são abertos um a um. E eis que aparecem os quatro famosos cavalos do Apocalipse; primeiro o cavalo branco, depois, no selo seguinte, o vermelho, depois o negro, e enfim o pálido ou verde-amarelado, quando se rompe o quarto selo.

As personagens começam a aparecer na cena, mas ainda não agem,deixando-se apenas identificar por suas notas características. A  tempestade ainda não explodiu e tudo está à espera. A estas quatro figuras foram dadas as mais diversas interpretações.Tentemos uma também nós, mas tendo presente que, neste ponto, saímos do terreno sólido da certeza, para entrar no das probabilidades. Ofereceremos pois tudo como hipóteses, porque assim exige a mentalidade moderna. Entretanto, teremos em conta todas as razões positivas que corroborem essa hipótese.Para conseguir melhor nosso intento, faremos, como dissemos acima, um paralelo entre estes quatro primeiros selos e correspondentes prodígios, isto é, entre o cap. VI (1 a 8) e os cap. XII e XIII inteiros, do Apocalipse.

Referiremos mais particularmente à mesma primeira personagem, tudo o que se relaciona como o cavalo branco do 1.º selo e o dragão do primeiro prodígio (cap. XII). Depois referiremos à segunda personagem o que se diz do cavalo vermelho do segundo selo e da besta que saiu do mar (cap. XIII - 1 a 10). Enfim, referiremos à terceira personagem o que se diz do cavalo pálido do quarto selo e da besta que saiu da terra (cap. XIII - 11 a 18). O terceiro selo (cavalo negro) nós explicaremos, mais tarde, porque o deixamos para o fim. Estes dois ciclos parecem-nos paralelos e sua função indicar-nos-á melhor a personagem. No fim deste seu primeiro período, em ambos os casos, entram igualmente em cena os bons, cantando hosanas diante do trono de Deus, e no segundo caso é repetido o número exato, 144.000 dos escolhidos, como no primeiro.

Tudo isso dá a impressão de que se trata do mesmo acontecimento, narrado em duas formas diferentes.Sem entrar em pormenores, coincidências e razões, que cada um pode achar e analisar por si, daremos ao cavalo branco o valor de símbolo do imperialismo inglês; ao cavalo vermelho o símbolo da Rússia soviética, ao cavalo negro o da Alemanha de Hitler, e ao cavado pálido o dos Estados Unidos da América.Esta interpretação tem a vantagem de referir-se ao momento histórico actual, que é o que mais nos interessa. Vejamos agora nos selos as quatro personagens em pé, até a última guerra mundial. Nos prodígios, o ponto de vista seria em relação ao nosso actual presente, em que o cavalo negro ou Alemanha do Eixo desapareceu, porque caiu e foi aniquilado.

Só permanecem de pé os outros três, isto é, Inglaterra, Rússia e Estados Unidos,que achamos nos três prodígios, na forma de dragão, da besta que saiu do mar e da besta que saiu da terra. Estas três potências são hoje as senhoras do mundo e guiam os acontecimentos.Para justificar esta individuação, trabalho que nos levaria a um exame muito detalhado das características particulares dos símbolos que representam essas personagens,baste-nos apenas recordar que o dragão é poderoso e no entanto se arrasta como serpente, que é o símbolo da astúcia enganadora. 

A besta representa claramente a animalidade involuída, em antítese com o espírito, aquela para a qual apela o materialismo moderno que se baseia apenas no bem-estar do corpo. As duas personagens são apenas duas bestas diversas,isto é, duas formas de materialismo, idênticas na substância, que é a de apegar-se só às coisas da terra, única finalidade da vida.Tudo isto em antítese ao reino do espírito, em que se apreciam outros valores.Para justificar a individuação paralela correspondente ao dragão (cap. XII), isto é, o cavalo branco ou Inglaterra,recordemos as palavras que a respeito desse cavalo, diz o Apocalipse: «...e lhe foi dada uma coroa e saiu, como vencedor,para vencer». Pela primeira besta, ou cavalo vermelho, ou Rússia soviética, diz o Apocalipse: «...foi-lhe dado poder de tirar a paz da Terra, de tal forma que os homens se matassem uns aos outros, e lhe foi dada uma grande espada». Para o cavalo negro, ou Alemanha do Eixo, o Apocalipse fala de medida e limitação de víveres, como na última guerra bem se experimentou.

Para a segunda besta ou cavalo pálido, ou Estados Unidos, fala o Apocalipse de morte e destruição, e estas foram lançadas sobre a Europa a mancheias. Além disso, as cores vermelha para a Rússia, e negra, cor do Eixo, são evidentes. Os Estados Unidos aparecem também no último, no 4.º selo, como apareceram na última guerra.Observemos, agora, as qualidades do 2.º prodígio, isto é,da besta que saiu do mar (Ap. XIII, 1 a 10) para ver se concordam com as da mesma personagem, ou seja, a Rússia soviética, expressa no 2.º selo ou cavalo vermelho. Besta quer dizer materialismo, como vimos, e o mar significa os povos,nações, línguas (ap. XVII, 15). Depois, o texto diz: «...e vi uma de suas cabeças como ferida de morte: mas sua chaga mortal foi curada». Isto podia significar a salvação de um grande golpe que ameaçou a Rússia, em Stalingrado.

E o texto acrescenta:«...e lhe deu o dragão seu poder e seu trono e grande poder... E toda a Terra ficou arrebatada de admiração pela besta. E adoraram o dragão, porque dera autoridade à besta e adoraram a besta dizendo: Quem é semelhante à besta e quem pode concorrer com ela? ...»Com efeito, não foi o recente poderio da Rússia devido ao apoio inglês (dragão), que depois convenceu os Estados Unidos a fazer o mesmo? Seguiu-se a fé fanática das massas pela ideologia comunista e todos adoraram os vencedores:materialismo, Inglaterra, Rússia. O texto prossegue: «...E abriu sua boca blasfemando contra Deus, blasfemando Seu nome .... e lhe foi dada faculdade de fazer guerra aos santos e de vencê-los....».

O ateísmo russo é conhecido e bem assim sua campanha anti-religiosa. Importante que, depois de ter dito:«....e lhe foi dada faculdade de agir por 42 meses....»(5) vem a conclusão: «...se alguém tem ouvidos, ouça. Se alguém prender alguém, acabará preso; se matar à espada, será fatalmente morto à espada...». Eis, pois, como deverá acabar a Rússia: na auto-destruição. Este conceito faz parte da Lei e do sistema ilustrado nestes volumes, conceito amplamente explicado alhures. «Quem usa a espada, perecerá pela espada», norma evangélica que é lei de vida, que nenhuma força humana poderá deter.

O Apocalipse conclui: «...Aqui está o sofrimento e a fé dos Santos». Os bons, pois, tenham coragem, que o mal não pode absolutamente vencer; existe a justiça de Deus e ninguém pode detê-la.Observemos, agora, as qualidades do 3.º prodígio, ou seja da besta que saiu da terra (Ap. XIII, 11 a 18) para ver como concordam com as da mesma personagem, isto é, os Estados Unidos da América, expressas no 4.º selo ou cavalo pálido.Vimos que o cavalo negro do 3.º selo, ou Alemanha, desapareceu da cena política do mundo. Essa besta é outra forma de materialismo, que sai do poder da terra, riquezas do solo e indústrias. Diz o texto: «...e falava como um dragão...».

Ou seja, a mesma língua inglesa. «...e todo o poder da primeira besta, ela o exercitava diante dela...», apresenta já realizados, de  facto, os sonhos de bem-estar do comunismo russo. «....E fez que a Terra e seus habitantes louvassem a primeira besta, de que fora sanada a chaga mortal....». Foi pelo auxílio dos Estados Unidos que a Rússia se tornou vitoriosa e grande. «....E fez prodígios grandiosos, tanto que fez descer fogo do céu sobre aterra...». Eis as fortalezas voadoras, as bombas atómicas, as novas descobertas científicas... «...E fará que ninguém possa comprar nem vender, se não tiver a marca, (ou seja) o nome da besta e o número de seu nome....». Isto é, domínio completo do dólar sobre tudo.

O capítulo conclui com o famoso número 666.

Calculando-se segundo o alfabeto hebraico, esse número diz Nero. Mais tarde, foi dada a essa cifra, segundo os casos, o significado de uma quantidade de personagens históricas.Talvez seja um número de fantasia, para dizer que muitas personagens igualmente más, se apresentarão até o fim da história. Mas tudo isto é trabalho para adivinhos, terreno em que não podemos entrar. Neste ponto, ocorre, em ambos os ciclos, uma mudança de cena. Até aqui, assistimos à descrição de personagens em suas características e feitos passados.

Agora temos um entre-acto, em que entram em cena as personagens das fileiras opostas, os soldados de Deus. Abre-se o 5.º selo. Os bons apelam para que se faça justiça e lhes é respondido que ainda fiquem quietos por breve tempo, até que seja completado o número de seus irmãos sacrificados. Ao abrir-se do 6.º selo,inicia-se a preparação espiritual dos soldados de Deus, a qual contrabalança a preparação material de Seus inimigos. Isto é necessário, porque se aproximam as grandes provas, que explodirão ao abrir-se do 7.º selo. Temos uma breve pausa,antes de desencadear-se a grande tempestade. Tudo faz pensar que esta pausa seja a hora presente. É um momento de espera em que as forças contrárias se preparam, medem-se, tomam o impulso para lançar-se uma contra a outra. Deus olha e espera,deixa-nos a todas as nossas experiências, que pretendem dispensá-lo.

Os maus movem-se afoitos à conquista do mundo,e caminham para sua destruição. Os bons oram, tremem,esperam. Deus olha, deixa todos livres, mas tudo se escreve no livro da vida, de que nada mais se apaga, e pelo qual todo o mal se paga e todo bem frutifica. A Lei não tem pressa, pois o tempo não pode detê-la e nada pode escapar à sua sanção. Este exame que estamos fazendo do Apocalipse e de sua orientação,interessa-nos sobretudo porque parece dizer respeito ao nosso presente, e dá-nos uma chave para conhecer nosso futuro próximo. Estamos num período de parada, em que o homem continua suas loucuras, sem saber que espada de Dâmocles lhe pende sobre a cabeça. Um nervosismo dominante revela-nos que o instinto sente vagamente o aproximar-se da tremenda reação da Lei.

Ninguém mais tem fé no amanhã, tão prenhe de ameaças é o presente. Com o 7.º selo iniciar-se-á, com efeito a série dos castigos, porque estamos próximos da hora em que Deus, já tendo esperado bastante, terá esgotado os oferecimentos de salvação e terá que intervir para que volte a ordem e a justiça seja feita.Na abertura do 6.º selo vemos, portanto, duas manifestações opostas. Os maus desencadearam uma grande guerra. É obra deles, não ainda a de Deus. Paralelamente são escolhidos os bons para formar o contra-exército dos filhos de Deus.

A tempestade procurada pelos maus toma o aspecto de um cataclismo natural: «...E todos se esconderam nas  espeluncas* e rochas das montanhas...». Esta é a última tentativa para salvar-se das incursões aéreas, que desta vez serão atómicas. Doutro lado são retidos por um anjo, os ventos,para que estejam tranquilos e nenhum dano causem enquanto não estejam marcados nas frontes, com o selo, os servos de Deus. E o número desses escolhidos será 144.000. 

(Sendo este número dado por 12 x 12 x 1000 = 144.000, e representando o número sagrado plenário, pode significar grande multidão).Forma-se, pois, multidão inumerável, de todas as raças, povos e línguas, diante do trono de Deus, multidão daqueles que vinham da grande tribulação; e Deus estenderá sobre eles Sua tenda.Esta cena acha sua correspondência na de todo o cap .XIV do Apocalipse, que segue o 3.º prodígio da besta que saiu da terra, como vimos.

Achamos aqui os mesmos 144.000,marcados na fronte. Repete-se a cena do cântico diante do trono. Estes são os escolhidos do exército de Deus. Continua o paralelismo num prolongamento de repouso. O cap. XIV continua com os anúncios feitos pelas quatro vozes de anjos.São os últimos acontecimentos, antes da catástrofe: «...Temei a Deus, porque chegou a hora do Seu juízo... Quem adora a besta e sua imagem e traz seu sinal na fronte ou na mão, beberá o vinho da ira de Deus, que está pronto no cálice de Sua cólera...».Termina aqui o entre-ato. Continuemos a observar as duas narrações em paralelo.

Na primeira delas chegamos finalmente à abertura do 7.º selo. Então houve um grande silêncio no céu. E foram dadas sete trombetas a sete anjos.Enquanto eles se preparam para tocar as trombetas, eleva-se de um turíbulo de ouro o incenso diante do trono, com as orações dos santos, e sobe a fumaça do incenso com suas orações até Deus. É o momento solene em que começa o desencadear-se a  justiça divina. Tocarão agora, de seguida, as sete trombetas e a cada toque seguir-se-á um flagelo sem escapatória, numa tempestade, até o 7.º toque. Então tudo muda e, como na abertura do sétimo selo explodira o cataclismo, (as sete trombetas), assim ao 7.º toque tudo se acalma e o 7.º anjo e outras vozes anunciam: «O reino do mundo passou ao Senhor nosso e ao Seu Cristo, e Ele reinará pelos séculos dos séculos».

Eleva-se uma oração: «Agradecemos-Te, Senhor Deus omnipotente, porque assumiste Teu grande poder e começaste a reinar... veio Tua ira... e o momento de premiar Teus servos... e de destruir os destruidores da Terra». (Ap. XI, 15 a 18).Observemos outra narração paralela. Também aqui terminou o entre-ato e explode a catástrofe. Após as últimas advertências das quatro vozes (Ap. XIV, 6 a 13), há ainda um prolongamento de espera com novos anúncios. E outro Anjo grita ao divino Justiceiro, que aparece sobre uma nuvem:«...Apanha tua foice e ceifa, pois chegou a hora de ceifar,porque a colheita da Terra já está seca».

Outro Anjo grita:«...Apanha tua foice afiada e colhe os cachos da vinha da Terra,porque suas uvas estão maduras...». Então, à semelhança dos 7 anjos com as 7 trombetas, aparecem outros 7 anjos com as sete taças de ouro cheias da ira de Deus. Mas, também aqui, como na outra narração, antes que se passe à ação, se eleva um cântico a Deus (Ap. XV, 1 e seguintes), glorificando-O e adorando-O. Todas as nações se prostrarão diante dele, porque manifestou Seu juízo. 

É a hora de prestar contas.

Os 7 anjos tomam as 7 taças. Enche-se o santuário de Deus da fumaça de Sua glória e de Seu poder; e ninguém poderá aí entrar até que tenham sido derramadas as 7 taças. É o momento solene em que começa o mesmo desencadear-se da justiça divina, como para  as 7 trombetas. Derramar-se-ão de seguida, sobre a Terra, as 7 taças da ira de Deus, e a cada taça seguir-se-á um flagelo sem escapatória, numa tempestade gigantesca, até à 7.ª taça. Tudo foi merecido. As taças são esvaziadas sobre a terra, sobre o mar,depois sobre os rios e as fontes, depois sobre o sol, sobre o trono da besta, no próprio ar. Torna-se tudo de sangue e de fogo, seca, arde, adoece, rui numa queda universal.

À sétima taça, aqui também, a acção se detém, como na sétima trombeta, e uma grande voz sai do Santuário, do lado do trono, dizendo:«Está feito». Tudo é claro, conclusivo, os inimigos de Deus não existem mais, o drama está completo com a vitória de Deus, o reino de Satanás foi destruído, aponta a alvorada do novo Reino de Deus. Este momento, expresso pela palavra: «Está feito»,corresponde ao do 7.º toque da trombeta que anuncia: «O reino do mundo passou ao nosso Senhor e a Seu Cristo, e Ele reinará nos séculos dos séculos». 

Esta poderia ser uma interpretação do conceito central do Apocalipse, sobrevoando sobre os pormenores, mas apanhando claramente o que há de mais importante, que se referiria de modo impressionante aos nossos tempos. É admissível, também, que numa revelação profética, proveniente por inspiração de dimensões superiores, a sucessão no tempo possa ter sido dada de modo pouco exacto, em nosso plano devida, justamente porque o profeta não pode deixar de perceber tudo como num estado de concomitância. Explica-se, assim,certa mistura de pormenores e a repetição da mesma visão como projetada em dois tempos diferentes que, à primeira vista,poderiam a nós parecer sucessivas.

De qualquer modo,apresentamos tudo isto ao leitor moderno positivo, apenas como hipótese, que ele poderá controlar e também não aceitar. Mas esta nos pareceu a maior aproximação hoje possível de uma interpretação, racionalmente conduzida, do Apocalipse aos tempos actuais. 

E quando virmos tudo concordar, permanecendo logicamente enquadrado no sistema da Lei, até agora explicado, estas afirmações serão mais aceitáveis, mesmo para o homem positivo moderno.A substância do raciocínio é simples e nestes livros foi dito e repetido. Tudo é dirigido por uma lei que representa o pensamento de Deus. Assim, além da pequena liberdade humana, existe um determinismo inteligente histórico, que guia os acontecimentos. O homem hoje tomou a posição de Satanás,rebelde à Lei. É natural que o sistema lhe caia em cima.

Dada sua orientação, o homem hoje se acha na posição de abandonado por Deus que, no entanto, respeita a sua liberdade, não o força,mas se retrai. E diz: «Quereis experimentar a força?Experimentai-a. Mas avisei-vos de que, quem usa a espada,perecerá pela espada. Credes nos exércitos e nas armas?Provai-as. Não quereis o amor evangélico e só concordais numa coisa: na mentira, no egoísmo, no trair-vos todos uns aos outros? Pagareis todos juntos. A punição, a realizareis vós mesmos, porque a trazeis em vós. Matar-vos-eis reciprocamente, porque a isso vos leva vosso próprio sistema.Quereis fazer do poder não uma função de vida e uma missão,mas um meio para esmagar indivíduos e povos? Fazei-o.Experimentai, experimentai. Sois livres. Assim vos massacrareis todos, mas, já que não sabeis aprender de outro modo, e precisa aprender, ireis à dura escola que escolhestes».Este raciocínio lemo-lo idêntico no Apocalipse, de modo que ele parece escrito de propósito para nosso tempo.

E se parece feroz e sem piedade, não exprime todavia senão a exacta conseqüência da livre mas louca conduta humana, no seio de uma Lei, cujas reacções são fatais.Estaremos agora no termo do período experimental da Lei, momento em que Deus já esperou bastante; as experiências humanas fazem-se cada vez mais, e agora desastrosas demais,para que não seja preciso uma intervenção superior para detê-las. O limite de elasticidade da Lei está quase sendo superado, quebram-se suas colunas protectoras e o sistema —como já ocorreu no princípio com a revolta de Satanás —desaba sobre os rebeldes que soçobram no caos por eles mesmos gerado na ordem de Deus. Soa então a hora do juízo,fazem-se as contas para que cada um tenha segundo suas obras e merecimentos. A esperada realização do Evangelho na Terra não deve ser frustrada mais tempo, a maldade e malícia humanas não podem mais ter por longo espaço o poder de  tornar quase inútil a vinda de Cristo à Terra. A Igreja desempenhou sua missão de conservar sua preciosa bagagem,arrastando-a após si, através da tenebrosa época dos dois milénios. Hoje é mister realizar. No terceiro milénio, tal como Cristo no terceiro dia, é preciso ressurgir. Não basta a excepção dos Santos.

O Evangelho deve apossar-se e penetrar a vida do homem, tem que inserir-se nas instituições sociais. Tudo nos diz que estamos na plenitude dos tempos. Já foram feitos bastantes anúncios e avisos. Estamos justamente nas pausas, ou entre-actos, que agora estudamos no Apocalipse, e que precedeu o desencadear-se da tempestade? Quando se abrirá o 7.º selo e tocarão as trombetas, ou então se derramarão as 7 taças da ira de Deus? E que pode o homem sozinho, contra a grande inteligência que dirige a história e a vida? O certo é que, se foi reconhecida, nos planos superiores, a necessidade de uma intervenção directa de forças sobre-humanas, e se foi decidido executá-la, ninguém poderá detê-lo. Então a história disporá de tais forças que poderá realizar o que hoje nos parece inacreditável, isto é, a formação de novas correntes repensamento e de diferentes tipos biológicos dominantes, a purificação da humanidade, custe o que custar, e a posse que ela tomará no seio de uma nova civilização do espírito no terceiro milénio.

O que está fora de dúvida, é que acima das forças domando físico, conhecido pela ciência, há um mundo de forças que ela ainda ignora. Também fora de dúvida está, que o homem é uma pequenina formiga, agarrada a um grão de poeira cósmica, e nada pode contra essas forças. E está outrossim fora de dúvida, que nós não podemos negar a priori a possibilidade de acontecer em nosso tempo tudo o que o Apocalipse prediz.Como negar, mesmo cientificamente, que não pode haver relação entre forças morais e físicas? E quem pode dizer que a humanidade não esteja cometendo erros no terreno espiritual?Como afirmar que os poderes do pensamento não dirijam o mundo?

E então, aos céticos, poderemos dizer: «E se tudo o que afirma o Apocalipse fosse verdadeiro»?A visão da grande prostituta (Ap. XVII) é apenas um comentário e uma determinação de toda a visão. Esta mulher é a contraposição daquela vestida de sol, com uma cora de doze estrelas, contra a qual luta o dragão do primeiro prodígio, agora examinado. Se nesta alguns vêem a Igreja, ou até mesmo a Virgem Maria, na outra, Babilônia a grande, mãe das prostitutas, vêem a cidade de Roma de Nero, das 7 colinas e 7 imperadores (de Nero a Domiciano), outros o paganismo corrupto, outros o materialismo de nossos tempos, outros, como diz o Apocalipse, a riquíssima rainha dos mares, isto é, a Inglaterra protestante, vestida de trabalhismo e em conúbio com a besta.

Mas, enquanto alguns católicos preferem ver aí o protestantismo, alguns protestantes aí vêem a Igreja de Roma,que lhes parece haver traído a missão de Cristo a ela confiada. 

Para outros, a grande prostituta é a Europa. 

Olhando seu mapa virado, a partir do nordeste, seu perfil sobre os mares pode dar a impressão de uma mulher sentada sobre a Rússia, que representaria a besta vermelha, como diz o Apocalipse, sobre a qual está sentada a grande prostituta. O braço direito seria a Itália, e com ele parece segurar um cálice (a Sicília), ao passo que o braço esquerdo seria a Inglaterra, a cabeça a Espanha, e o chapéu, Portugal. E Roma estaria no meio do braço direito. O cap. XVII que fala da prostituta, termina com este esclarecimento: «...As águas que viste, onde está sentada a meretriz, são povos e multidões, e nações e línguas...». 

E a Rússia teria justamente a tarefa sinistra de devorar a civilização europeia.

Esta interpretação provém, naturalmente, de escritores do lado americano do Atlântico, porque todos gostam de colocar o próximo nos erros e nos castigos, mas jamais a si mesmos.Sem dúvida, em nosso tempo a ciência conseguiu conquistas inauditas. O automóvel, o rádio, a televisão, o domínio do ar, a descoberta da energia atómica, e até a previsão de uma possibilidade de explorações interplanetárias,representam uma tal conquista sobre as forças da natureza, que não se pode imaginar mais até onde possa chegar o homem. Há muitos elementos materiais para sustentar modos de vida absolutamente novos, num tipo de civilização de formas hoje incríveis. Os elementos-base para uma transformação radical de conceitos e hábitos, já estão em prática. Os fundamentos científicos e práticos de uma nova civilização já foram lançados com um entusiasmo sem precedentes, na conquista do tempo e do espaço, os dois grandes obstáculos ao livre movimento do homem.

Sem dúvida, estas conquistas materiais reagirão,também, sobre o estado psíquico e espiritual da humanidade,ajudando-a a evolver.Mas, infelizmente esse aumento de poderes é uma arma de dois gumes, porque, se não for acompanhado por um desenvolvimento paralelo de consciência, no terreno moral,pode representar um novo poder imenso de destruição colocado nas mãos de um inconsciente que, em sua inexperiência, não se sabe que uso possa disso fazer. Com a descoberta da energia atómica, o homem não se deu conta, ainda, de onde pôs as mãos, ou seja, de haver penetrado tão próximo à substância das coisas, tanto que se apossou da técnica da criação. Assim seus poderes cresceram sem medida, e se ele pode tirar vantagens proporcionais para seu bem, pode também sofrer dano, para seu mal.

E é tão grande o novo poder, que lhe pode escapar das mãos inexperientes, sem que lhe seja possível mais controlá-lo,depois. E que dizer, quando esse poder não está, hoje, nas mãos dos sábios, mas de governantes que, por sua própria posição,estão enredados nas tristes artes da política? Que dizer, quando se sabe que esse poder está à mercê do egoísmo, do ódio, do interesse, do desencadear das mais baixas paixões? Que garantia de sabedoria podem ter, a esse respeito, governantes que só chegaram ao poder suprimindo os próprios rivais e mantendo-o com o terror? Se essa é a psicologia dos senhores dessas forças, pesa verdadeiramente sobre o mundo uma espada de Dâmocles, suspensa por um cabelo.Se esse cabelo arrebenta, é a guerra.

E a guerra de hoje tem as seguintes características: 1.º ameaça todos, mesmo os civis. É pois, também, guerra de nervos, é perigo e terror para todos; 2.º morrem todos, indistintamente, mesmo os inermes,numa hecatombe comum; 3.º é guerra em três dimensões; 4.º é guerra de todos os povos, porque mesmo os longínquos  não-beligerantes se ressentem e saem dela com algum dano ou sofrimento; 5.º é guerra de extermínio, total, de aniquilamento,sem escapatória, em extensões vastíssimas.Se arrebenta o cabelo da espada, ela cairá na cabeça da humanidade.

Essas condições são tão catastroficamente ameaçadoras, que jamais se verificaram na história do mundo.Não serão estes os sinais indicadores da plenitude dos tempos,como dizem as profecias? Mas elas também dizem outra coisa:«Ora, quando estas coisas começarem a acontecer, olhai para o alto e levantai vossas cabeças, porque vossa redenção está próxima... Quando virdes acontecer estas coisas, sabei que o Reino de Deus está próximo». (Luc. XXI, 28 e 31). Esses sinais prenunciadores de acontecimentos espantosos anunciam, então,também outra coisa, ou seja, a plenitude dos tempos, também no sentido de que deve chegar à Terra o Reino de Deus, isto é,se deva realizar o novo modo de viver, o tipo da civilização do terceiro milénio. Estamos, portanto, verdadeiramente na época extraordinária da qual falam as profecias e que culmina numa transformação radical do mundo.

Mas ainda há outro fato indicador, outro sinal dos tempos: é a queda dos mistérios.

Estes aos poucos são todos explicados e aclarados pela ciência. Então poderemos repetir as palavras de S. Paulo na Epístola aos Hebreus (X, 26, 27 e 31):«Se pecamos voluntariamente, após ter conhecimento da verdade, não há mais sacrifício pelos pecados, mas uma espantosa expectativa do juízo... É coisa espantosa cair nas mãos de Deus vivente». Quando tudo estiver esclarecido e evidente, quem não quiser aceitar as verdades do espírito e obedecer à Lei, não poderá mais achar misericórdia, porque anão merece.Poderão mudar e ser incertos os pormenores das previsões políticas, mas o que é certo é que o povo, grupo ou instituição que tiver pecado, terá que pagar. Esta é a lei certa.Cada um poderá deleitar-se em fazer o exame de consciência nos outros, antes que em si. A lei permanece a mesma.

É inútil ter poder terreno, se há injustiça no espírito. Esse poder não poderá defender-nos e ruirá diante da Lei que quer justiça.Assim conclui o Apocalipse, no cap. XVIII: «Ai, ai da grande cidade, Babilónia a cidade forte! Num momento chegou o juízo!... Num momento, sua magnificência ficou reduzida a um deserto! Alegrai-vos por ela, ó céus, e vós santos e apóstolos e profetas, porque vos fez justiça Deus, com Sua condenação!»Paralela a essa ruína do mal, corresponde o triunfo nos céus (Ap. XIX). A ruína na Terra foi completa. A voz de uma multidão imensa se eleva gritando: «...Aleluia! O Senhor fez justiça... Louvai nosso Deus!... porque o Senhor Deus começou a reinar».   

Chegamos ao epílogo, que é a vitória de Cristo.Satanás é acorrentado. Pode finalmente realizar-se na Terra o anunciado Reino de Deus. Tudo isto é de uma lógica constringente. É possível que o bem fique vencido pelo mal, Deus por Satanás, que a missão de Cristo, na Terra, naufrague assim, sem nenhum resultado?

O próprio sistema da Lei tem uma lógica e, se tudo isso acontecesse, todo o sistema ruiria. E isto seria uma ruína muito mais fragorosa e desastrosa do que a queda das potências do mal, como o descreve o Apocalipse.Pois, se estas ruem, permanecem a salvação e a vida na ordem divina. Mas se a Lei, isto é, o sistema de Deus e do bem, se arruinam, só fica a destruição de tudo, pela precipitação definitiva do universo no caos.O grande drama do Apocalipse está em seu epílogo e fecha-se, em sua terceira parte, com a cena grandiosa da ressurreição dos mortos e do Juízo Universal. Satanás está definitivamente derrotado. Diante do trono de Deus comparecem os mortos. Abre-se o livro da vida, em que tudo está escrito e cada um é julgado segundo suas obras.

O mar entrega os seus mortos. A morte e o inferno entregam seus mortos. Depois «...a morte e o inferno foram lançados no lago de fogo; esta é a segunda morte. E aquele que não foi achado escrito no livro da vida, foi lançado no lago de fogo» (Ap. XX,14 e 15). Há, pois, uma absoluta destruição final, em que são anulados também a morte e o inferno, uma segunda morte,última e definitiva, em que são precipitados todos os que não foram achados escritos no livro da vida. E a vida é Deus. Então isto significa, os que não eram da parte de Deus e do bem. Eles são eliminados do sistema, anulados mesmo como espíritos.Esta não é a habitual morte do corpo, não é a normal decadência de todas as coisas, para renovar-se e evoluir. Não é a costumeira morte temporária, de que tudo ressurge. 

Esta é a segunda morte,a definitiva, do espírito.

Chegamos ao limite da Lei, na hora em que o ciclo involução-evolução se fecha com o regresso a Deus, termina a cadeia das reencarnações, está completa a caminhada da reascensão, concedida por Deus ao ser decaído para redimir-se,cessa a possibilidade de erro e a necessidade da expiação. Está na lógica do sistema, que a experiência não possa ser procrastinada até o infinito, que o ser não possa ter à sua disposição a misericordiosa elasticidade da Lei e a paciência de Deus, para sempre. Seria um absurdo inadmissível, na ordem que tudo dirige, que se concedesse à liberdade humana, que ela se sobrepusesse à Lei e se substituísse a ela, ultrapassando os limites das próprias funções, para as quais, apenas, é admitida a liberdade, e assim subvertesse eternamente aquela ordem.

Deve chegar a hora em que termina o tempo máximo concedido, para que o caminho da evolução tenha sido percorrido por aqueles que o quiseram percorrer, o tempo em que todos os auxílios foram dados, todas as possibilidades esgotadas, a hora em que se fazem as somas, e ficam de fora aqueles que, mesmo tendo-o podido, absolutamente não quiseram redimir-se. Então, tudo está terminado, pois o processo evolucionista atingiu suas conclusões.

Detém-se então o tornar-se fenoménico, isto é, cada fenómeno não se prende mais ao seguinte, mas alcança finalmente sua última e definitiva fase, resolvendo-se na estase, porque se esgotou o processo do tornar-se, e na cadeia... causa-efeito-causa..., não há mais anéis. Então para o transformismo, no tempo, termina toda possibilidade de recuperação e a escola se fecha.Já então, por não terem mais sentido nem objetivo,acabam a morte, a dor, os estados de castigo, o inferno.

Esgotados os parênteses da revolta e da desordem, tudo tem que voltar ao estado perfeito da originária felicidade, como Deus quis sua criação. O ciclo da descida e da reascensão está todo percorrido, quem quis redimir-se alcançou sua salvação e,mesmo tendo errado, aprendeu a grande lição do bem e do mal.Quem não quis redimir-se, dado que ninguém pode ser constrangido e que o rebelde não poderia permanecer indefinidamente aí, nem inquinar o sistema, este rebelde vem definitivamente expulso, com o aniquilamento de seu eu. Então é lógico que tudo o que era necessário num universos decaído,para tornar a subir a Deus — todos os instrumentos úteis para realizar a obra de reconstrução — não tendo mais objectivo de bem nem razão de existir, são eliminados, da mesma forma que a um edifício construído tiram-se os andaimes, que foram necessários para executar os trabalhos.

Deus só pode ser vencedor absoluto. Não poderia sê-lo com inimigos acorrentados, que eternamente clamassem contra Ele a voz de sua maldição, meditando uma revolta. A lógica impõe não só a vitória absoluta de Deus, mas, numa ordem que se tornou perfeita, como deve ser toda obra de Deus, também não se permite absolutamente a dissonância de vozes rebeldes,ainda que afastadas, e a presença de um tumor maligno à espera de arrebentar. Ele se acharia no próprio seio de Deus que é o todo, do qual nada se pode tirar, porque recairia em Deus, já que nenhuma coisa pode existir fora do todo que é Deus. E como poderia ficar em Deus uma zona de anti-Deus?

Além disso, no universo, em que só achamos fenómenos que tendem a resolver-se, o facto da sobrevivência eterna de individuações pessoais das forças do mal, seria o único fenómeno que permaneceria incompleto, sem conclusão, nem em sentido positivo, de vitória, nem em sentido negativo, da derrota absoluta e definitiva. E ele está incluído no transformismo universal ou tornar-se evolucionista, como o estão todos os outros fenómenos. Não há pois razão para que ele se comporte diferentemente.Não sabemos explicar-nos essa concepção da sobrevivência do mal em forma de prisão que, como uma projecção antropomórfica, como um produto da psicologia humana, transportada num mundo em que ela não pode chegar,isto é, do relativo ao absoluto.

Essa concepção pertence à miséria das vitórias humanas, caducas e encadeadas a novas derrotas, colocadas no vir-a-ser, filhas do transformismo,concepção que está fechada dentro desse limite e que não tem mais sentido e não pode subsistir além dele, ou seja, quando o tornar-se e o transformismo cessarem, porque resolvidos. É preciso compreender que, passado esse limite, entra-se no absoluto, no imóvel perfeito, e que aí todos os conceitos do nosso relativo do tornar-se, em busca de uma perfeição, todos os seus pontos de referência em que se baseia, caem. Nesse mundo superior é lógico que não podem subsistir nossas concepções.

As vitórias do absoluto não podem ser iguais às do relativo. Os triunfos de Deus têm que ser diversos dos nossos,ou seja, absolutos, sem possibilidade de reações e continuações de luta, simplesmente resolutivas e definitivas. E, dado que a vitória de Deus é absoluta, no fim o inimigo não deve existir mais. A única existência dele, mesmo acorrentado, seria uma sobrevivência perturbadora, de desordem e até, por menor que fosse, uma vitória mínima, um testemunho de revolta, ainda que latente; seria uma coexistência de vontade de negação no sistema positivo, uma prova de imperfeição, isto é, de obra incompleta. É necessário que cada individuação das forças do mal, por fim, se quiserem permanecer tais, devam ser desintegradas como personalidade própria, porque a divina substância espiritual que a constituía, a abandona para canalizar-se na corrente oposta do bem, como vencedor absoluto.

É assim que aquele «eu sou» chega a não existir mais e, na segunda morte, como diz o Apocalipse, que aqui nos confirma, vem anulado até mesmo como espírito. Não há solução mais lógica do que esta, porque racionalmente conclui segundo os princípios do sistema, solução mais cabal e definitiva, porque resolve tudo para sempre, mais harmónica,equilibrada e justa, porque os negadores de Deus, que é vida,vem negados por Deus, na morte. Não há solução mais grave e resolutiva, e no entanto piedosa, porque é a única que possa ser compatível com a bondade de um Deus que não quer inutilmente ser cruel ou vingar-se, e cujo escopo foi a felicidade do ser e cujo princípio fundamental no criar foi: Amor.Assim conclui também o Apocalipse.

A destruição final do mal e das individuações que o personificam, já a tínhamos sustentado nos volumes precedentes. Agora voltamos a esta nova confirmação, depois que o longo caminho ascensional através destas obras nos levou a um conhecimento mais profundo e um amadurecimento mais avançado. Agora vejamos,em cheio a absoluta lógica e a imprescindível necessidade deste conceito, pelo qual, se no fim permanecesse no universo a menor partícula ou traço de mal e de dor, que lhe está ligada, a criação ficaria inquinada e sua perfeição estragada, a grande obra de Deus resultaria manchada e falida, numa forma que é inconciliável com o conceito de Divindade, que só pode ser perfeita. Em Deus não há lugar para o incompleto, para o relativo, e tudo deve ser completo e absoluto, mesmo a vitórias obre o mal.

O governo do universo é, e pode ser, totalitário e absoluto, porque está nas mãos de um Ser perfeito. Esses governos, na Terra, são inadmissíveis, porque não existe o homem perfeito, e procura remediar-se a isso, com uma compensação de erros, multiplicando o número dos dirigentes,para que estes os eliminem, controlando-se entre opostos. Mas,no absoluto, um Deus senhor e vencedor não incondicionado,seria um absurdo. Por isso, o extermínio do mal deve ser completo até as ruínas do ser, no ponto em que se diz: «eu sou»,de modo que o mal não possa mais levantar-se. O tempo das lutas deve ser terminado sem a possibilidade de volta. Nem as cinzas do incêndio destruidor do mal devem permanecer, para recordar esse triste passado, porque até esse mínimo resquício inquinaria e tornaria imperfeita a perfeição do Absoluto, ao qual tudo, no fim, regressa. Sobreviverão só os puros, que assim permaneceram, e os decaídos que se purificaram, já agora todo sem igual estado de pureza.

Com isto, o Apocalipse dá uma nova confirmação das teorias do volume «Deus e Universo». No Apocalipse tornamos a achar todos os motivos do sistema: a revolta originária, que se perpetua nos maus, o dualismo bem-mal, Deus-Satanás, a destruição final do mal, e o triunfo total de Deus. O Apocalipse narra o caminho do ser rebelde, que volta a Deus, e conclui coma vitória final do sistema sobre o anti-sistema. Se a ascese se desenvolve numa grande luta, em que Deus permitiu ao mal que agisse, para que a ele fossem oferecidas todas as ocasiões para subir, e para a experimentação do bem; se o Apocalipse pode parecer para os maus um livro de terror, porque de condenação inexorável; no entanto, é ele um livro de justiça para todos, e para os bons é uma mensagem de alegria, porque exprime o desenrolar-se do processo evolutivo do mundo, até a reconquista da originária felicidade, até o triunfo absoluto daqueles bons, no bem, na glória de Deus.
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Neste livro inconformista publicado em 1972 o seu autor, tendo-o chamado PROFECIAS teve a ousadia de assim o denominar, mas ele, no modo como é abordado o Mundo - que em muitos passos mantém na actual bestialidade humana o pendor escatológico - bem merece que sobre ele passemos a meditar, compreendendo melhor o que nos quis deixar de avisos de Deus a visão de S. João Evangelista, ele mesmo, vítima da perseguição à Igreja nascente, mas sendo um tema de meditação o facto do Imperador Domiciano lhe ter poupado a vida, exilando-o, longe de cuidar que ali no meio do Mar Egeu, numa caverna miserável o Apóstolo de Jesus tivesse tido tempo de escrever o APOCALIPSE.

A ligação que Pietro Ubaldi faz deste Livro Bíblico com o Mundo não são despiciendas, porque é nela que existiu no seu tempo - como no actual - o embate dos "anjos" com as "bestas".