A TIJELA DE MADEIRA
(Uma história simples)
Francisco era
uma vida gasta debaixo do peso dos seus noventa anos, encurvado e de mãos
trémulas. Com a vista embaciada, contava os passos trémulos e lentos. Tinha por
única família, um filho, a esposa deste e o Carlitos, o neto com apenas cinco
anos.
À mesa da
refeição amiudadas vezes a tijela caía das mãos do ancião, partindo-se em
cacos, levando consigo a colher e a comida que ficava inaproveitada, quando não
acontecia que o copo extravasava para a toalha, tornando o avô algo complicada
a hora do repasto, quando a família se reunia.
Estes factos
deram em gerar algum desconforto, especialmente na esposa do filho, que mais
cordato e compreensivo, desculpava o pai, olhando à idade e à doença que lhe
havia afectado a visão e o controle dos movimentos.
Mas isso não
obstou que um dia, ambos, tenham acordado no seguinte:
- É urgente
tomarmos uma providência... já chega de leite derramado e de comida pelo chão.
Tanto bastou
para relegarem o velhinho para um canto da cozinha onde comia sozinho e para
que não houvesse mais loiça partida, passaram a servir-lhe as refeições numa
tijela de madeira.
Havia lágrimas
nos olhos gastos do avô, ao ver-se isolado e posto à margem da sua pequena
família, um facto em que apenas reparava o pequeno Carlitos, quando nas suas
deambulações infantis passava pela cozinha, ou de propósito por lá passava para
fazer companhia ao avô e continuar a ouvir dele as histórias que ele adorava.
Aconteceu, um
dia, que os pais à hora de o deitar, foram dar com o filho sentado no chão numa
ocupação muito estranha.
Não brincava,
tendo embora, ao redor de si muitos dos seus brinquedos favoritos que, no
entanto, permaneciam como que esquecidos.
O menino
entretinha-se a atar pequenos pedaços de madeira, deixando interiormente um
vazio em forma de concha.
- Que fazes,
Carlitos? – perguntaram os pais admirados com tão esquisito brinquedo.
Docemente, sem
largar as ataduras que as pequeninos dedos iam fazendo, na sua voz cantante,
respondeu com outra pergunta:
- Ah! Não
adivinhais?
- Não... não
sabemos o que é isso... mas o que está fazendo revela que tens habilidade, o
que muito nos agrada, meu filho...
Este, rematou,
desvendando o mistério:
- Estou a
fazer uma tijela de madeira para o papá e a mamã comerem, quando eu for grande.
E o almoço do
dia seguinte reuniu de novo a família à mesa.
Na troca de
olhares entre o mais velho e o mais novo notava-se que havia um conluio secreto
e o olhar do Carlitos era um pavio aceso em cima da mesa, em honra daquele
momento.
E coisa
importante: dali em diante deixou de haver aborrecimentos quando a tijela, o
garfo ou a colher caiam, ou se entornava o leite.
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