A Revolta
de Maria da Fonte, é o nome por que ficou conhecido para a História de
Portugal um movimento popular com origem em terras do Minho, segundo se crê, em
Fonte Arcada, Póvoa de Lanhoso, contra medidas do governo de Costa Cabral,
dando origem a um grande descontentamento que rapidamente alastrou para terras
vizinhas: Travessós, Simães, Gafe, S. Paio e Santo André de Frades.
A origem
esteve – como é reconhecido historicamente - numa lei que criava novos impostos
tributários e, especialmente, um decreto de 26 de Novembro de 1845 de reorganização da saúde
pública, que impunha o enterro nos cemitérios, indo ao encontro de outros
anteriores, como e o de 21 de Setembro de 1835, em pleno regime cartista.
O primeiro levantamento popular ocorreu no dia 19 de
Março de 1846.
Além da conhecida Maria da Fonte estavam conluiadas
com ela, segundo a tradição, outras mulheres do povo, todas grandes admiradoras
da Rainha D. Maria II mas inimigas da política autoritária do Ministro do Reino, Costa Cabral e das leis
do seu gabinete que impunham obrigações pesadas ao povo.
Esta ocorrência originou uma sangrenta luta civil
que ficou conhecida como a guerra da patuleia (patas ao léu), tendo
originado que concelhos inteiros se hajam tornado insubmissos, como Arcos de
Valdevez, Ponte da Barca, Ponte de Lima, Viana do Castelo, Celorico de Basto e
Póvoa de Lanhoso, um facto que deu aso a que aparecessem localidades prontas a revoltar-se, como
Chaves, Vinhais, Aveiro, Cantanhede, Figueira da Foz, Montemor-o-Velho,
Poiares, Abrantes, e Portalegre, tendo-se, por fim, formado Juntas revoltosas devidamente
organizadas em Vila Real, Lamego, Viseu, Coimbra, Leiria, Batalha, Alcobaça,
Nazaré, Caldas da Rainha, Peniche, Santarém e Évora.
Vendo-se incapaz de dominar a situação que alastrava
tentacularmente desde o Minho, Beiras, Estremadura e já caminhava para o Sul, A
Rainha D. Maria II, muito embora tivesse em alta consideração o Ministro do
Reino, Costa Cabral, cuja linha dura de governo era bem conhecida, mas
igualmente reconhecido o seu labor no desenvolvimento do País, sobretudo nas
Obras Públicas e reformas administrativas, demitiu-o em 17 de Maio de 1846,
três meses depois do início da revolta, possivelmente, em Fonte Arcada, sob o impulso
de Maria da Fonte.
Resultou de tudo isto que o Duque de Palmela tenha
sido chamado para organizar um Ministério de coligação formado por cartistas e
setembristas da ala moderada que não trouxe nenhuns benefícios ao País,
pesasse, embora, a recomposição operada em 19 de Julho com a entrada de Sá da
Bandeira e Joaquim António de Aguiar.
A situação política de extrema fraqueza governativa,
obrigou Palmela a demitir-se em Outubro de 1846, dando lugar com todo o apoio
de D. Maria II, ao Marquês de Saldanha
que reorganizou um Ministério em que foi prometido manter as demissões dos
ministros afastados pela revolta de Maria da Fonte – os Cabrais – e a
abolição dos impostos reclamados pela revolta.
Têm existido dúvidas sobre a existência real de
Maria da Fonte, mas a aura desta façanha tem tido em Póvoa de Lanhoso, terras
circunvizinhas e por todo o lado, uma grande aceitação popular, tendo originado
uma obra de grande envergadura de Camilo Castelo Branco – Maria da Fonte - que é uma crítica mordaz e, até, impiedosa
dos acontecimentos, sem nos dizer, ao certo, a localidade de nascimento da
heroína popular, muito embora, no seu jeito romanesco o grande escritor lhe
haja atribuído a possibilidade de ser natural de Fonte Arcada, segundo
informações recebidas de um seu correspondente, José Joaquim Ferreira de Melo e
Andrade.(1)
Regista-se, no entanto, ser aceite, que Maria da
Fonte nasceu no lugar do Barreiro, freguesia de Fonte Arcada.
O que conta é que Maria da Fonte entrou na História,
tendo o movimento insurreccional que originou influído decisivamente no curso
político da era liberal, gerando no povo minhoto uma estima compreensível, que
tem muito de afecto por alguém que no século XIX ergueu bem alto a sua
discórdia contra os “cabrais”.
Em tempos, mão amiga fez-me chegar um texto oriundo de
alunos das Escola EB 2,3 Gonçalo Sampaio, de Póvoa de Lanhoso, que pela sua
originalidade, candura e beleza
descritiva, se reproduz na íntegra:
A Revolução da Maria da Fonte foi a 22 de Março
de 1846. Além da conhecida Maria da Fonte havia outras tão boas como ela que
eram Joana Esteves de Oliveira e Maria Angelina de Galegos.
O Povo adorava a sua Rainha D. Maria II, mas
detestava o Ministro Costa Cabral e as suas Leis, que impunham obrigações à
vida do povo. Para piorar a situação foi imposta uma lei que proibia que os
mortos fossem enterrados dentro das Igrejas e Templos.
Maria
Luísa Balaio mais conhecida por Maria da Fonte tinha uma estalagem (taberna)
onde homens, se encontraram para falar da lei que proibia o enterro dos mortos
dentro de Igrejas e Templos.
O problema era: a partir do momento que a lei
saísse teriam de enterrar os mortos nos campos como "cães".
Maria Luísa dizia: "o povo está unido só
precisa de alguém que o guie, mas para isso, podeis contar comigo ou não me
chamo Maria da Fonte". Os homens não se atreveriam a atirar sobre as
mulheres. Era necessário estarem atentos porque se sepultassem o primeiro morto
fora da igreja nunca mais podiam voltar atrás. Para além disso era também
necessário que o povo desse permissão para o enterro ser realizado sem padre.
No dia 22 de Março de 1846 morre Custódia Teresa dando origem à revolução. Para
atestar o óbito apareceu oficialmente o delegado de saúde pública que foi
corrido à paulada por um habitante de Simães, que chamando a população -
acudam, acudam, à Capela de S. Francisco – reuniu o povo para fazer o funeral.
À chegada do mordomo e do padre, Maria Luísa
disse: Arrumem-se, nós fazemos o funeral. As mulheres conduziram ordenadamente
o funeral até ao Mosteiro de Fontarcada. O padre de Fontarcada alertou dizendo:
Não façam isso... Vão meter-se em sarilhos!... Sem preocupação as mulheres
sepultaram o cadáver no interior do Mosteiro.
Na rua as manifestações começaram com muito
alarido.
Entretanto o administrador local planeia a sua
vingança e tenta convencer o governador que só com uma força militar é que
“metemos na ordem aquelas bêbadas”, mas o governador argumenta: “nem pense
nisso, elas não passam de meia dúzia de beatas”.
No dia seguinte, as autoridades retiraram o
cadáver do Mosteiro de Fontarcada, mas logo os sinos tocam com um barulho
ensudercedor e as mulheres aparecem em número elevadíssimo dizendo - Malandros
ide-vos embora - e começam a apedrejá-los voltando a colocar religiosamente a
campa violada. Na estalagem de Maria Luísa, dão vivas a esta vitória.
Passado mais um dia, três mulheres são presas. As
mulheres juntam-se para assaltar a cadeia. Joana Esteves trazia com ela um
machado e todas gritavam "Força, força". Tanta força fizeram que a
parta acabou por cair e elas levaram as suas companheiras, atiraram pela
varanda todos os documentos do tribunal com os quais o povo fez uma fogueira
cantando e dançando à sua volta.
A revolta reflecte-se por todo o Reino obrigando
Rainha a acabar com as leis da saúde e a reformar o sistema do pagamento das
contribuições. Era o reconhecimento real da vitória da Maria da Fonte. A Rainha
recuperou a autoridade e começou a "caça às bruxas".
Passados dois anos Maria Luísa Balaio mais
conhecida por Maria da Fonte partiu discretamente para o Brasil com medo de ser
presa.
Conclusão:
A revolução da Maria da Fonte teve razão de ser,
ou seja, a liberdade de um povo. Trabalho realizado por : Virgínia nº.26, 8º.
Ano, Turma A
Póvoa de Lanhoso, 150 anos depois...
Pelo relato que é feito, onde não faltam nomes de
outras mulheres metidas na Revolta e de pormenores devidamente enquadrados na
sabedoria das gentes de Póvoa de Lanhoso, a aluna da Escola Gonçalo Sampaio faz
um relato muito vivo de uma história avoenga que lhe chegou e ela não quis
deixar que se perdesse – e ainda bem - porque é preciso manter vivo em qualquer
época o espírito da “patuleia”, ou seja, a razão do povo contra toda a força de
um Estado que esqueça as razões da classe mais baixa, que é, afinal, a razão da
existência da Nação.
(1) - in, Grande Enciclopédia Portuguesa e
Brasileira, vol 16, pág. 328
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