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segunda-feira, 17 de junho de 2013

Não somos anjos


Acreditar que podemos dispensar a oração vocal, será pretender criar o anjo; mas jul­gar que, recitando preces, não temos de nos preocupar com manter e desenvolver a piedade interior é cair num materialismo religioso que suprime no homem o que é propriamente humano.
Jacques Leclercq (1)
In, “Vida Interior” - Cap. IV “A Oração Vocal”
O autor que foi um pensador cristão de fina água leva-nos a perceber que o fim da oração é descobrir e fazer a vontade que Deus quer operar na pessoa, em que o caminho começa por ser nosso (ascese) pondo em uso a plena liberdade que temos quando nos dispomos ao encontro com Ele e, depois, é que pertence a Deus o passo seguinte que é o da sua actuação em nós.
Eis, porque, a oração vocal tem de começar por ser uma conversa com a divindade como se tem com o nosso melhor amigo num sentimento ascético em que nos podemos servir ou não de orações conhecidas, tendo em mente que ela tem de ser sempre um diálogo amoroso com Deus, frente a frente, expressando os nossos sentimentos.
Eis, porque, a oração vocal é o primeiro passo da caminhada de todo o crente.
É de tal modo assim que não a podemos dispensar, porque para chegarmos a Deus por outro caminho em que a mente toma para si esse encargo é uma tarefa que roça o transcendental, porque será pretender criar o anjo como nos diz Jacques Leclercq e nós não somos anjos, mas criaturas biológicas.
Se pensarmos nos apóstolos, concluiremos que eles transmitindo-nos as orações que ouviram a Jesus, o fizeram porque Ele orou em voz alta, de que é exemplo a belíssima Oração do Pai-Nosso e aquele formidável hino de louvor: Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e doutores e as revelaste aos pequeninos” (Mt 11,25) donde nos fica a certeza de como é indispensável a oração vocal que Ele não se esqueceu de fazer no Calvário no momento culminante, quando a sua voz se ergueu para recitar o versículo inicial do Salmo 22: Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste.
Chega isto para nos dizer que é de tal modo importante orar assim que na hora final a voz de Jesus se ergueu para falar de frente com Deus, invocando palavras antigas que Ele bem conhecia, o que nos deixa todo o campo livre para podermos usar orações tradicionais, quando nos faltarem palavras nossas.
A oração vocal enriquece porque fazem sair do coração coisas que lá não estão, mas nós colocamos lá através dos nossos sentimentos, verdades e desejos.
É ponto assente ter contado definitivamente, em Santo Agostinho, para a sua conversão o facto de ter assistido na Basílica de Milão e se ter emocionou com o canto dos Salmos e dos hinos da lavra de Santo Ambrósio – bispo daquela Basílica – ao verificar que todo o povo os sabia de cor o que originou que a sua alma, que era a de um homem culto e inteligente onde havia luzes de Deus tivesse despertado e de tal modo que agradeceu o momento vivido dentro daquela Basílica, porque só, não teria conseguido elevar-se, como veio a acontecer, ao tornar-se, depois, num dos maiores Doutores da Igreja Universal.
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(1)           - Jacques Leclrercq (1891-1971) foi um profundo pensador cristão. Sociólogo, professor da Universidade de Lovaina, membro da “Libre Academia de Belgique”, Jacques Leclercq deixa-se reconhecer por uma característi-ca rara de se encontrar: não lança mão de argumentos clamorosos, estilisticamente enfeitados ou escorrendo sentimentalismo, mas vai sempre à busca da objectividade. Com a isenção do analista, que não é chamado a iludir, mas a elucidar, alicerça-se nos fatos para desnudá-los, até dar com a raiz e as linhas estruturais, à busca do sentido e da plenitude.

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