Só os mais
desatentos não reparam no anticlericalismo actual, mercê do papel activo da
maçonaria infiltrada às escondidas no poder, ao arrepio do conceito das novas
democracias que tendem para que o jogo político se não faça nas costas do povo.
(1)
Esta prática
do jogo escondido – com a agravante de nele se jogar a sorte do povo sem que
este seja consultado - vem desde meados
do século XVIII, quando subiu ao trono D. José, dando a Sebastião José de
Carvalho e Melo, (futuro Marquês de Pombal) pelas provas dadas como embaixador
em Londres e Viena de Áustria, o lugar de Primeiro-Ministro, entregando-lhe
toda a condução dos negócios do Reino, um facto que causou, então, as maiores
inimizades na Companhia de Jesus (2)
relativamente ao rei reformar dor.
Esta Ordem
religiosa nascida a partir da corrente da Contra-Reforma (3)
existia em Portugal desde 1540 e tinha uma como regra uma profunda acção
educativa, fazendo dela a sua principal tarefa, a par da experiência pedagógica
e da gratuidade do ensino, visando a formação integral do homem, de acordo com
a fé e a cultura do tempo.
Não tardou que
o vingativo chefe do executivo ordenasse em Setembro 1759 a expulsão dos jesuítas,
em obediência a si mesmo e ao Rei, seduzido pela filosofia herética que então
aflorava, indo a sanha persecutória ao ponto de em Junho do ano seguinte ter
sido decretado por alvará a alteração do ensino público, tendo sido extintas as
escolas reguladas pela Companhia de Jesus.
A Companhia de
Jesus era um obstáculo ao projecto político que se pretendia implementar: um
sistema que Carvalho e Melo queria ver centralizado no Estado, sendo mais fácil
de controlar. Era o sistema baseado nas teorias iluministas que ele queria
impor sem escrúpulos quanto aos meios a usar e indiferente face à resistência
das forças sociais do País. Tendo sido iniciado na Maçonaria aquando da sua
estadia como embaixador em Viena de Áustria, deu grande impulso à disseminação
dos maçons em Portugal, na peugada do escocês
George Gordon, que em 1733 havia estabelecido uma loja em Portugal, designada Casa Real dos Pedreiros-Livres da Lusitânia.
Estes ataques,
porém, visavam mais fundo
Não era só o
problema dos jesuítas.
Era o da
existência da Igreja, enquanto obstáculo ao absolutismo que Pombal queria
impor, dando-se o agravamento das relações em Abril de 1759, quando D.José, em
carta dirigida ao Papa Clemente XIII, solicitou autorização para julgar
colectivamente a Companhia de Jesus, respondendo o Papa em Agosto desse ano,
recusando a proposta real, o que viria a justificar que a 15 de Julho de 1760, fosse
participado ao Núncio Apostólico a ordem régia para se retirar do reino o mais
breve possível, consumando-se o corte de ralações entre Portugal e a Santa Sé.
Como corolário
destas desavenças em 21 de Setembro de 1761, acabou por ter sido condenou à morte
o Padre Gabriel Malagrida (4)
que a Inquisição julgou como réu de lesa-majestade.
O que
aconteceu, com a extinção dos jesuítas foi um desastre civilizacional à escala
nacional, porque na educação e na ciência se perderam metas e assim veio a
morrer o dinamismo moral e intelectual da época, motivado pelo encerramento de
algumas dezenas de Colégios em todo o Império, porque o ensino do povo que os
padres encarnavam, nunca mais se equilibrou até aos dias de hoje, há que
dizê-lo, com frontalidade.
Este foi, em
síntese, o primeiro ataque à Igreja, em Portugal, tendo sido um ataque à
própria Nação, por instigação de um homem dominador do seu próprio rei.
Com a
Viradeira (5),
Pombal caiu em desgraça, e Pina Manique perseguiu as lojas e os maçons, tendo
mudado a situação com as invasões francesas. A Família Real, acossada, retirou-se estrategicamente para o Rio de
Janeiro, deixando o País entregue à ajuda inglesa, que por fim com o povo
revoltado sacudiram os franceses, mas deixando a germinar as sementes
revolucionárias.
Com a Corte no
remanso brasileiro, a revolução liberal triunfou no Porto. Estava-se em 1820. A revolta tinha sido
cozinhada numa loja maçónica chamada “O Sinédrio”. (6)
D. João VI
voltou à pressa mas nunca mais conseguiu liderar os acontecimentos. Jurou-se
uma Constituição, a primeira, em 1822, e o Rei deixou de governar.
Preparava-se
na amálgama dos acontecimentos políticos o segundo ataque à Igreja, num tempo
em que as relações entre Portugal e a Santa Sé já se haviam recomposto.
Eclodiu com o
Liberalismo triunfante, quando D. Pedro
IV, três dias depois de chegar a Lisboa, vindo do Brasil, ordenou a saída –
mais uma vez - do Núncio Apostólico, através de um ofício datado de 29 de Julho
de 1833.
Foi o começo
duma perseguição atroz à Igreja, com a formação nesse ano de uma Comissão de
Reforma eclesiástica, que de imediato, substituiu a hierarquia católica por
vigários eleitos pelos cabidos sujeitos às leis governamentais, por não ter
sido revogado o número 2 da artigo 75º da “Carta Constitucional” outorgada em
1826, que decretava que o rei tinha poderes para: Nomear Bispos e prover os Benefícios Eclesiásticos, uma
anormalidade que deu azo à eclosão de um clero situacionista e apático, de
mesuras ao Governo, longe das suas funções apostólicas, dando-se uma forte
ingerência política na nomeação dos Bispos e daí, a consequente degradação da
vida da Igreja, com esta a viver prisioneira do Estado liberal.
De novo, os
jesuítas, que se haviam reorganizado, são expulsos por ordem do célebre
“Mata-Frades”, Joaquim António de Aguiar, ministro do Reino, que ordenou a
extinção das Ordens religiosas, mandando incorporar os seus bens na Fazenda
Nacional.
A Igreja, um
dos pilares do regime absolutista derrotado, tinha agora que se adaptar aos
novos tempos, nem que para isso se substituíssem os padres relapsos ao regime
por outros fiéis ao regime liberal.
A oposição aos
liberais chegou ao ponto de levar as populações das dioceses de Braga, Porto,
Bragança, Viseu, Aveiro e Coimbra, a recusar participar em actos de culto
oficiados pelos novos párocos ou expulsavam os padres aderentes ao liberalismo.
Assim estava o
Portugal da era revolucionária de 1820, quando o Liberalismo às costas da
Maçonaria impôs a sua lei.
Este estado de
coisas só viria a atenuar-se com a subida ao trono da rainha D. Maria II, em
1834, mas tendo durado até 1842, quando foram restabelecidas as relações com a
Santa Sé.
Uma nova
perseguição surgiu em 1910, quando os republicanos chegaram ao poder, ao
constatarem que havia um obstáculo às suas ideias: a influência da Igreja na
opinião pública.
Retomando a
tónica de Miguel Bombarda (7)
que dizia: Só ao Estado compete formar os
espíritos, só a ele pertence modelar as forças vivas da nação. Só ele sabe
fazê-lo e só ele tem recursos para o fazer,
era preciso expulsar Deus da Constituição (8)
e, em consequência, expulsar, mais uma vez as ordens religiosas que desde
meados do século XIX estavam sediadas em Portugal, com o seu papel determinante
nos campos da assistência e do ensino, o que o Estado não fazia minimamente.
Não importava.
Havia que
separar a religião da política – o que era admissível e até necessário – se não
fosse querer o Estado formar as consciências através de uma formação cívica
obediente e deformadora da moral natural do indivíduo.
O decreto da
separação não tardou. Aconteceu em 20 de Abril de 1911.
Os republicanos
de 1910, nada tinham aprendido com o abatimento moral da Nação levada a cabo
pelos liberais do século anterior, tendo prosseguindo as ilusões do Iluminismo,
cuja ideia maior era a de que o homem tinha a capacidade de progredir até
alcançar a perfeição através da Razão.
Era tarefa do
Estado de mudar as consciências e formar os espíritos, dentro dos ideais
jacobinos (9)
da Revolução Francesa, que tantos os liberais como os republicanos de então tentaram
impor a Portugal, era algo que tinha de ser cumprido, não lhes bastando remeter
a religião para a esfera íntima do indivíduo, porquanto era necessária
extirpá-la das consciências.
De pouco ou
nada importava que ao pretender-se suprimir a religião da vida pública e, como
se pretendia da vida privada, se perdessem – como veio a acontecer - a perda de valores fundamentais, devido em
grande parte à subserviência de uma grande parte do clero durante décadas,
tendo-se deixado acorrentar aos ideais perversos do Estado, até ao surgimento de grandes e destemidos Bispos,
como D. Sebastião Leite de Vasconcelos, Cardeal Mendes Belo e D. António José
de Sousa Barroso. (10)
E na
actualidade?
A Concordata
de 1940 demorou anos a ser revista até que, finalmente, foi aprovado um novo
texto em 18/12/2004, mas que até à data pouco ou nada foi regulado, o que
levou a hierarquia da Igreja portuguesa
em 12/7/2007 a apelar ao primeiro-ministro para que o Governo avançasse o mais
rapidamente possível com "propostas dialogantes" de legislação complementar
sobre a Nova Concordata, com o fim de se evitar "um vazio legal",
porquanto é desejável uma real separação de poderes devidamente regulamentados.
Em 12/11/2005,
por ocasião do Congresso para a nova Evangelização, a Igreja promoveu uma
procissão com a imagem de Nossa Senhora de Fátima, em Lisboa, um facto foi um
sucesso juntando muitos milhares de fiéis, mas logo, no dia seguinte
(coincidência? )foi decretado pelo Governo a proibição dos crucifixos em 12
escolas públicas onde estavam presentes aqueles objectos de fé.
Não têm
cessado outros ataques à Igreja, onde a sua intervenção âmbito social é cada
vez mais delimitada.
A imprensa
regional, onde a Igreja tem grande implantação, é cada vez mais dificultada na
sua acção.
O número de
capelães militares não pára de diminuir, tendo culminado com as incríveis
regras com que se pretendem agrilhoar a acção dos capelães hospitalares, um
facto a que a Igreja resistiu e, parece estar a ser estudado.
O Parlamento nacional
aprovou uma nova Lei sobre o Protocolo do Estado, onde a Igreja só estará
representada, se for convidada, de acordo com a Constituição de 1976 que restaurou
o princípio da separação tão querida desde os tempos da Primeira República.
Mas o ataque à
Igreja, de longa tradição humanista entre nós e a quem Portugal tanto deve, não
se fica por aqui.
Critica-se às
escancaras a bênção religiosa de obras ou equipamentos públicos, a celebração
de cerimónias religiosas por iniciativa de entidades públicas, e até a presença
de entidades oficiais, nessa qualidade, em cerimónias religiosas.
O que conta,
porém é que hão-de passar todos os Estados e todas as Maçonarias e a Igreja,
pilar eterno de um poder intemporal há-de ficar por cima dos escombros das
sociedades laicas que não têm sabido ler o que nela é o seu estatuto maior: o
do Amor, em contraposto ao tripé enganador da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, que importado do período de 5 de Maio de 1789 a 9 de Novembro de 1799, da
França revolucionária, foi adquirido como divisa das lojas maçónicas, mas onde
aqueles conceitos só fazem sentido, não para o povo em geral, mas para as
elites dos seus apaniguados.
Ontem como
hoje.
(1) - A introdução
da Maçonaria em Portugal remonta ao segundo quartel do século XVIII. Talvez por
1727, foi fundada por comerciantes britânicos, tendo fundado em Lisboa uma loja
que ficou conhecida nos registos da Inquisição como dos "Hereges Mercadores",
por serem protestantes quase todos os seus membros.
(2) - A Companhia de Jesus, cujos membros são
conhecidos como jesuítas, é uma ordem religiosa fundada em 1534 por um grupo de
estudantes da Universidade de Paris, liderados pelo basco Íñigo López de
Loyola, conhecido posteriormente como Inácio de Loyola.
(3) - A Contra-Reforma, ou Reforma católica, foi
uma barreira colocada pela Igreja contra a crescente onda do protestantismo
(4) - Jesuíta italiano, nascido na vila de
Managgio, a 18 de Setembro de 1689
(5) - Nome porque ficou conhecido o reinado de D.
Maria II.
(6) - Grupo de personalidades portuenses que, em
24 de Agosto de 1820, protagonizaram na sua cidade a revolta que viria a
instaurar o regime liberal em Portugal, na sequência de uma tentativa de
sublevação anti-britânica falhada pelo general Gomes Freire de Andrade em 1817.
Os abusos dos ingleses mantiveram-se desde essa altura, tal como a miséria
pública e a necessidade de reformas urgentes. É assim fundado o Sinédrio, em 22
de Janeiro de 1818, por quatro maçons do Porto - Fernandes Tomás, Ferreira
Borges, Silva Carvalho, todos juristas, e Ferreira Viana, comerciante
(7) - Miguel Augusto Bombarda (Rio de Janeiro, 6
de Março de 1851 — Lisboa, 3 de Outubro de 1910) foi um médico psiquiatra e
republicano português. Estudou na Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, onde veio
a ser Professor.. Republicano convicto, foi um acérrimo anticlerical
(8) - Fernando Catroga, in O Republicanismo em
Portugal
(9) - Termo proveniente da Revolução
Francesa. Receberam a denominação de
jacobinos pois reuniam-se inicialmente no Convento de São Tiago (Tiago em
latim: Jacobus).
(10) - in, O Século de Fátima, de João César das
Neves.
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