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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

O gnosticismo e o "Evangelho de Judas"



Num tempo ainda recente,notícia falaciosa deu conta da suposta existência de mais um Evangelho: o de Judas, apregoado aos quatro ventos, como aconteceu entre nós, o que não foi novidade.
Trata-se de um escrito gnóstico que ninguém pode garantir com fiável, mas que serviu para fazer o alarido que costumam ter estas notícias em certos meios aferrados contra a Igreja, situando-se o documento a par doutros, supostos como inspirados, como são no Antigo Testamento, a  Ascensão de Isaias, a Assunção de Moisés, a Vida de Adão e Eva, o Testamento dos doze Patriarcas, etc. e no Novo Testamento, o evangelho dos Hebreus, o evangelho dos Ebionitas; o evangelho dos Egipcios; o evangelho de S. Tomé e o evangelho de Filipe, todos eles escritos no século II, e bem assim, como o agora apregoado evangelho de Judas, atestado pelo primeiro bispo de Lyon, Santo Irineu, que, no meio do século II, o denunciou num texto contra as heresias.  
O manuscrito, em copta foi descoberto na década de 70, no Egipto. Desde então passou por várias mãos até chegar à Fundação Maecenas for Ancient Art (Mecenas para Arte Antiga), de Basiléia, Suiça.
É um documento apócrifo do século II.
Desaparecido até agora, a única cópia conhecida foi publicada em 6 de abril de 2006 pela revista “National Geographic.”
O evangelho de Judas teria sido escrito por membros da seita gnóstica cainita, um movimento religioso cristão que misturava misticismo e filosofia e influenciou grupos heréticos. Na visão dos cainitas, Judas Iscariotes teria seguido um desígnio divino e não podia fugir de seu destino. A traição faria parte do plano de Deus, era necessária, e sem ela não haveria salvação para os homens.
Segundo a afirmação dos gnósticos, Judas teria sido m confidente privilegiado de Jesus.
Confrontamo-nos assim com um documento sem autor conhecido, mas provavelmente por algum dos iniciados no movimento da Gnose, cuja raiz etimológica se radica na palavra grega gnosis que significa conhecimento.
Este movimento do ponto de vista histórico e religioso prosperou no decorrer dos séculos II e III, tendo por base o Neoplatonismo reivindicando para si a posse de conhecimentos secretos, que segundo a opinião deles, os tornava superiores ao comum dos cristãos, radicando as suas teorias nas filosofias pagãs da Babilónia, Egipto, Siria e Grécia.
Pode-se definir o gnosticismo como designação para um grande número de seitas panteístas e eruditas que floresceram desde tempos anteriores a Cristo até o século V d.C., pretendendo reduzir o Cristianismo a uma religião de ciência esotérica.
O gnosticismo mancomunava alguns elementos da astrologia e mistérios das religiões gregas, como os mistérios de Elêusis com as doutrinas do Cristianismo, designando  na actualidade, um conjunto de tradições que acreditam no aspecto espiritual do Universo e na possibilidade de salvação, por meio do Pleroma, entendendo-se a Gnose como uma corrente de pensamento esotérica, normalmente identificada com o misticismo oriental.
Os gnósticos aceitam e defendem acerrimamente  a existência de uma entidade imortal, que não é deste mundo, que pode ser chamada por divina essência e que existe em todos os homens e é a sua única parte imortal. Os gnósticos consideram que o estado do homem o submete ao sofrimento, sendo necessário que ele se liberte desse estado, na certeza de que  isso só pode acontecer pelo conhecimento.
Constituíram uma corrente muito forte na Igreja primitiva levando alguns cristãos da época como Marcião a ensinar uma cosmovisão dualista, o qual, de teólogo cristão se arvorou em  doutrinador gnóstico, ajudando a defender a tese da existência de dois deuses proposta por aquele movimento de um Criador imperfeito, que eles associam ao Jeová do Antigo Testamento e outro, bom, associado ao Novo, devendo-se ao primeiro o mundo criado imperfeitamente, donde advinha o sofrimento humano, e ao segundo - o deus bom  - que teve pena dos homens e lhes deu parte de uma divindade que lhes dá a capacidade de se superarem.
Segundo o gnosticismo, Cristo surgiu através das trevas para transmitir o conhecimento  - gnosis -  e libertar os espíritos cativos no mundo terreno para os conduzir até ao mundo espiritual mais elevado. Ainda, segundo eles, Cristo não veio em carne e nunca assumiu um corpo físico, nem foi sujeito a fraqueza e emoções humanas embora parecesse ser um homem.
A maior polémica contra os gnósticos apareceu no período patrístico, com os escritos apologéticos de Irineu (130-200), Tertuliano (160-225) e Hipólito (170-236).
No evangelho apócrifo de Judas, este aparece reabilitado.
Ao arrepender-se recebe o perdão de Jesus, que o manda para o deserto fazer exercícios espirituais. Nos evangelhos canónicos de Mateus, Marcos, Lucas e João, tal como foram definidos no concílio de Niceia (Turquia), reunido em 325 por iniciativa do primeiro imperador romano cristão, Constantino, a Igreja nascente afirma que Judas se suicidou.
Esta é a grande razão da polémica: segundo Vittorio Messori,  autor de vários livros sobre a Igreja Católica esta revisão da figura de Judas é compreensível, na medida em que contribuiria (segundo o autor do “seu” evangelho) para resolver o problema de como conciliar a justiça de Jesus, confrontado o que aconteceu com apóstolo traidor e a misericórdia usada para com o apóstolo Pedro, que O negou.
Fica, deste modo, a descoberto a intenção da notícia do suposto “evangelho”, que mais não é, hoje, como foi no tempo antigo, uma peça virada contra a Igreja com propósitos bem conhecidos, a que só os incautos ou mal intencionados dão crédito. É assim que temos de entender todo o alarido de um sino que soou a falso, num tom rachado, mas onde muitos ouviram tons “harmoniosos”.
A mentira, ontem, como hoje, sempre há-de ter os seus seguidores.

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