1 - Preâmbulo
Abraão viveu
há cerca de 4000 anos. Sendo o mais remoto antepassado do povo hebreu, é mais conhecido universalmente como pai de
todos os cristãos, mas se analisarmos em profundidade a vida deste velho
Patriarca, concluímos, que ele é pai, não apenas destes, mas também de todos os
árabes.
Vejamos os
acontecimentos.
Taré, pai de
Abraão, juntamente com sua família, abandonou a cidade de Ur, na Mesopotâmia, e
desceu em direcção ao sul, pelas margens do Eufrates, estabelecendo-se em
Haran, uma terra situada ao sul da actual Turquia. Taré era membro de uma tribo
semita, grupo étnico descendente de Sem, (Gen 11, 10-27) filho de Noé.. Hoje,
os semitas compreendem dois importantes povos: os hebreus (judeus) e os árabes,
como uma consequência directa do desenrolar histórico.
Abraão vivia
desconfortavelmente num meio idolátrico até que num dado tempo recebeu de Deus
uma ordem especial e cumpriu-a destemidamente, movido pela sua grande fé: Ora,
o Senhor disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela, e da casa de teu
pai, para a terra que eu te mostrarei. Eu farei de ti uma grande nação;
abençoar-te-ei, e engrandecerei o teu nome; e tu, sê uma bênção. Abençoarei aos
que te abençoarem, e amaldiçoarei àquele que te amaldiçoar; e em ti serão
benditas todas as famílias da terra. Partiu, pois Abrão, como o Senhor lhe
ordenara, e Ló foi com ele. Tinha Abrão setenta e cinco anos quando saiu de
Haran. Abrão levou consigo a Sarai, sua
mulher, e a Ló, filho de seu irmão, e todos os bens que haviam adquirido, e as
almas que lhes acresceram em Harã; e saíram a fim de irem à terra de Canaã (...)
(Gen 12, 1-5) Canaã era a Terra prometida, que mais tarde também ficaria
conhecida por Israel, como veremos.
Abraão fixou-se
em Siquem por volta de 2000 a .C.,
contando na altura 73 anos de idade, mas tendo a região sido assolada por
grande fome tomou a sua tribo e retirou-se para o Egipto, onde permaneceu por
um breve período. Ao sair do Egipto dirigiu-se de novo para Canaã. Foi quando
recebeu uma nova revelação de Deus: Ergue os olhos e olha desde onde estás
para o norte, para o sul, para o oriente e para o ocidente, porque toda essa
terra que vês, eu ta darei, a ti e à tua descendência, para sempre. (Gen
13,14-15)
O actual conflito
árabe/judeu ia ter o seu começo.
Na Carta aos
Romanos (4, 11) diz S. Paulo, referindo-se a Abraão: E recebeu o sinal da
circuncisão, selo da justiça da fé que teve quando ainda não era circuncidado,
para que fosse pai de todos os que crêem (...) fazendo com estas palavras,
o grande convertido, um acto de fé no velho Patriarca escolhido por Deus para
ser pai de muitas multidões de crentes, tal como diz o significado do seu
próprio nome e se depreende da promessa de Deus quando o alterou: De agora
em diante não te chamarás mais Abrão e sim Abraão, porque te farei pai de uma
multidão de povos, (Gen 17, 5).
2 – O Filho ilegítimo e o Filho da Promessa
Sara, a esposa
do Patriarca era estéril e já de idade avançada.
Num certo dia,
lamentando-se Abraão da infelicidade de não ter herdeiros, ouviu a promessa
divina de vir a ter um descendente natural (cf Gen 15, 4) acompanhada do
convite de olhar de noite o céu e as estrelas e tudo isto acompanhado de mais
uma promessa: Assim será a tua descendência (Gen 15, 5).
O tempo,
porém, passava, até que um dia, instigado por Sara, que continuava estéril,
Abraão tem um momento de fraqueza. Esquecendo-se da promessa de Deus acedeu ao
alvitre de Sara e dormiu com a escrava
Agar, que trouxera do Egipto e dessa união nasceu Ismael, que não seria - embora fosse o primogénito do velho
Patriarca – o filho que lhe havia sido prometido.
Foi um erro
este passo de Abraão.
Agar ao ver
que tinha concebido deu em desprezar Sara (Gen 16, 4) o que motivou que esta,
embora responsável, mas sentindo-se acabrunhada pela acção provocatória de
Agar, tenha dito a Abraão: O meu ultraje está com a tua responsabilidade
(Gen 16, 5) querendo com esta reprimenda justificar a culpa do marido pelo
atrevimento da escrava que lhe ia dar o filho que ela não lhe dava.
Entretanto,
Deus, reforça a promessa de o fazer pai
de uma multidão, fazendo desse filho ainda por nascer o destinatário da aliança
e da sua descendência (Gen 17, 1-14).
Sara é
envolvida, explicitamente, neste reforço da vontade de Deus que lhe muda o nome
de “Sarai” para Sara – como já tinha feito a Abraão (Gen 17, 5). Abençoa-a e
renova a promessa a partir dela: Eu a abençoarei e dela terás um filho, o
qual com a minha benção se tornará mais de um povo; e até reis de nações sairão
dela. (Gen 17, 16).
A Bíblia
regista a dúvida de que Abraão foi tomado ao afirmar que ele riu, quando fez a
ele mesmo as seguintes perguntas: Um homem de cem anos poderá ainda ter um
filho? Ou Sara, uma mulher com noventa anos, poderá ainda dar à luz? (Gn
17, 17). E sem ter outra esperança, voltando-se para Deus com o filho de Agar
no pensamento teve esta súplica: Oxalá que Ismael viva sob o vosso olhar!
(Gen 17, 18). Mas aquele filho não era o caminho que havia sido determinado.
Deus,
solícito, lembra-lhe de novo a promessa: É certo que Sara, tua esposa, te
dará à luz um filho a quem chamarás Isaac, com o qual estabelecerei a minha
aliança, como aliança perpétua, e com os seus descendentes, depois dele.
(Gen 17, 19).
Mas não esqueceria de Ismael.
Para ele tinha
um plano, que logo de imediato e segundo o relato bíblico apresentou a Abraão,
naturalmente meio atordoado por tudo quanto estava a ouvir: Também te ouvi a
respeito de Ismael. Abençoá-lo-ei e o tornarei fecundo e o multiplicarei
grandemente: gerará doze príncipes e o converterei numa grande nação. (Gen
17, 20).
A promessa do
filho legítimo cumpriu-se. Nasceu Isaac.
Aconteceu,
porém, que Sara não esquecera a antiga ofensa sofrida de Agar aquando do
nascimento de Ismael e, um dia, ao ver o filho da escrava a fazer gracejos a
Isaac, não se conteve, tendo pedido a Abraão: Expulsa essa escrava e seu
filho, pois o filho dessa escrava não será herdeiro com meu filho Isaac.
(Gen 21, 10). Conta a Escritura que Abraão se entristeceu, mas cobrou ânimo
porque ouviu Deus dizer-lhe: Não te aflijas por causa do menino e da
escrava. Faz tudo o que Sara te disser, porque é de Isaac que nascerá a
posteridade que terá o teu nome. Mas também do filho da escrava farei um grande
povo, porque é tua descendência. (Gen 21, 12-13).
E assim
aconteceu.
Abraão acabou
por despedir com destino errante pelo deserto de Bersabeia, Agar e Ismael, que
tendo o beneplácito de Deus se haveria de tornar no mais velho antepassado do
povo árabe.
De Isaac, o
filho da promessa haveria de nascer o povo israelita.
Este filho
fora o escolhido de Deus, mas isso, como já se assinalou, não fez apagar a
estima divina sobre o filho ilegítimo. Os dois irmãos seguiram, portanto,
caminhos diversos.
Até hoje.
Conta a
Escritura que estando Isaac num certo dia na Filisteia, então habitada por um povo que preenchia toda a
faixa costeira situada entre o Egipto e a Fenícia, fazendo os filisteus parte
dos chamados “povos do mar” e estando a cogitar sobre a necessidade de descer ao
Egipto na procura de melhores terras apareceu-lhe Deus, dizendo-lhe: Não
desças ao Egipto, mas continua a habitar nesta terra o lugar que te indicarei
(...) porque darei todas estas terras a ti e à tua descendência. e cumprirei o
juramento que fiz a Abraão, teu pai (...) Assim, habitou Isaac em Gerar." (Gen
26.1-6).
Gerar fica num
vale no território de Gaza.
De Isaac,
nasceria Jacob, que sendo em linha directa um semita puro viria a desembocar no
desenrolar das gerações nas doze tribos de Israel, nome que lhe foi posto – por
troca com Jacob – pelo próprio Deus após a lendária luta que ele travou toda a
noite com um anjo, que no fim, tendo-lhe perguntado o nome, lhe disse: Já
não te chamarás Jacob e sim Israel, porque te mediste com Deus e com os homens
e venceste. (Gen 32,
29). Este nome “Israel” em hebraico significa “aquele que luta com Deus”
tem, como se pode observar, a sua origem neste episódio bíblico.
No Livro do
Êxodo, Moisés quer saber quem é Deus e o Seu Nome e ouve por resposta o
seguinte: Sou Aquele que sou (...) Assim falarás aos filhos de Israel: Javé,
o Deus de vossos pais, o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacob, enviou-me a vós.
(Ex 3, 14-15)
Coube a Moisés
a condução do povo do exílio dos faraós.
Mas coube a
Josué entrar com o povo na Terra prometida. A conquista da Palestina pelas 12
tribos israelitas sob o comando de Josué, é narrada no livro que tem o seu
nome.
Mais tarde o
nome de Israel – com ressonância a Jacob - serviria para designar 10 dessas
tribos situadas ao Norte e também todo o território.
Segundo as
escrituras bíblicas Israel é a terra prometida por Deus aos hebreus, o berço do
Judaísmo no século XVII a.C.
A Terra de
Israel guarda as ruínas do Primeiro e do Segundo Templo. Foi nesta região que o
Judaísmo e o Cristianismo nasceram milénios atrás, e aqui se encontram ainda
hoje muitos lugares de grande significado espiritual para o Judaísmo,
Cristianismo e, inclusive, para o Islão.
3 – Ismael, o Mais Velho Antepassado do Povo Árabe
Ismael foi pai
de doze tribos, conforme a promessa de Deus e das quais descende a actual conglomeração
árabe.
Relata o Genésis (25, 12-18) que foram as seguintes
as gerações de Ismael: e estes são os nomes dos filhos de Ismael pela sua
ordem, segundo as suas gerações: o primogênito de Ismael era Nebaiote, depois
Quedar, Abdeel, Mibsão, Misma, Dumá, Massá,
Hadade, Tema, Jetur, Nafis e Quedemá. Estes são os filhos de Ismael, e
estes são os seus nomes pelas suas vilas e pelos seus acampamentos: doze
príncipes segundo as suas tribos. E estes são os anos da vida de Ismael, cento
e trinta e sete anos; e ele expirou e, morrendo, foi congregado ao seu povo.
Eles então habitaram desde Havilá até Sur, que está em frente do Egito, como
quem vai em direção da Assíria; assim Ismael se estabeleceu diante da face de
todos os seus irmãos.
Deus não faltou ao prometido. Disse que os
abençoaria e hoje existem 21 países árabes.
A expansão do povo ismaelita e árabe e a fusão
destes com os persas vindos provavelmente do
sul da actual Rússia - os indo-europeus - sem contar com a mistura entre
islamitas e judeus derivada dos colonialismos e
hegemonias europeias no Médio-Oriente, faz com que hoje se confundam
árabes com ismaelitas.
4 – Um Conflito antigo
Ressalta de todo o enquadramento
histórico-bíblico, que a personagem principal, “pai-Abraão” sabendo que Isaac
era, afinal, o filho da aliança que Deus queria estabelecer com os homens e
teria o desfecho na vinda de Jesus Cristo, não abandonou o filho Ismael, fruto
de um momento de desnorte, intercedendo por ele junto de Deus que lhe confirmou
o pedido e o fez origem de uma grande nação, ou seja todo o conjunto do povo
árabe.
Ressalta,
porém, que no tempo imediatamente
sucedâneo a estes acontecimentos, os descendentes de Ismael entraram em
conflito aberto com os descendentes de Isaac, como é referido no Salmo (83 2-5)
Senhor, não
vos deixeis ficar silencioso,
não vos
quedeis, ó Deus mudo e inactivo;
porque, eis
como se agitam os vossos inimigos,
e alçam a
cabeça os vossos adversários.
Tramam
conjuras contra o vosso povo
e conspiram
contra os vossos protegidos.
Dizem: “Vinde,
exterminemo-los,
de sorte
que não sejam mais um povo,
e de Israel
não haja mais memória”(...)
O conflito, como vemos, é antigo. E se ontem – há
milénios – a disputa tinha raízes próximas, no tempo actual com o advento de
uma nova mentalidade, parece que era chegada a altura dos homens se entenderem,
esbatendo as barreiras que ainda estão latentes na certeza que Deus-Pai ama
todos os homens, hoje, como ontem.
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