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quarta-feira, 15 de maio de 2013

CAVALEIRO E CAVALO DERROTADOS, NÃO!


O cavalo ajaezado e o cavaleiro vestido com trajes de combate oferecem-nos a imagem dolorosa de quem desistiu, olhando a postura de um e outro.
No imaginário que sustenta a livre criatividade literária, quanto a nós, o cavalo representa na sua moldura enfeitada a História que nos antecedeu desde o tempo da Reconquista Cristã do território, onde houve a espaços alguma grandeza, um facto que ao olhar o pormenor escultórico que representa o cavalo de combate de pescoço virado para o chão, se nos mostra o desalento ou o cansaço da corrida, também nos mostra que o chão continua verde.
Olhando, depois, o nobre cavaleiro - a que chamamos Portugal -  incomoda-nos muito a sua postura, por dois motivos: imita a sua montada virando o dorso e a cabeça para baixo, com a agravante de ter deixado descaídas as rédeas, como nos mostra a escultura e, desse modo, ter abandonado o que lhe competia fazer: dominar a montada onde se assenta, ou seja, todo o passado de Portugal que ele não engrandece, por nos parecer que cavalga a sua própria prisão e, ele, embora solto, mas de cabeça caída, é prisioneiro de si mesmo.
Tudo isto - retirando a parte real da História da Reconquista - não passa de uma alegoria centrada numa imagem que nos faz doer.
É que, isto que dizemos tem algo a ver com o povo que somos actualmente, esquecidos como andamos dos nossos esforçados avoengos, onde nos cumpre ir beber  a força da luta que travaram em terra e mar, e que urge restaurar para que não nos aconteça um qualquer emparedamento, deixando-nos prender por nós mesmos.
Vem isto a propósito de ter lido um poema de Miguel Torga no seu maravilhosos "Orfeu Rebelde" e que me levou a pensar que ao escrever o EMPAREDAMENTO, que é, também - e de que maneira! - uma alegoria muito bela, Torga teria pensado se o Sansão de que nos fala não é um cavaleiro que a si mesmo se derrotou, como está a acontecer com saudoso Portugal do tempo em que, em Tordesilhas chamou para si metade do Mundo e, agora, contra si mesmo irado é dentro de portas um degredado em rebeldia.
Vejamos o poema.

Força cercada pela própria força,
O drama não tem portas de evasão.
Num só corpo cadeia e condenado,
Quis a vida que eu fosse outro Sansão,
Mas um Sansão contra si mesmo irado.

Preso na casca como um vegetal,
É o meu avesso que me desafia.
Mas nem o muro cede, nem eu cedo;
Nem ele deixa de ser o meu degredo,
Nem eu o degredado em rebeldia.

Assim me desespero e me consumo,
E cumpro este destino tumular
De não sair de mim, por mais que faça.
A golpes de paixão, tento passar;
Mas rasgo a carne e o lutador não passa.

A bela escultura que nos deu o tema e que fala por si mesma parece esconder na sua massa de bronze esculpido o drama actual de Portugal sem portas de evasão, feito degredo para os que teimam em ficar de olhos no chão como o nobre cavaleiro, parecendo que nos é dirigida  a última estrofe do poema:

A golpes de paixão, tento passar,
Mas rasgo a carne e o lutador não passa.

Mas é preciso passar.
Contra tudo e contra todos, sobretudo, é preciso passar "sobre" aqueles que nos iludiram cantando canções de embalar e nos adormeceram.
O que eles não sabem é a força do povo, muito maior que a deles .
Depois de terem feito dos homens do povo imagens perfeitas do cavaleiro da escultura de dorso e cabeça para baixo, hão-de erguer-se e, se não forem os pais e os avós,  serão os seus filhos e netos que nunca lhes perdoarão o mal que fizeram ao velho e nobre Portugal, agora - e por muitos anos - de mão estendida e a sofrer o vexame de lhe virem dizer o modo de agir para dar cumprimento à velha lei do devedor perante o credor.
O povo há-de vencer.
O cavaleiro - Portugal - e o cavalo - a sua História - derrotados, NÃO!

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