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sábado, 25 de maio de 2013

A caridade



A chave que abre no coração do homem a porta da caridade deve-se a Jesus. Que a vossa mão direita não saiba o que faz a esquerda. (Mt 6,3), no pressuposto que o exercício da caridade deva permanecer em segredo.
Depois a sabedoria colectiva do povo, que é santa, foi ao longo dos tempos caldeando no grande cadinho popular, aforismos imbricados na caridade ao estabelecer conceitos que vão beber na fonte de Jesus, tal como Ele quer que aconteça na vivência humana.

Quem dá aos pobres, empresta a Deus.

O pão do corpo é uma esmola pela qual sempre se receberá a justa recompensa, mas o sorriso amigo é uma bênção para a eternidade.
O bem que praticares nalgum lugar será teu advogado em toda parte.
 A mão que escreve um livro nobre é respeitável e generosa, mas a mão que socorre um doente é sublime e santa.
Não taxes a tua bondade com impostos de gratidão. O amor não é um cobrador de impostos.
Não esqueças nunca que a caridade é o coração que levas na ponta do teu gesto.
    Todo aquele que semeia o bem é o primeiro beneficiado, como acontece com todo aquele que acende uma luz, porque se ilumina a si mesmo, em primeiro lugar.
A caridade, é assim, um acto humano a roçar o divino e cuja virtude maior está no modo como a praticamos: Que a vossa mão direita não saiba o que faz a esquerda.

Assenta nesta frase lapidar de Jesus e, depois, nos aforismos populares que se criaram em redor deste belo sentimento e acima reproduzidos, que não consentem nem podem aceitar a caridadezinha, que muitas vezes – vezes demais – tem existido ao longo dos séculos e que mais não é que uma afronta à beleza evangélica que S Mateus guardou e nos transmitiu, tendo-a ouvido – enquanto testemunha privilegiada – da boca de Jesus.
A caridade é, acima de tudo, amor.
Não se restringe à esmola, como é vulgarmente entendida, mas antes abarca todo o universo das relações em que nos achamos encontrados com os nossos semelhantes num dado tempo e lugar, sejam eles nossos inferiores, iguais, ou nossos superiores, do ponto de vista social, donde se infere que a caridade autêntica só existe, quando a justiça existe, não podendo esta ser uma carapaça para vestir o exterior, deixando o interior comportar-se sem regras e deveres sociais, impondo-se, por isso, ao homem, que o coração saia para fora e se torne o aliado preferencial do espírito.
Digamos não – um não profundo – à caridadezinha.
É uma máscara. Uma caricatura que não devia existir.

Caridade exemplar é a que Deus quer.

É aquela que retira algo do que se tem de bens materiais ou espirituais, não daquilo que sobra, mas, muitas vezes, do que faz falta para colmatar uma necessidade imediata ou minorar um sofrimento numa troca de bens e sentimentos que faz do homem de hoje – como aconteceu desde sempre – alguém que se parece com Aquele que um dia, exemplarmente, falou deste dom, de um modo franco e fraterno, deixando por detrás das suas Palavras todo um esquema de vida nova que era preciso ser vivido entre os homens.
É como se estes -  trocando a caridade, entre si -  cumprissem a lei universal expressa no dever de nos amarmos uns aos outros, fazendo da caridade  e lei maior, superior a qualquer carisma, dispondo-se não a fazer do próximo um meio para engrandecimento aos olhos da sociedade, mas antes, para fazer dele um benefício íntimo, onde apenas existe como testemunhas do bem que é feito, Deus, aquele que o faz e o beneficiário.
Virtude teologal que é, afirma o dom de estar inscrita na esfera de Deus, razão porque, se a praticamos para que o mundo a veja desvirtuamos o acto, fazendo-o cair na praça pública das vaidades mundanas.

Quer isto dizer que o amor ao próximo – que passa sempre, por ver Deus reflectido nele - se não tem o sentido que lhe deu Jesus, é um embuste.
Não respeitar isto é fazer a tal caridadezinha.
Há, pois, que por em prática um dos aspectos mais importantes da caridade, como seja, o de olhar o outro como pessoa, seja ela individual ou colectiva, arvorando-a como um dom de renúncia e partilha e nunca fazer da caridade um acto inconsequente no plano de Deus, quando a tornamos ofensiva da dignidade do outro.

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