Em Decreto de 11 de Setembro de 1750 de El-Rei D. José
I declara
João Frederico Ludovice Arquitecto-Mor do Reino
com a patente e soldo de brigadeiro
Pela grande capacidade com que servira, durante 43
anos, ao Senhor Rei D. João V, projectando obras com tal acerto que, executadas,
mostraram a magnificência de quem as mandara pôr em execução, e instruindo os
seus subordinados e colaboradores em tais obra, e de tal maneira, que mostraram
bem quanto à sua doutrina se deve o grande aditamento em que se acham as Artes
nestes Reinos, o declara Arquitecto-Mor do Reino, com patente e soldo de
brigadeiro. (1)
Homenagem da Câmara Municipal de Lisboa
no 2º centenário da morte do grande arquitecto
Fac-simile da capa da Revista Municipal nº 52 referente ao 1º trimestre de 1952
Comemorando
o segundo centenário do falecimento do Arquitecto João Frederico Ludovice (19
de Março de 1673 - 18 de Janeiro de 1752) a Revista Municipal, publicação
cultural da Câmara Municipal de Lisboa, no nº 52, referente ao 1º trimestre de
1952, publicou nas páginas 33 a
38 uma conferência realizada no Palácio
Galveias no dia 19 de Janeiro de 1952, de que se encarregou o Professor
jubilado da Escola de Belas Artes, Sr. Arqº
João António Piloto, sendo a mesma presidida pelo Sr. Presidente da Câmara,
Tenente Coronel Salvação Barreto.
O
orador, após uma breve citação à época
brilhante e faustosa do reinado de El-Rei D. João V - que coincidiu com a
actividade artística do homenageado, contemporâneo dos Luíses de França, acentuou, que pela arte e saber profissional
de João Frederico Ludovice, Portugal, recebeu a valiosa proeminência artística levada a cabo em França, de que eram
exemplo a colunata do Louvre e o castelo
de Versailles, a Igreja dos Inválidos e outras mais que ao testemunhar a
inspiração italiana baseada no
classicismo, se fizeram sentir grandemente na sua obra.
Desta
obra - grandiosa sob todos os aspectos - ressalta a construção do Palácio Real
de Mafra (1717-1730), declarando o Arq. João António Piloto que o conjunto é
uma imensa mole arquitectónica, exemplar
perfeito do século XVIII, cuja majestade e nobreza sobressai pela imponência da
sua expressão artística.
Informa-se
no texto, que esta obra, após concurso com os arquitectos Juvara e Canevari foi
entregue a Ludovice, alemão de
nascimento, mas com longa estadia em Roma, o qual nessa ocasião se encontrava
em Lisboa, dirigindo e realizando obras no Colégio de Santo Antão. (2)
Nave central da
Basílica do Palácio Real de Mafra
Biblioteca do
Palácio Real de Mafra
Quase
em simultâneo desenha e dirige as obras do o Pórtico da Biblioteca da
Universidade de Coimbra (1716-1725) e a Torre (1728-1733) (3),
e enquanto se ultimam os trabalhos da real construção de Mafra, começa a
construção do fantástico Aqueduto das Águas Livres (1729- 1748); seguindo-se a
Capela-Mor da Sé de Évora e o Altar-Mor da Igreja de S. Domingos, em Lisboa, no
ano de 1748, mas a cujo acabamento Ludovice não assistiu, sendo de assinalar
que esta Capela teve a sorte do terramoto de 1755 a ter poupado à grande destruição que sofreu o
restante edificado do grandioso Templo.
Litografia
publicada na Revista Municipal nº 4 - vol.I do anmo de 1937
A
Revista Municipal que se refere à grandiosa obra que atravessou o Vale de
Alcântara intitula o respectivo texto que lhe é dedicado do seguinte modo: O
Aqueduto das Águas Livres e o Arquitecto Ludovice, dando conta de intrigas e
escaramuças havidas entre o brigadeiro
Manuel da Maia e Custódio Vieira, quanto à autoria do projecto, o que levou
Ludovice a defender a honra, ao afirmar que a autoria do mesmo lhe pertencia, havendo-o elaborado por ordem do rei, e
fazendo prova disso, com a apresentação do projecto que merecera do rei D. João
V, as seguintes palavras: Há tanto tempo
que se anda com esta obra, e até o presente não vi tanto risco sobre ella, como
agora vejo. (4)
Capela-Mor da
Sé de Évora
A capela-mor da sé de Évora tem uma projecção
vertical muito acentuada e um altar “à romana”, com a utilização de colunas e
pilastras de ordem compósita marcando os ritmos e enquadrando o retábulo de
pintura, as esculturas e a decoração esculpida. Este edifício possui também
largos janelões, que permitem a entrada de muita luz. Os mármores são também um
valor acrescentado desta obra, com predomínio de tonalidades de verde, rosa e
azul cinza.
Ludovice deu neste espaço interior uma
lição de erudição clássica, de um vigor compositivo apreendido em Roma, durante
a sua estadia lá. No interior, a abside tem a forma arredondada e divide-se e,
dois pisos; são sobrepostas duas ordens arquitectónicas, nomeadamente as
pilastras jónicas na parte inferior e as pilastras compósitas na zona superior. (5)
Capela - Mor da
Igreja de S. Domingos
A
Capela-Mor do Convento de S. Domingos (Igreja de S. Domingos) na cidade de
Lisboa, foi edificada em 1748 por Ludovice e acabada por
João António de Pádua é rematada por um arco de volta perfeita que marca a
outra extremidade da abóbada de berço e possui quatro grandes colunas sem capitel
que delimitam o receptáculo do Sacrário com porta de bronze. O conjunto é
rematado por formação escultórica ladeando o registo central, duas mísulas com
as estátuas de S. Domingos e S. Francisco. Nas paredes laterais, janelas ao
nível do grupo escultórico superior. Sob cada uma das esculturas existem
portas, sendo que a do lado Sul dá acesso a uma sala de planta circular onde se
arrumam alfaias litúrgicas e paramentos e se encontra um lanço de escadas
circular que dá acesso ao nível inferior. Na prumada da anterior sala,
encontra-se a cripta, com silhar de azulejos de padrão, polícromo (séc. 17)
interrompido por corredores simulados sem saída e bancada circular incompleta.
O chão é em ladrilho e convergente para um algeroz que assim evita as
anteriores inundações. No braço direito do transepto uma porta dá acesso à
Sacristia através de um corredor em L, forrado por azulejos de figura avulsa,
em que se encontra um vão oval com uma Imagem de Nossa Senhora da Nazaré e um
nicho com imagem de Nossa Senhora da Purificação ou da Escada. (6)
Em 1743, a sua última
intervenção foi a Capela de São João Baptista na Igreja de São Roque, segundo
os riscos que enviou para Roma. João Frederico Ludovice altera os riscos de
Luigi Vanvitelli, para a Capela de São João Baptista em São Roque, enviando
para Roma os desenhos com as alterações, uma vez que Vanvitelli se recusava a
alterar o projecto inicial. O projecto definitivo é praticamente da autoria de
Ludovice se forem comparados o projecto inicial e as alterações impostas por
Ludovice, segundo a correspondência entre Ludovice e Vanvitelli, publicada por
Sousa Viterbo. (7)
Fundador
da chamada “Escola de Mafra”, num dado momento da conferência, realizada como
já se assinalou, em 19 de Janeiro de 1952, pelo orador foi acentuado: Os artistas notáveis que saíram da Escola de
Mafra muito ilustraram, além dos seus nomes, o do Mestre que os houvera guiado
na sua aprendizagem, concluindo neste ponto, por dizer que, é esta, talvez, a
obra e acção mais elevada, nobre e fecunda do célebre arquitecto, pois as
lições e exemplos transmitidos aos que acompanhavam as suas doutrinas, vieram
reflectir-se bem directamente nas obras que em seguida se fizeram.
Na
referida homenagem, não faltou que fosse tecida a seguinte imagem da
espiritualidade que movia o grande Arquitecto: Ludovice, paralelamente com a muita erudição que possuía, tinha o
sentido bem nítido da grande unidade universal, pois as suas obras afirmam
muito acentuadamente, um claro sentimento de ordem, de harmonia, e de
proporções que conduzem o espírito humano à compreensão da beleza eterna e à
perfeição ideal e divina.
E no
prosseguimento, o orador, fez o retrato da realidade vivida e deixada como
herança pelo Mestre:
João Frederico Ludovice fez permanência
em Itália durante longo tempo, nessa terra fecunda e inesgotável das Belas
Artes, pátria de Buonarroti, Brunelesco, Paladio, Guiberti, Lucca Della Róbia, Donatelo, Leonardo da
Vinci, Bramante, Rafael Sanzio e tantos outros que ilustraram com as suas
preciosas obras a época imortal da Renascença, tendo colhido nesse grande meio
de espiritualidade artística os férteis ensinamentos que lhe permitiram
realizar as magníficas obras de Arte que nos legou. (…)
Se bem que não fosse português, foi tão
notável e majestosa a sua impressionante obra produzida durante o muito tempo
que entre nós viveu, havendo realizado tantos trabalhos de Arte, e de tal
maneira contribuído para o levantamento espiritual das Belas Artes no nosso
País que nos devemos honrar em considerá-lo como filho adoptivo da nossa Pátria
e exaltar a memória de quem tanto a enobreceu.
A elevada e singular acção que Ludovice
exerceu em Portugal no campo das Belas Artes foi tal, que as repercussões
resultantes da sua actividade profissional são bem manifestas nas produções de
Arte que se fizeram nos reinados seguintes de D. José e de D. Maria I.(…)
Após
isto e ao focar o espírito instalado em Portugal a partir da Escola de Mafra,
acentuou-se que ele está bem provado na
grandiosa expressão da Praça do Comércio da autoria do arquitecto Eugénio dos
Santos, onde se observa uma sumptuosidade acentuadamente inspirada na que
mostra o magnífico Edifício de Mafra.
O muito reputado Monumento a El-Rei D.
José, situado na mesma Praça, do escultor Machado de Castro, também discípulo
da Escola de Mafra, revela vincadamente a influência de Ludovice.(…)
A Basílica do Coração de Jesus, no
Largo da Estrela, cujo projecto se deve ao arquitecto Mateus Vicente de
Oliveira, igualmente discípulo da mesma Escola, faz ver com precisa acentuação
dos ensinamentos que este recebera do Mestre Ludovice, dada a transparente
analogia entre as duas Basílicas.(…)
A
terminar a conferência o orador deixou expresso o seguinte:
Como preito de gratidão da nossa Pátria
julgo que deveria assinalar-se o seu aureolado nome numa das artérias da Cidade
de Lisboa para que, através dos tempos, houvesse sempre a lembrança de quem
tanto enobreceu a nossa Nação e muito contribuiu para o engrandecimento
espiritual e sentimental da nossa Pátria.
Não
ficou sem resposta da edilidade a sugestão.
Na
Freguesia de Benfica, a rua com seu ilustre nome ficará a mostrar à posteridade
o génio artístico de João Frederico Ludovice, Arquitecto segundo a Ordem
profissional e Brigadeiro segundo a distinção concedida por El-Rei D. José I,
que ao ter ascendido ao trono em 1750, não quis deixar de homenagear o notável
artista que ilustrara, sobremaneira, com obras grandiosas o reinado do pai.
A rua
com o seu nome ao ter tomado assento na Freguesia de Benfica, constituiu no
século XX a bem merecida homenagem que lhe foi prestada pela Câmara Municipal
de Lisboa, que ao escolher a localidade de Benfica, que no tempo do Mestre se
situava “fora de portas”, lembrou o facto assinalável com que a sua arte se fez
sentir na construção da Igreja Paroquial de Nossa Senhora do Amparo, iniciada
em Agosto de 1750 e cuja traça da frontaria
apresenta claros vestígios do Barroco italianizado, a marca deixada no
encaixe artístico das pedras pelo autor do projecto, Mestre João Frederico
Ludovice.
.......................................................................................................
(1) - in, Revista Municipal, de onde foram extraídas as gravuras que se inserem no
presente texto
(2) - Neste antigo Colégio está, hoje, instalado
o Hospital de S. José.
(3) -
http://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_de_Coimbra
(4) - in, Revista Municipal nº 4 - vol.I, ano 1937.
(5) - in,
http://politicaculturaljoanina.blogspot.pt/2011/11/capela-mor-da-se-de-evora.html
(6) - in, http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=5258
(7) - in, http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Frederico_Ludovice
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