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sexta-feira, 24 de outubro de 2014

João Frederico Ludovice




Em Decreto de 11 de Setembro de 1750 de El-Rei D. José I declara
João Frederico Ludovice Arquitecto-Mor do Reino
com a patente e soldo de brigadeiro


Pela grande capacidade com que servira, durante 43 anos, ao Senhor Rei D. João V, projectando obras com tal acerto que, executadas, mostraram a magnificência de quem as mandara pôr em execução, e instruindo os seus subordinados e colaboradores em tais obra, e de tal maneira, que mostraram bem quanto à sua doutrina se deve o grande aditamento em que se acham as Artes nestes Reinos, o declara Arquitecto-Mor do Reino, com patente e soldo de brigadeiro. (1)


Homenagem da Câmara Municipal de Lisboa
no 2º centenário da morte do grande arquitecto 

  
    Fac-simile da capa da Revista Municipal nº 52 referente ao 1º trimestre de 1952
  



Comemorando o segundo centenário do falecimento do Arquitecto João Frederico Ludovice (19 de Março de 1673 - 18 de Janeiro de 1752) a Revista Municipal, publicação cultural da Câmara Municipal de Lisboa, no nº 52, referente ao 1º trimestre de 1952, publicou nas páginas 33 a 38  uma conferência realizada no Palácio Galveias no dia 19 de Janeiro de 1952, de que se encarregou o Professor jubilado  da Escola de Belas Artes, Sr. Arqº João António Piloto, sendo a mesma presidida pelo Sr. Presidente da Câmara, Tenente Coronel Salvação Barreto.
O orador, após uma breve citação à época brilhante e faustosa do reinado de El-Rei D. João V - que coincidiu com a actividade artística do homenageado, contemporâneo dos Luíses de França, acentuou, que pela arte e saber profissional de João Frederico Ludovice, Portugal, recebeu a valiosa proeminência artística levada a cabo em França, de que eram exemplo a colunata do Louvre e o castelo de Versailles, a Igreja dos Inválidos e outras mais que ao testemunhar a inspiração italiana baseada no classicismo, se fizeram sentir grandemente na sua obra.
Desta obra - grandiosa sob todos os aspectos - ressalta a construção do Palácio Real de Mafra (1717-1730), declarando o Arq. João António Piloto que o conjunto é uma imensa mole arquitectónica, exemplar perfeito do século XVIII, cuja majestade e nobreza sobressai pela imponência da sua expressão artística.
Informa-se no texto, que esta obra, após concurso com os arquitectos Juvara e Canevari foi entregue a Ludovice, alemão de nascimento, mas com longa estadia em Roma, o qual nessa ocasião se encontrava em Lisboa, dirigindo e realizando obras no Colégio de Santo Antão. (2)



  
Nave central da Basílica do Palácio Real de Mafra



  
Biblioteca do Palácio Real de Mafra 


Quase em simultâneo desenha e dirige as obras do o Pórtico da Biblioteca da Universidade de Coimbra (1716-1725) e a Torre (1728-1733) (3), e enquanto se ultimam os trabalhos da real construção de Mafra, começa a construção do fantástico Aqueduto das Águas Livres (1729- 1748); seguindo-se a Capela-Mor da Sé de Évora e o Altar-Mor da Igreja de S. Domingos, em Lisboa, no ano de 1748, mas a cujo acabamento Ludovice não assistiu, sendo de assinalar que esta Capela teve a sorte do terramoto de 1755  a ter poupado à grande destruição que sofreu o restante edificado do grandioso Templo.



Litografia publicada na Revista Municipal nº 4 - vol.I do anmo de 1937


A Revista Municipal que se refere à grandiosa obra que atravessou o Vale de Alcântara intitula o respectivo texto que lhe é dedicado do seguinte modo: O Aqueduto das Águas Livres e o Arquitecto Ludovice, dando conta de intrigas e escaramuças havidas entre o brigadeiro Manuel da Maia e Custódio Vieira, quanto à autoria do projecto, o que levou Ludovice a defender a honra, ao afirmar que a autoria do mesmo lhe pertencia, havendo-o elaborado por ordem do rei, e fazendo prova disso, com a apresentação do projecto que merecera do rei D. João V, as seguintes palavras: Há tanto tempo que se anda com esta obra, e até o presente não vi tanto risco sobre ella, como agora vejo. (4)



  
Capela-Mor da Sé de Évora


A capela-mor da sé de Évora tem uma projecção vertical muito acentuada e um altar “à romana”, com a utilização de colunas e pilastras de ordem compósita marcando os ritmos e enquadrando o retábulo de pintura, as esculturas e a decoração esculpida. Este edifício possui também largos janelões, que permitem a entrada de muita luz. Os mármores são também um valor acrescentado desta obra, com predomínio de tonalidades de verde, rosa e azul cinza.
Ludovice deu neste espaço interior uma lição de erudição clássica, de um vigor compositivo apreendido em Roma, durante a sua estadia lá. No interior, a abside tem a forma arredondada e divide-se e, dois pisos; são sobrepostas duas ordens arquitectónicas, nomeadamente as pilastras jónicas na parte inferior e as pilastras compósitas na zona superior. (5)



Capela - Mor da Igreja de S. Domingos


A Capela-Mor do Convento de S. Domingos (Igreja de S. Domingos) na cidade de Lisboa, foi  edificada em 1748 por Ludovice e acabada por João António de Pádua é rematada por um arco de volta perfeita que marca a outra extremidade da abóbada de berço e possui quatro grandes colunas sem capitel que delimitam o receptáculo do Sacrário com porta de bronze. O conjunto é rematado por formação escultórica ladeando o registo central, duas mísulas com as estátuas de S. Domingos e S. Francisco. Nas paredes laterais, janelas ao nível do grupo escultórico superior. Sob cada uma das esculturas existem portas, sendo que a do lado Sul dá acesso a uma sala de planta circular onde se arrumam alfaias litúrgicas e paramentos e se encontra um lanço de escadas circular que dá acesso ao nível inferior. Na prumada da anterior sala, encontra-se a cripta, com silhar de azulejos de padrão, polícromo (séc. 17) interrompido por corredores simulados sem saída e bancada circular incompleta. O chão é em ladrilho e convergente para um algeroz que assim evita as anteriores inundações. No braço direito do transepto uma porta dá acesso à Sacristia através de um corredor em L, forrado por azulejos de figura avulsa, em que se encontra um vão oval com uma Imagem de Nossa Senhora da Nazaré e um nicho com imagem de Nossa Senhora da Purificação ou da Escada. (6)


Em 1743, a sua última intervenção foi a Capela de São João Baptista na Igreja de São Roque, segundo os riscos que enviou para Roma. João Frederico Ludovice altera os riscos de Luigi Vanvitelli, para a Capela de São João Baptista em São Roque, enviando para Roma os desenhos com as alterações, uma vez que Vanvitelli se recusava a alterar o projecto inicial. O projecto definitivo é praticamente da autoria de Ludovice se forem comparados o projecto inicial e as alterações impostas por Ludovice, segundo a correspondência entre Ludovice e Vanvitelli, publicada por Sousa Viterbo. (7)

Fundador da chamada “Escola de Mafra”, num dado momento da conferência, realizada como já se assinalou, em 19 de Janeiro de 1952, pelo orador foi acentuado: Os artistas notáveis que saíram da Escola de Mafra muito ilustraram, além dos seus nomes, o do Mestre que os houvera guiado na sua aprendizagem, concluindo neste ponto, por dizer que, é esta, talvez, a obra e acção mais elevada, nobre e fecunda do célebre arquitecto, pois as lições e exemplos transmitidos aos que acompanhavam as suas doutrinas, vieram reflectir-se bem directamente nas obras que em seguida se fizeram.

Na referida homenagem, não faltou que fosse tecida a seguinte imagem da espiritualidade que movia o grande Arquitecto: Ludovice, paralelamente com a muita erudição que possuía, tinha o sentido bem nítido da grande unidade universal, pois as suas obras afirmam muito acentuadamente, um claro sentimento de ordem, de harmonia, e de proporções que conduzem o espírito humano à compreensão da beleza eterna e à perfeição ideal e divina.
E no prosseguimento, o orador, fez o retrato da realidade vivida e deixada como herança pelo Mestre:

João Frederico Ludovice fez permanência em Itália durante longo tempo, nessa terra fecunda e inesgotável das Belas Artes, pátria de Buonarroti, Brunelesco, Paladio, Guiberti,  Lucca Della Róbia, Donatelo, Leonardo da Vinci, Bramante, Rafael Sanzio e tantos outros que ilustraram com as suas preciosas obras a época imortal da Renascença, tendo colhido nesse grande meio de espiritualidade artística os férteis ensinamentos que lhe permitiram realizar as magníficas obras de Arte que nos legou. (…)

Se bem que não fosse português, foi tão notável e majestosa a sua impressionante obra produzida durante o muito tempo que entre nós viveu, havendo realizado tantos trabalhos de Arte, e de tal maneira contribuído para o levantamento espiritual das Belas Artes no nosso País que nos devemos honrar em considerá-lo como filho adoptivo da nossa Pátria e exaltar a memória de quem tanto a enobreceu.
A elevada e singular acção que Ludovice exerceu em Portugal no campo das Belas Artes foi tal, que as repercussões resultantes da sua actividade profissional são bem manifestas nas produções de Arte que se fizeram nos reinados seguintes de D. José e de D. Maria I.(…)

Após isto e ao focar o espírito instalado em Portugal a partir da Escola de Mafra, acentuou-se que ele está bem provado na grandiosa expressão da Praça do Comércio da autoria do arquitecto Eugénio dos Santos, onde se observa uma sumptuosidade acentuadamente inspirada na que mostra o magnífico Edifício de Mafra.
O muito reputado Monumento a El-Rei D. José, situado na mesma Praça, do escultor Machado de Castro, também discípulo da Escola de Mafra, revela vincadamente a influência de Ludovice.(…)
A Basílica do Coração de Jesus, no Largo da Estrela, cujo projecto se deve ao arquitecto Mateus Vicente de Oliveira, igualmente discípulo da mesma Escola, faz ver com precisa acentuação dos ensinamentos que este recebera do Mestre Ludovice, dada a transparente analogia entre as duas Basílicas.(…)

A terminar a conferência o orador deixou expresso o seguinte:
Como preito de gratidão da nossa Pátria julgo que deveria assinalar-se o seu aureolado nome numa das artérias da Cidade de Lisboa para que, através dos tempos, houvesse sempre a lembrança de quem tanto enobreceu a nossa Nação e muito contribuiu para o engrandecimento espiritual e sentimental da nossa Pátria.
Não ficou sem resposta da edilidade a sugestão.
Na Freguesia de Benfica, a rua com seu ilustre nome ficará a mostrar à posteridade o génio artístico de João Frederico Ludovice, Arquitecto segundo a Ordem profissional e Brigadeiro segundo a distinção concedida por El-Rei D. José I, que ao ter ascendido ao trono em 1750, não quis deixar de homenagear o notável artista que ilustrara, sobremaneira, com obras grandiosas o reinado do pai.

A rua com o seu nome ao ter tomado assento na Freguesia de Benfica, constituiu no século XX a bem merecida homenagem que lhe foi prestada pela Câmara Municipal de Lisboa, que ao escolher a localidade de Benfica, que no tempo do Mestre se situava “fora de portas”, lembrou o facto assinalável com que a sua arte se fez sentir na construção da Igreja Paroquial de Nossa Senhora do Amparo, iniciada em Agosto de  1750 e cuja traça  da frontaria apresenta claros vestígios do Barroco italianizado, a marca deixada no encaixe artístico das pedras pelo autor do projecto, Mestre João Frederico Ludovice.

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(1) -   in,  Revista Municipal, de onde foram extraídas as gravuras que se inserem no presente texto
(2)  - Neste antigo Colégio está, hoje, instalado o Hospital de S. José.
(3) - http://pt.wikipedia.org/wiki/Universidade_de_Coimbra
(4)  - in, Revista Municipal nº 4  - vol.I, ano 1937.
(5)  - in, http://politicaculturaljoanina.blogspot.pt/2011/11/capela-mor-da-se-de-evora.html
(6)  - in, http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=5258
(7)  - in, http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Frederico_Ludovice


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