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sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Pedro Tomé: um amigo de Jesus! (Conto de Natal)






Tudo começara numa determinada Escola Primária – que hoje tem outro nome -  antes das férias de um certo Natal, correspondendo ao hábito que a professora tinha de convidar de vez em quando um velho colega, o professor Mário, já reformado, que com o seu jeito peculiar bem conhecido vinha contar uma história aos alunos, ouvida sempre com a atenção que era devida àquele conceituado mestre.

Naquele dia o professor Mário agasalhado no seu sobretudo cor de mel e algo já curvado pela força dos anos postou-se à frente da classe e andando de um lado para o outro, serenamente, na sua voz ainda bem timbrada começou a desfiar a sua história, que era, afinal, um lindo Conto de Natal.

Ouçamos o velho professor.
Começou assim:

Ouvi esta história, quando era menino como vós sois agora. E acrescentou: a personagem principal tem um lindo nome: Pedro Tomé.
Era um pobre de Deus que vivia de esmolas. Não tendo eira nem beira habitava um miserável casebre cuja parede do fundo era um enorme penedo por onde escorria a água da invernia quando lhe dava o vento da nortada.

Era um homem honrado que primava pela educação, sobressaindo pelos modos como falava, sobretudo de Jesus, de quem se dizia seguidor, pelo facto de se chamar Pedro Tomé, algo que o enobrecia por ostentar com orgulho os nomes próprios de dois dos seus apóstolos.
Pedro Tomé tinha uma adoração muito especial pelo Menino que nascera humildemente e se fizera Homem, tendo-se deixado crucificar por amor dos homens, um acontecimento que levou o professor Mário a dizer que, com o seu sacrifício, Jesus inaugura um tempo novo de que resultara o Novo Testamento onde se recolhem todos os Livros Sagrados que o compõem.

Fora este facto que motivara todo o amor que lhe dedicava Pedro Tomé, que desde sempre acalentava a ideia de ter um Menino Jesus de madeira, rosado e de braços abertos, como vira, um dia, na loja do Sr. Lopes, na última visita que fizer à vila, mas com o senão de o vender por um preço para o qual não chegava o seu magro pecúlio.
Como não conseguiu comprar aquela desejada escultura, afeiçoou-se mais a uma imagem d’Ele, velha e já gasta pelo uso que um dia lhe haviam dado na Casa das Courelas, não indo lá mais vezes por ter vergonha de incomodar aquela santa gente que o recebia com modos brandos e caritativos.

A esta velha imagem, Pedro Tomé passou a guardar um amor muito seu.
Era quase uma adoração.

Já que não era possível ter um Menino Jesus de madeira que bem desejava colocar num altar na sua humilde habitação – onde a sua imaginação sempre O viu -  gostava que aquela Imagem à qual rezava todos os dias nunca o desacompanhasse nem se perdesse.
Nas suas deambulações aconteceu-lhe estar, um dia, em vésperas de Natal defronte da Casa das Courelas, mas com receio de se anunciar, pois tinha nobreza de sentimentos e custava-lhe a o incómodo que causava àquela boa gente.

Pensava nisto, quando sentindo-se muito fraco e doente, não hesitou mais. Tendo endireitado o corpo dobrado pelos anos e pela penúria de uma vida de privações a que acrescia, agora, uma dor aguda que há dias o incomodava, arrimou-se ao portão e puxou com a força que pode o cordão da sineta.
Aconteceu isto ao cair da noite.
Recebeu-o D. Genoveva a sua santa protectora e, como era costume mandou-o entrar para o quinteiro, enchendo-lhe o bornal de abundantes vitualhas.

Reconhecido, Pedro Tomé lembrou-se que aquela família não faltaria como de costume à Missa do Galo, vindo-lhe à lembrança o beijo que era dado a um Menino Jesus de madeira, como aquele que não pudera comprar na loja do Sr. Lopes.
D. Genoveva, condoída do aspecto adoentado de Pedro Tomé sentiu vontade de o sentar à mesa da consoada, o que faria se isso dependesse apenas da sua vontade.

Partiu o pobre, soçobrando o muito que a santa senhora lhe dera e pensando, que apesar de doente devia dirigir-se à Igreja no intento de agradecer e beijar o Menino, mas porque esta ficava longe e era bem curto o seu passo, fraquejou e após ter conversado como fazia tantas vezes com Jesus, só lhe restou arranjar forças para pedir perdão e dirigir-se para o seu casebre que ficava bem perto, na dobra do caminho.

Pedro Tomé estava, efectivamente, muito mal de saúde com uma febre altíssima que fazia sacudir o seu corpo magro.
A noite era álgida e fria, cortada de vez em quando por um vento agreste e batida por uns farrapos de neve que enregelavam o corpo do pobre que já se arrastava num dado ponto, quando o caminho se inclinava na ladeira que dava para a sua pobre habitação.
De vez em quando sentia uma dor maior a roer-lhe o peito e o olhar toldava-se, deixando ficar no ar visões de um Presépio que nunca tivera e no qual se agigantava um Menino Jesus de braços abertos onde o pobre julgava ver no delírio da febre um gesto dirigido para ele.

Era noite funda quando abriu a porta desengonçada e penetrou no interior da habitação. Acendeu a candeia e a sua fraca luz pareceu-lhe um imenso clarão e, nele, distinto e bem recortado apareceu-lhe – no delírio febril - a imagem de um Presépio, no local onde havia pensando erigir um altar para colocar o Menino Jesus de madeira que, agora lhe sorria.

Era um Presépio como nunca vira outro.

Aturdido pela dor que o consumia, Pedro Tomé deixou-se cair agarrado à Imagem de Jesus que sacou de um dos bolsos do casaco de onde escorriam alguns flocos de neve.
E foi naquele delírio que pensou ver à sua frente rosado e lindo um Menino Jesus que estava ali deitado nas palhas louras daquele Presépio encantado, como se o estivesse a chamar. Debruçado sobre Ele julgou abraçá-l’O, enquanto no êxtase que o dominava levou os seus dedos a acariciar os cabelos louros de Jesus, tendo sobre si os olhares atentos e carinhosos de S. José e de Nossa Senhora, enquanto os seus lábios se colavam aos beijos à velha Imagem que os anos haviam amarelecido, prefigurando ver nela a escultura do Menino Jesus de madeira que não pudera adquirir.

Por fim, adormeceu, até se dar conta que na manhã do Dia de Natal uma ténue claridade lhe entrava em poalhas de luz através do janelo voltado a Nascente, mas de tal modo que lhe beijava o rosto como se fora um acaricia. Ainda mal acordado respirou fundo e de imediato sentiu-se aliviado da dor física que tanto o havia incomodado e, até, ao passar a mão pela testa sentiu que a febre cedera.
Foi no decorrer do exame “clínico” que fazia a si mesmo que ouviu alguém chamar à porta do casebre:

- Pedro Tomé.
- Quem é?... já vai.
Ergueu-se, vestiu o velho sobretudo e ao abrir a porta deu de caras com o Sr. Lopes, o dono da loja da vila, que ele bem conhecia.
- Seja bem-vindo… que faz aqui, senhor Lopes?...entre se faz favor.
E, solícito, abriu de par a par a porta da humilde habitação.
- Olha, Pedro Tomé. Hoje é  Dia de Natal… tempo de fazer bem. Trago-te aqui uma prenda… espero que gostes dela.
- Uma prenda? - Obrigado…mas…
- Deixa-te disso e abre. É para ti.
Pedro Tomé, tremente, abriu o embrulho e retirou dele, com as lágrimas a correr-lhe pela face o Menino Jesus de madeira que lhe quisera comprar.
Comovido, agradeceu:
- Obrigado. Que Jesus e o bom Deus lhe paguem tão valioso dado.

E num ímpeto com a estatueta do Menino Jesus agarrada contra o peito com a sua mão direita, com a outra mão abraçou profundamente o Sr. Lopes, ficando assim por alguns momentos aquele quadro belíssimo, com Jesus de braços abertos a unir os corações dos dois homens, um por ter cumprido o preceito do amor humano e o outro, grato ao irmão mais afortunado e a Jesus que naquele dia nascera, mais uma vez, por amor de todos os homens.
Conta-se que Pedro Tomé erigiu na pobre habitação o altar que tanto ambicionara para o Menino-Jesus e ao ter feito d’Ele sob todos os aspectos a sua maior riqueza, dizia para quem o queria ouvir, ser o homem mais rico do mundo.




Este foi o Conto de Natal contado a uma turma de alunos de uma qualquer imaginária Escola, onde, para além de ser ter posto em prática a assunção da 1ª obra de misericórdia corporal, que manda dar de comer a quem tem fome, acresceu o dom da solidariedade pela dádiva da Imagem de Jesus a quem a não podia adquirir, e desse modo, não se praticou o 2º pecado capital: o da avareza, ressaltando nobremente destes dois actos de amor o preceituado no velho Catecismo da Igreja Católica.



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