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domingo, 7 de dezembro de 2014

Mudou o tempo, mas...




Oliveira Martins (Joaquim Pedro de)


Um olhar pela História dos tempos finais da Monarquia - nos aspectos da Economia de Estado - agora que se aproxima o fim do ano de 2014, pode parecer um despautério, mas, às vezes, convém que o façamos para se julgar o tempo presente o que faz situar o nosso pensamento, para o efeito, para um tempo situado em finais do século XIX relativamente à nossa vida pública e colectiva.

Concluímos que o tempo actual no que concerne às finanças públicas tem tais similitudes que estas não deixam de ser perturbantes, constituindo a análise, um facto demonstrativo da inépcia endémica que nos devia envergonhar quando cotejamos as duas realidades, pesem embora os muitos anos que a roda do tempo já consumiu desde o dia em que Oliveira Martins subiu à tribuna parlamentar para falar ao País.

Recuando todos esses anos, temos que no dia 20 de Janeiro de 1892, Oliveira Martins, Ministro das Finanças no governo presidido por Dias Ferreira, apresentou o programa financeiro do novo governo empossado em 17 de Janeiro, para substituir João Crisóstomo, que após a demissão do governo em exercício aquando do Ultimato inglês de 1890, não conseguira unir as partes do governo de unidade nacional que então se criara.

Num dado passo do seu discurso, Oliveira Martins, declarou:



Não cansarei a câmara reproduzindo algarismos que todos conhecem, e fazendo considerações que hoje, felizmente, estão no espírito de todos e que é deplorável que o não estivessem há muito tempo; porque o facto é que, desde longos anos, nós vivemos uma vida completamente artificial, abandonando as fontes da riqueza natural do pais. Nós chegámos a este estado, verdadeiramente anormal, de consumir exclusivamente produtos estrangeiros e de trabalhar exclusivamente com capitais estrangeiros; de nos dessangrarmos anualmente com o serviço desses capitais e com o preço desses produtos! Assim vivíamos efectivamente e assim vivemos durante largos anhos, se o espaço de meio século, pouco mais ou menos, se pode chamar largos anos; mas vivemos como? Vivemos exagerando a soma da dívida pública até às proporções verdadeiramente esmagadoras em que hoje se encontra.


Nos tempos difíceis que correm, não raro, ouvimos dizer às mentes menos comprometidas com os meandros políticos que Portugal nas últimas duas dezenas de anos – no mínimo – tem vivido acima das suas posses, ou seja, a riqueza criada não tem sustentado o nível de vida que temos feito, endividando-nos em cada ano que tem passado, como se a Economia fosse um poço sem fundo e não andássemos a pedir dinheiro emprestado, para suprir as faltas de liquidez dos orçamentos nacionais, que já geraram asserções, como: “deixaram-nos o País de tanga” e, na aprovação do orçamento para 2011, na mesma linha, ouvimos dizer; “deixaram-nos de calças na mão”, epítetos de mediato julgados aterradores por alguns apaniguados dos governos do PS em exercício, como se, quando se falou do País ter ficado de “tanga” António Guterres não tivesse falado do “pântano” em que se tornara a vida pública... e tivesse abalasse.

Mas voltando ao discurso de Oliveira Martins de 20 de Janeiro de 1892, relativamente ao facto de termos andado a viver, fingindo de ricos, ele disse: desde longos anos, nós vivemos uma vida completamente artificial, para acrescentar, logo a seguir, algo que nós temos feito, a começar pelo abandono dos campos, tendo desleixado uma das  fontes da riqueza natural do pais, a que se seguiu, entre outras, o abandono do mar português, a indústria pesada e a metalo-mecânica.

Tudo isto, por ordem da Europa, que nos convidou a deixar cair os braços, de que resultou um empobrecimento suicida a que alegremente, ao que parece, nos entregámos, sem termos uma voz de comando  que nos alertasse que a diferença entre a importação e a exportação havia de ser paga em espécie, isto é, com o dinheiro recebido por empréstimos, que outra coisa não temos feito há décadas, ao ponto de estarmos todos endividados, um facto de que só agora parece haver consciência.

Tudo isto é o resultado de termos passado a consumir exclusivamente produtos estrangeiros e de trabalhar exclusivamente com capitais estrangeiros; de nos dessangrarmos anualmente com o serviço desses capitais e com o preço desses produtos, como no mesmo discurso disse Oliveira Martins.

Voltar ao passado, lembrando aquele antigo chefe do governo, é lembrar uma atitude que deviam ter tido os altos responsáveis dos Governos do PSD e PS - mais este Partido pelo tempo que tem governado o País - não tendo havido especial cuidado com as Finanças Públicas.

Esta é a verdade histórica e, ainda, que agora de nada nos valha chorar pelo leite derramado, não se pode - nem aqueles Partidos nem o povo passar uma esponja para limpar um passado de desnorte a que Portugal foi conduzido, mercê do "abandalhamento" económico dos respectivos Ministérios.

A verdade é grande e não pode - nem deve ser escondida -  doa a quem doer, o que nos remete para a lucidez que nos faltou, mas sem ter faltando, na época, a Oliveira Martins que na parte do discurso acima transcrito disse com todas as letras: 

Vivemos exagerando a soma da dívida pública até às proporções verdadeiramente esmagadoras em que hoje se encontra.

Hoje, dizemos o mesmo.
Mas é bom que fiquem estas palavras, demonstrativas que há diferenças abissais nos homens de Estado, que é, precisamente, o que nos faltou nos tempos das "vacas gordas", ao ter-se iludido o povo com uma riqueza nacional que nos vinha, mas não dos nossos rendimentos...


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