NÃO
MORRAS!
Mo
morras, coração; recobra alentos;
na
taça da amargura nutre a vida;
nos
venenos mortais, alma abatida,
energia
acharás alguns momentos.
Mo
fujas d'afrontar novos tormentos,
não
vergues ante a dor já pressentida;
caminhe
ao cadafalso, fronte erguida,
quem
sofre há muito os paroxismos lentos.
Fui
grande ante mim próprio; ergui ufano
a
face entre os mimosos da fortuna,
cuspi-lhes
a grandeza, o orgulho insano.
Ergueu
minha soberba alta coluna;
firmei-a
no trabalho ... Oh cego engano
lançou-m'a
em terra a mão da desfortuna.
1857
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São do seu livro "Ao Anoitecer da Vida" estes versos trabalhados em forma de soneto, em que o grito - Não Morras - que Camilo Castelo Branco lança ao seu próprio coração nos deixa a pensar quão tumultuosa foi a vida deste grade mestre da palavra.
Lendo este soneto o sentimento que fica, é quase de oração.
De um profundo respeito pelo homem que ele foi, mas seguramente, muito mais pelo que poderia ter sido, se as "Estrelas Funestas" - título que ele deu a um outro livro seu - não tivessem sido assim para ele, que lhe encheram a vida de amores, que ele mesmo maltratou e de vicissitudes de que não pode fugir o seu coração irrequieto a que ele, naquela parcela de amor próprio que nunca o abandonou - e o levou ao extremo - pediu, como se lê:
Não fujas d'afrontar novos tormentos, como se aquele coração que havia de acabar vencido por ele mesmo, fosse um navio em cima de um mar tenebroso em que cada vaga vencida era motivo suficiente para vencer a próxima vaga que não tardava... porque nunca tardaram na sua vida as vagas da desfortuna.
Esta é a última palavra deste soneto de força humana que, contudo, não deixa de ter a par o desconforto do cego engano por onde correu o mar da vida deste formidável escritor da Língua Portuguesa.
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