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sábado, 17 de dezembro de 2016

Um poema de Natal de Ary dos Santos


Quando um Homem Quiser

Tu que dormes à noite na calçada do relento
numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
és meu irmão, amigo, és meu irmão

E tu que dormes só o pesadelo do ciúme
numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
e sofres o Natal da solidão sem um queixume
és meu irmão, amigo, és meu irmão

Natal é em Dezembro
mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
é quando um homem quiser
Natal é quando nasce
uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto
que há no ventre da mulher

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
tu que inventas bonecas e comboios de luar
e mentes ao teu filho por não os poderes comprar
és meu irmão, amigo, és meu irmão

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
és meu irmão, amigo, és meu irmão

Ary dos Santos, in 'As Palavras das Cantigas'
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Apenas uma palavra, porque pela sua limpidez social e eticamente perfeito este belo poema de Natal de Ary dos Santos, o que merece - antes de qualquer palavra por mais erudita que seja - é uma reflexão pelo sentido da fraternidade que perpassa e nos inquieta em cada verso, especialmente, nos últimos, em que a fartura que enche a mesa dos fartos devia pôr um sabor amargo em cada prato cheio de iguarias, porque cada pobre é irmão do mais rico, e isto - que é uma verdade antropomórfica devia ter pelo seu peso humano o significado que não fosse, apenas, o seu assento no Dicionário, mas o seu assento na consciência comum que devia nortear a existência humana tendo em conta o preceito do número 1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. 

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