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terça-feira, 6 de dezembro de 2016

A Mãe!


in, Revista "Branco & Negro" de 3 de Maio de 1869
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 Minha mãe, minha mãe! ai que saudade imensa,
 Do tempo em que ajoelhava, orando, ao pé de ti.
 Caia mansa a noite; e andorinhas aos pares
 Cruzavam-se voando em torno dos seus lares,
 Suspensos do beiral da casa onde nasci.

 Era a hora em que já sobre o feno das eiras
 Dormia quieto e manso o impávido lebreu.
 Vinham-nos da montanha as canções das ceifeiras,
 E a Lua branca, além, por entre as oliveira,
 Como a alma dum justo, ia em triunfo ao Céu!..
 E, mãos postas, ao pé do altar do teu regaço,
 Vendo a Lua subir, muda, alumiando o espaço,
 Eu balbuciava a minha infantil oração,
 Pedindo a Deus que está no azul do firmamento
 Que mandasse um alívio a cada sofrimento,
 Que mandasse uma estrela a cada escuridão.
 Por todos eu orava e por todos eu pedia.
 Pelos mortos no horror da terra negra e fria,
 Por todas as paixões e por todas as mágoas..
 Pelos míseros que entre os uivos das procelas
 Vão em noite sem Lua e num barco sem velas
 Errantes através do turbilhão das águas.
 O meu coração puro, imaculado e santo
 Ia ao trono de Deus pedir, como ainda vai,
 Para toda a nudez um pano de seu manto,
 Para toda a miséria o orvalho do seu pranto
 E para todo o crime o seu perdão de Pai!..

 A minha mãe faltou-me era eu pequenino,
 Mas a sua piedade o fulgor diamantino
 Ficou sempre abençoando a minha vida inteira,
 Como junto de um leão um sorriso divino,
 Como sobre uma forca um ramo de oliveira!

Guerra Junqueiro


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