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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Um hino de amor a todas as MÃES do Mundo vibrado com a corda da SAUDADE

Capa do Livro editado pela "Parceria A.M. Pereira, Lda em 1966



Creio não estar enganado, mas para quem conhece, mesmo ao de leve a vida tumultuosa de Camilo Castelo Branco, a obra "Horas de Paz" com que ele encheu de páginas brilhantes dois volumes, foram escritas em horas de paz, como se, a sua estadia em Vila Real em casa de uma sua irmã, onde recebeu educação religiosa de um padre-cura, irmão do seu cunhado, não tivesse sido em vão.

E não foi certamente, como podemos constatar no nº II do Cap, XIII, "Bibliografias", quando ao falar dessa palavra mítica que só Portugal possui - SAUDADE - ao debruçar-se sobre uma poesia do seu amigo José Barbosa e Silva que ele dedicou à memória da sua falecida mãe, Camilo Castelo Branco - ele que foi registado como "filho de mãe incógnita" - soltou estas palavras que são um verdadeiro hino de amor a todas as mães, tendo como inspiração a saudade que ela achou no poema do seu amigo poeta.
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Há, porém, uma saudade, estremecida filha do céu e embalada connosco no nosso berço de infância. Brincámos com ela no colo de nossas mães, ouvimos-lhe melodias que os anjos lhe emprestaram, beijámo-la em nossos sonhos, tememo-la em nossos temores infantis, viemos abraçados com ela até às portas do "mundo", e aí... perdemo-la, chamamos-la em vão, e lamentamo-la para sempre perdida.

Essa saudade é a crença religiosa que nos desceu ao coração filtrada pelos lábios maternais. Dessa crença o que nos ficou foi a cruel certeza de estar quebrado o santo prisma por onde a víamos; o que se perdeu foi o ideal da singela fá com que nossa mãe nos dourava as santas aspirações a um mundo, que não era, que não podia ser este.

E o coração do mancebo, que se sentou fatigado do mundo ao longo do caminho da sua preregrinação, tem instantes de enlevo que o transportam ao túmulo de sua mãe, pedindo-lhe palavras de conforto, hálito de vida para a fé em Cristo, que sente morrer-lhe no espírito.
Os lábios do cadáver respondem-lhe pela voz da saudade; e o mancebo a quem Deus confiara uma lira, tão cedo enlutada pelo véu do desalento, faz que o seu canto gema, faz que o seu estro se alevante do pó da terra e procure no céu o espírito de sua mãe.

É o talento protestando contra a ignorância audaciosa dos que passam no mundo, vermes dum dia escarnecendo cinicamente a fé e amor dos que adoram a Cruz, farol divino da morada imortal dos justos.
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Ao ler este pedaço de prosa de Camilo Castelo Branco, fica a impressão do grande artista da palavra ter burilado pelo seu cinzel literário uma escultura dessa terna e única criatura a que o homem chama - MÃE - e, porque lhe fazia falta, a ter adornado com a flor da saudade que ele vai buscar na linha da fé na Cruz, que é chamada por Camilo o farol divino da morada dos justos.

Sobretudo, o que admira, neste belo texto em que um escritor responde a um poeta através duma prosa - que é, também, uma poesia - é o facto de Camilo Castelo Branco, órfão de mãe com um ano de idade, não tendo tido cognitivamente uma lembrança real da mulher com quem viveu abraçado - como ele diz no texto - até às portas do "mundo", nos deixou nesta escultura literária, um hino de tão profundo amor a todas as MÃES do mundo e que, ao ter batido à porta da SAUDADE, retiniu com tal força, que o seu eco, ainda hoje, perdura.

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