No nº 3 da Mensagem do Papa Francisco para a Quaresma de 2016, no parágrafo anterior ao que se reproduz, o Papa fala do mistério inaudito e escandaloso do prolongamento, na história, do sofrimento de Jesus Cristo, para concluir assim, no parágrafo seguinte, que bem merece ser lido e meditado:
Diante deste amor forte como a morte fica
patente como o pobre mais miserável seja aquele que não aceita reconhecer-se
como tal. Pensa que é rico, mas na realidade é o mais pobre dos pobres. E isto
porque é escravo do pecado, que o leva a utilizar riqueza e poder, não para
servir a Deus e aos outros, mas para sufocar em si mesmo a consciência profunda
de ser, ele também, nada mais que um pobre mendigo. E quanto maior for o poder
e a riqueza à sua disposição, tanto maior pode tornar-se esta cegueira
mentirosa. Chega ao ponto de não querer ver sequer o pobre Lázaro que mendiga à
porta da sua casa sendo este figura de Cristo que, nos
pobres, mendiga a nossa conversão. Lázaro é a possibilidade de conversão que
Deus nos oferece e talvez não vejamos. E esta cegueira está acompanhada por um
soberbo delírio de omnipotência, no qual ressoa sinistramente aquele demoníaco
«sereis como Deus» que é a raiz de qualquer pecado. Tal delírio pode
assumir também formas sociais e políticas, como mostraram os totalitarismos do
século XX e mostram hoje as ideologias do pensamento único e da tecnociência
que pretendem tornar Deus irrelevante e reduzir o homem a massa possível de
instrumentalizar. E podem atualmente mostrá-lo também as estruturas de pecado
ligadas a um modelo de falso desenvolvimento fundado na idolatria do dinheiro,
que torna indiferentes ao destino dos pobres as pessoas e as sociedades mais
ricas, que lhes fecham as portas recusando-se até mesmo a vê-los.
Em Ano da Misericórdia esta chamada de atenção aos ricos (Paises, Organizaçõs colectivas ou os próprios indivíduos) sem terem misericórdia para com os mais fracos e pobres, vivendo um modelo de falso desenvolvimento fundado na idolatria do dinheiro, faz ressoar a tentação antiga, ou seja, se viverdes segundo a minha lei, sereis como Deus (Gn 3,5) e que o Papa não deixa de referir, para chamar a atenção dos homens, porquanto, nesta sociedade que não vê Lázaros à porta a pedir - ao menos, que seja - as migalhas que sobram das mesas dos ricos, estão a fazer falta os Obras de Misericórdia, a começar pelas três primeiras corporais, de cujo cumprimentos surgem todas as outras.
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