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sexta-feira, 25 de abril de 2014

O Adamastor



Com a devida vénia, www.sapo.pt

No Adamastor de Os Lusíadas, o grande poema épico de Luís de Camões, dos maiores da Literatura mundial, o Poeta restaura a figura mitológica de um dos titãs que se revoltaram contra Zeus e foram por este severamente castigados ao ponto de serem transformados em rochedos, ilhas e promontórios. Conforme o relato do épico, no início o seu aspecto é o de uma figura grandiosa, estranha e horrenda. A aparência descomunal do colosso é sugerida ainda antes de ele surgir, como se observa nas estrofes 37 e 38 do canto V, quando se forma uma temerosa nuvem negra, acompanhada dos urros insanos do mar irado.

Este aspecto negro e carregado do céu e do mar funciona como uma espécie de presságio, anunciando qualquer coisa de temível, que vem a corporizar-se no “Adamastor” e, desde logo, na sua postura medonha e má:

 "Não acabava, quando uma figura 
                             Se nos mostra no ar, robusta e válida, 
                             De disforme e grandíssima estatura, 
                             O rosto carregado, a barba esquálida, 
                             Os olhos encovados, e a postura 
                             Medonha e má, e a cor terrena e pálida, 
                             Cheios de terra e crespos os cabelos, 
                             A boca negra, os dentes amarelos. (1)
  
A sua imagem traduz as dificuldades sentidas pelos navegadores na passagem do Oceano Atlântico para o Oceano Índico, ao dobrarem o então chamado Cabo das Tormentas, mais tarde baptizado com o nome da Boa Esperança, por simbolizar as descobertas que havia para fazer.
É um processo de enaltecimento da raça que se atreveu a dobrar o Cabo das Tormentas,  encarnando a vingança dos elementos naturais face à audácia dos navegadores portugueses que se atreviam a penetrar em espaços até então inacessíveis ao homem.

Na primeira parte do seu discurso o “Adamastor” apresenta-se como rei e senhor do mar tenebroso e desconhecido, ameaçando os portugueses que a todo o custo queriam devassar os domínios secretos que só ele dominava, levando-o a profetizar para eles castigos futuros.
Na segunda parte do seu discurso, o Adamastor, identificando-se com o cabo Tormentório e elogiando-se por ter conseguido o domínio dos mares, logo se abre em confidências, revelando os acontecimentos que o levaram até àquele estado. A sua paixão por Tétis mereceu o castigo dos deuses, que converteram o seu gigantesco corpo no Cabo das Tormentas.

O Adamastor, surge no poema de Camões, como uma criação maravilhosa a corporizar e a simbolizar a quase intransponível força do Oceano naquele lugar.
O gigante é, pois, o símbolo de todas as forças cósmicas que continuamente limitam o homem na sua sede de aventura.
A vitória dos nautas portugueses sobre o obstáculo que este gigante constituía  significou para sempre  o completo domínio dos mares pelas naus que passaram adiante e daquelas que esperavam em Lisboa por notícias da empresa levada a cabo em 1487, por Bartolomeu Dias a mando de el-Rei D. João II.




(1) - Lusíadas, canto V, estrofe 39

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