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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Um soneto de Bento Faria


De certo modo é no anarquismo revolucionário de Maria da Fonte onde o soneto "À Mocidade" vai buscar a sua fonte inspiradora


À Mocidade

A vida só é bela quando tem
a norteá-la a ideia mais sublime,
quando pela virtude esmaga o crime,
quando esmaga a maldade pelo bem.

Abençoado o coração que vem
a decepar a mão que nos oprime;
porque só a virtude é que redime,
e virtuoso eu chamo a esse alguém...

Armai-vos, corações, do santo amor,
e vinde combater, sempre pensando
nesse ideal de deleitosa cor.

É vasto o campo ... e lá de quando em quando
vos reanimará a humana dor,
- e tereis forças p'ra morrer, amando ...

Lisboa 1905 - Bento Faria
in, "Luz e Vida" - Revista de Sociologia, Arte e Crítica


Caíram-me os olhos sobre este soneto.

Desconheço o autor, que foi colaborador da Revista "Luz e Vida" que se publicou no Porto, de Fevereiro a Julho de 1905. Nos seus únicos seis números publicados, tendo-se assumido como fazendo parte de uma corrente, por alguns considerara, libertária e por outros, anarquista, este soneto, marcadamente, está incluindo nesse espírito de alguma rebelião.

Abençoado o coração que vem
a decepar a mão que nos oprime;

Mas este convite ao uso de alguma violência contra aquele que quer condicionar, pela opressão, seja o homem individual ou a sociedade, logo a seguir, no primeiro terceto,  o autor enche-se de benevolência, como que redimido-se:

Armai-vos, corações, do santo amor,
e vinde combater, sempre pensando
nesse ideal de deleitosa cor.

E na parte final, mormente, no último verso, o que se lê é um chamamento à pureza do amor, quando ele é impulsionado, ainda que seja por ideais anárquicos, porque, morrer, amando - como acaba o soneto - é um ensinamento que tem cintilaçõs do Mártir do Calvário que assim morreu, amando os próprios algozes que O pregaram na Cruz!

E, por isso, ao entrar no espírito do soneto e da corrente sociológica que o inspirou, dei comigo a pensar naquele Mártir do Calvário, e não pude deixar de associar o percurso da vida do Homem-Deus a um certo "anarquismo" que Ele, para falar do Seu Credo foi obrigado a viver contra as seitas sociológicas do seu tempo, profundamente opressoras da liberdade do povo que Ele veio para libertar.

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