Parábola da ovelha perdida
Sobre a
bondade de Deus para com os pecadores
Texto do Evangelho de S. Lucas 15, 1-7
Qual é o homem
dentre vós que, possuindo cem ovelhas e tendo perdido uma delas, não deixa as
noventa e nove no deserto e vai à procura da que se tinha perdido, até a
encontrar? Ao encontrá-la, põe-na alegremente aos ombros e, ao chegar a casa,
convoca os amigos e vizinhos e diz-lhes: Alegrai-vos comigo, porque encontrei
a minha ovelha perdida.’ Digo-vos Eu:
Haverá mais alegria no Céu por um só pecador que se converte, do que por
noventa e nove justos que não necessitam de conversão.
Estamos perante uma parábola de profundo cunho
eclesial.
Antes de se tecer qualquer comentário sobre o seu
conteúdo doutrinal cabe por inteiro uma reflexão sobre a missão de Jesus.
Ele é em todos os aspectos humanos uma Pessoa
perfeitamente identificada com uma realidade de povo e de pessoas. Com a sua
vida de Missionário por excelência Ele
não só influenciou como se deixou influenciar pela cultura do seu tempo
na postura de um judeu marcado pela vida, costumes e modo de ser dos judeus,
ainda que, com sua missão viesse com a finalidade de transcender a história da
sua gente, dando à sua doutrina um carácter de universalidade e transcendendo
até mesmo aos critérios de tempo e de espaço.
Jesus veio chamar todas as ovelhas perdidas da casa de Israel, assumindo-se como imagem do Deus invisível, o primogénito de toda a criação; porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de todas as coisas, e nele subsistem todas as coisas. (1)
Jesus veio chamar todas as ovelhas perdidas da casa de Israel, assumindo-se como imagem do Deus invisível, o primogénito de toda a criação; porque nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de todas as coisas, e nele subsistem todas as coisas. (1)
Como imagem
que é do Deus invisível, O Pai Criador que ama todos os filhos,
uma das Suas missões – talvez a mais importante, porque nela se fundem todos os
valores divinos - era a da salvação de todos os homens, não deixando que um só
se perdesse pelo caminho.
Resulta daqui que é um erro pensar-se que somente pessoas boas podem alcançar o céu e que as más vão para o inferno, ou seja, que todos os que vivem sem pecado se salvam e um só que seja, desgarrando-se dos outros, esteja condenado para sempre
Jesus não quer que isto aconteça e vai, por isso, à procura da ovelha perdida, abrindo com esta atitude a porta da esperança e da misericórdia de Deus, sempre aberto ao perdão e cujas Palavras não deixam a menor dúvida quanto à salvação possível pela obra da graça, pois: Por certo não há justo na terra que só faça o bem sobre a terra e não peque. (2)
Com a simpática parábola da ovelha perdida ou desgarrada, Jesus quer-nos dar de uma forma eficaz e com entendimento fácil, o valor da salvação da alma.
Resulta daqui que é um erro pensar-se que somente pessoas boas podem alcançar o céu e que as más vão para o inferno, ou seja, que todos os que vivem sem pecado se salvam e um só que seja, desgarrando-se dos outros, esteja condenado para sempre
Jesus não quer que isto aconteça e vai, por isso, à procura da ovelha perdida, abrindo com esta atitude a porta da esperança e da misericórdia de Deus, sempre aberto ao perdão e cujas Palavras não deixam a menor dúvida quanto à salvação possível pela obra da graça, pois: Por certo não há justo na terra que só faça o bem sobre a terra e não peque. (2)
Com a simpática parábola da ovelha perdida ou desgarrada, Jesus quer-nos dar de uma forma eficaz e com entendimento fácil, o valor da salvação da alma.
Com Bom Pastor que era, embora a perda de uma em cem
das ovelhas do rebanho parecesse coisa de somenos importância, deixou-nos a
lição de só por ela serem merecidos todos os trabalhos para o seu encontro,
parecendo, até, justificado o esquecimento das restantes.
Uma outra lição que esta parábola nos dá é a certeza
evangélica de todos sermos filhos de
Deus, sendo, desse modo – as ovelhas do rebanho - de acordo com a
bela imagem evangélica e em consequência dela, herdeiros de Deus, porque os que
crêem serão revelados nos céus eternos como filhos do Pai celestial, tendo parte como herdeiros de toda a riqueza
da glória de Deus.
Isto supera nossa capacidade de entendimento mas é
assim que está determinado, razão porque se torna urgente a procura de quem se
perdeu no meio da escuridão do mundo.
É, precisamente, para iluminar a ovelha perdida que deixou de ver o caminho da salvação que Jesus nos chama tendo-se em conta o usufruto da herança prometida a todos os homens.
Jesus nunca falou em vão, porque Ele mesmo disse: Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão. (3)
É nesta certeza de que as palavras de Jesus são eternas e se destinam a trazer de volta os homens desgarrados, porque elas nunca deixarão sem fruto quem delas se servir, competindo-nos ir com o arrimo que elas nos dão à procura de todos aqueles que são no rebanho de Deus as ovelhas perdidas, por culpa própria e, muitas vezes, por culpa de um mundo ingrato e cruel que as esqueceu e deixou de correr atrás delas para as animar no regresso que preciso fazer à Casa do Pai
É, precisamente, para iluminar a ovelha perdida que deixou de ver o caminho da salvação que Jesus nos chama tendo-se em conta o usufruto da herança prometida a todos os homens.
Jesus nunca falou em vão, porque Ele mesmo disse: Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão. (3)
É nesta certeza de que as palavras de Jesus são eternas e se destinam a trazer de volta os homens desgarrados, porque elas nunca deixarão sem fruto quem delas se servir, competindo-nos ir com o arrimo que elas nos dão à procura de todos aqueles que são no rebanho de Deus as ovelhas perdidas, por culpa própria e, muitas vezes, por culpa de um mundo ingrato e cruel que as esqueceu e deixou de correr atrás delas para as animar no regresso que preciso fazer à Casa do Pai
Jesus chama-nos nesta parábola à prática de uma
acção comum e prosseguida por todos aqueles que tendo perdido um objecto de
pouco valor, ainda assim, deixam a posse certa de outros mais valiosos e não
cessam a busca enquanto não encontram o objecto transviado, alegrando-se e
fazendo uma festa quando tal acontece. É destes que a pena de S. Mateus se
ocupa referindo as palavras do Mestre: Então
os justos- ou seja, os homens bons que buscam aquele que se perdeu e é
preciso reencontrar - resplandecerão como o sol, no reino de seu
Pai. (4)
É um ensinamento antigo.
Velho de séculos.
O profeta Daniel, cujas palavras não eram estranhas
a Jesus, já havia dito: (...) os que
tiverem ensinado a muitos para a justiça, serão como estrelas para sempre,
eternamente.(5)
É destas estrelas que a parábola se ocupa, lembrando aos homens a necessidade da procura daquela que no Céu de Deus deixou de brilhar.
É um desafio que temos pela frente, para que não venha a perecer um só destes pequeninos, na sábia expressão do Mestre que chama pequeninos a todos aqueles que num dado momento, estando em baixo, precisam da mão do outro para vir acima e que de modo nenhum pode ser recusada.
Quadro de James Tissot (1886-94)
Parábola
da dracma perdida
Sobre o
anseio em achar na ordem da fé
aquilo que
se perdeu
Texto do Evangelho de S. Lucas 15, 8-10
Ou qual é a mulher que,
tendo dez dracmas e perdendo uma dracma, não acende a candeia, e não varre a
casa, buscando com diligência até encontrá-la? E achando-a, reúne as amigas e
vizinhas, dizendo: Alegrai-vos comigo, porque achei a dracma que eu havia perdido. Assim, digo-vos, há alegria na presença dos
anjos de Deus por um só pecador que se arrepende
A dracma
era moeda de pouco valor.
Eram precisas cem para se possuir uma mina e seis mil para um se ter um talento.
Jesus utiliza, na linha já traçada na da parábola
da ovelha perdida um sentido eclesial
nesta parábola, com o pormenor da perda ser uma moeda, dizendo que a mulher
tinha dez e perdeu uma, mostrando à evidência que a perda era de pouca monta, o
que não evitou, porém, que ela se esforçasse e varresse a casa com todo o cuidado até a encontrar.
Somos levados a concluir que o sentido último que
Jesus alcança de uma forma transcendente, servindo-se como de costume com um
exemplo ou comparação com um facto da vida quotidiana, é o amor perseverante de Deus que nunca abandona o
pecador deixando-o entregue ao seu destino de perdição, mas tudo faz até o
encontrar, alegrando-se com ele com paternal solicitude, com uma diferença, que
no fim conduz a um mesmo resultado, relativamente ao contentamento que existe
sempre quando encontramos bens perdidos, sejam eles de ordem material ou
espiritual.
Efectivamente, enquanto o achamento da dracma perdida pela mulher se traduziu
num benefício material imediato para ela, a volta do pecador – um encontro com
ele mesmo - é traduzida por um bem maior que é encontrado e traduzido no enriquecimento espiritual da
Casa de Deus.
Um facto e outro, são sempre um motivo de alegria.
A mulher, ridente pelo achado exprime-se do seguinte modo: Alegrai-vos comigo, porque achei a dracma que eu havia perdido.
Jesus, porém, tem uma perspectiva diferente, de
ordem doutrinal, podo-a na escuridão em que vive o pecador e era preciso chamar
à luz dos bens espirituais.
A mulher da
parábola é a figura da Igreja que Jesus fora chamado a fundar.
A dracma
é o pecador entre uma multidão de justos.
Este número confortável, mesmo assim, só seria
satisfatório na Nova doutrina que Jesus advogava, quando o elemento perdido
voltasse a fazer parte da comunidade.
Jesus era exigente, nestas coisas.
Queria a unidade entre os homens, não podendo um só
que fosse andar arredio e entregue aos maus caminhos. Não facilitava e não
cedia. Queria sempre o pleno, a ponto de algumas vezes ter criado incomodidades
no grupo apostólico.
Fazendo do pecador alguém que teria de ser salvo –
Ele não viera para os sãos mas para os doentes – criou com a Palavra que dizia
verdadeiras ferramentas espirituais
de que S. Tiago nos dá conta, quando se dirigiu a um grupo de homens ricos que
haviam esquecido um justo: E agora, vós
ricos, chorai e pranteai, por causa das desgraças que vos sobrevirão. As vossas
riquezas estão apodrecidas, e as vossas vestes estão roídas pela traça. O vosso ouro e a vossa prata estão
enferrujados; e a sua ferrugem dará testemunho contra vós, e devorará as vossas
carnes como fogo. Entesourastes para os últimos dias. Eis que o salário que fraudulentamente
retivestes aos trabalhadores que ceifaram os vossos campos clama, e os clamores
dos ceifeiros têm chegado aos ouvidos do Senhor dos exércitos. Deliciosamente
vivestes sobre a terra, e vos deleitastes; cevastes os vossos corações no dia
da matança. Condenastes e matastes o justo(...) (6)
O pecador, muitas vezes, é o justo que se afasta ou
é afastado pelos mais poderosos.
A dracma
perdida é este pecador afastado por si mesmo ou vítima de uma sociedade
egoísta, que não se importa de o perder nem vai à sua procura, porque nesta
sociedade de consumo estão faltando os valores da solidariedade que fazem o
homem voltar atrás para por no bom caminho aquele que se perdeu.
Mas, vós Senhor, como se diz o Salmo, bem conheces a minha estultice, e as minhas
culpas não te são ocultas.(7)
A dracma
perdida é, ainda, algo que nos leva a concluir que por um motivo qualquer
lhe faltou a luz das restantes que aquela mulher contava entre os dedos, à luz
do dia.
Vivia de tal modo na escuridão que seria preciso, à
sua proprietária acender a candeia como Jesus sugere.
Temos aqui em profusão o sentido da Luz de Deus
para iluminar os homens, chamando-os à comunhão entre os seus iguais e vivendo
a essa Luz perfeita que tem a particularidade de os iluminar por dentro e por
fora e de que S. João se fez eco: E esta é a mensagem que dele ouvimos, e vos
anunciamos: que Deus é luz, e nele não há trevas nenhumas. Se dissermos que
temos comunhão com ele, e andarmos nas trevas, mentimos, e não praticamos a
verdade; mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com
os outros, e o sangue de Jesus seu Filho nos purifica de todo pecado. Se
dissermos que não temos pecado nenhum, enganamo-nos a nós mesmos, e a verdade
não está em nós. Se confessarmos os
nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar
de toda injustiça. Se dissermos que não
temos cometido pecado, fazemo-Lo mentiroso, e a Sua palavra não está em nós. (8)
A dracma
perdida pode, por isso, ser um de nós.
Homens sujeitos ao pecado, como diz S. João.
Homens que é preciso encontrar, num dia qualquer
para os chamar ao encontro da Luz e da comunhão com os outros.
É esta uma das atribuições da Igreja.
Parábola
do Filho Pródigo
Sobre o
regresso do pecador à Casa do Pai
Texto do Evangelho de S. Lucas 15, 11-32
Disse-lhe mais:
Certo homem tinha dois filhos. O mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a
parte dos bens que me toca. Repartiu-lhes, pois, os seus haveres. Poucos dias
depois, o filho mais moço ajuntando tudo, partiu para um país distante, e ali
desperdiçou os seus bens, vivendo dissolutamente.
E, havendo ele
dissipado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a passar
necessidades. Então foi encontrar-se a um dos cidadãos daquele país, o qual o
mandou para os seus campos a apascentar porcos. E desejava encher o estômago
com as alfarrobas que os porcos comiam; e ninguém lhe dava nada. Caindo, porém,
em si, disse: Quantos empregados de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui
pereço de fome! Levantar-me-ei, irei ter com meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei
contra o céu e diante de ti; já não sou
digno de ser chamado teu filho; trata-me como um dos teus empregados.
Levantou-se, pois, e foi para seu pai. Estando ele ainda longe, seu pai o viu,
encheu-se de compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou.
Disse-lhe o
filho: Pai, pequei conta o céu e diante de ti; já não sou digno de ser chamado
teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa, e
vesti-lha, e ponde-lhe um anel no dedo e alparcas nos pés; trazei também o bezerro, cevado e matai-o;
comamos, e regozijemo-nos, porque este meu filho estava morto, e reviveu;
tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a regozijar-se. Ora, o seu filho
mais velho estava no campo; e quando voltava, ao aproximar-se de casa, ouviu a
música e as danças; e chegando um dos
servos, perguntou-lhe que era aquilo.
Respondeu-lhe
este: Chegou teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são
e salvo. Mas ele se indignou e não queria entrar. Saiu então o pai e instava
com ele. Ele, porém, respondeu ao pai: Eis que há tantos anos te sirvo, e nunca
transgredi um mandamento teu; contudo nunca me deste um cabrito para eu me
regozijar com meus amigos; vindo, porém,
este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as meretrizes, mataste-lhe o
bezerro cevado. Replicou-lhe o pai: Filho, tu sempre estás comigo, e tudo o que
é meu é teu; era justo, porém,
regozijarmo-nos e alegramo-nos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu;
tinha-se perdido, e foi achado.
.
Esta parábola, conjuntamente com a da ovelha e a da
dracma perdidas, constitui o tríduo das parábolas da misericórdia de Jesus,
recolhidas por S. Lucas. Jesus abarca, entre outras, quatro questões
fundamentais:
1 - a vivência do homem numa sociedade sem valores.
2 - a certeza de que, quem pede, alcança.
3 - a confissão do pecado.
4 - pôr-se a caminho na esperança de ser perdoado.
Diz o texto que o filho mais novo tendo juntado tudo
o que fazia parte da herança do pai, partiu para uma terra longínqua e por lá
esbanjou tudo quanto possuía, vivendo dissolutamente, donde se percebe que o
meio social não lhe foi favorável, a ponto de o ter enredado numa teia falha de
valores morais, ao arrepio dos que recebera em casa do pai através duma
educação honrada que fazia do trabalho uma fonte de moralização dos costumes.
E este passo vivido por aquele gastador em vícios de
má sorte é um retrato que descobre a pobreza e é causa de todos os males, pondo
muita gente honesta - como ele era - a passar fome, tendo a montante dos
problemas criados entre outras, três questões sociais, a primeira, religiosa
por ter principiado pela negação das leis de Deus, a segunda situada no campo da moral por afectar as
relações entre os homens e os deveres que devem existir entre eles e,
finalmente, a terceira, focada no campo da economia material, como aconteceu
com o pródigo, gastando a riqueza recebida sem cuidar que naquela atitude
estava a malbaratar a própria dignidade humana, tão necessária ao equilíbrio
espiritual.
Tudo isto aconteceu com o pródigo naquela sociedade
sem Deus.
Tendo, de acordo com o texto evangélico, tendo
sobrevido a fome naquela terra distante, o pródigo, gastos que estavam todos os
bens, deu em procurar um emprego que fosse digno da educação recebida, o que
não conseguiu, tendo por fim alcançado um lugar de pastor de porcos, onde o
trato destes era superior àquele que lhe era dispensado, bem de acordo com a
falta de moral e doutrina daquele patrão que maltratava desta maneira a sua
miséria.
Bem desejava ele encher o estômago com as alfarrobas
que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava.
Naquela sociedade não havia nem justiça, nem
caridade, os dois pólos donde irradia a paz social que só existe a começar pelo
usufruto da justiça plena, como há muitos séculos o sustentou Isaías ao
preconizar uma era verdadeiramente feliz pela transformação da sociedade de
Israel, dizendo: Efeito da justiça será a
paz e obra do direito uma tranquilidade e segurança para sempre. (9)
Ao pensar naquele patrão impiedoso, lembrou-se o
pródigo de uma verdade: o mal não estava naquilo que ele possuía mas naquilo de
que ele abusava, sem respeito por Deus nem pelo próximo, donde a lembrança do
pai passou a agigantar-se, porque lá, os empregados tinham pão em abundância e
ele estava aos poucos a morrer de fome.
Neste passo, chegamos ao cerne da parábola.
É o Coração de Cristo que chega ao nosso
entendimento através do problema criado pelo esbanjador, não se devendo deixar
cair nenhuma das lições, nem qualquer pormenor.
Entrou este em profunda reflexão.
Lembrou-se de tudo. Da forma altiva como pediu -
ferindo o coração do pai - a parte da herança que lhe cabia e como em
estroinices e com costumes devassos se arruinou.
Foi, então,
que aquele coração de pedra tornado um ingrato e coberto de vergonha se encheu
de uma formidável coragem evangélica e tendo entrado dentro de si mesmo onde
uma luz escreveu em letras redondas bem dentro da sua alma o ensinamento divino:
pedi e recebereis, pensou em
regressar a casa.
Sem andar um metro que fosse, deu um passo de
gigante.
Jesus aponta deste modo o caminho da regeneração,
sendo necessário e absolutamente indispensável o arrependimento.
Até ali o pródigo era um vulcão incandescente a
soltar pelos monte abaixo do desnorte as lavas do pecado de uma falsa
felicidade, para naquele momento, tudo se conjugar para o voltar do avesso e
fazer regressar para dentro de si, aquietado e calmo o vulcão em que
transformara a sua vida.
Lá longe, o pobre pai consumia-se em orações,
pedindo a Deus por aquele filho, do qual dizia muitas vezes: ele é bom e há-de voltar quando vir o mal
que fez. Ele há-de considerar em todos os bens que perdeu.
Este pai é Deus.
Ele espera sempre pelos filhos pródigos que O
abandonaram.
E aqui, cabe por inteiro a lamentação de Jesus sobre
Jerusalém, que lhe foi tão ingrata ao ponto de O abandonar: Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas
e apedrejas os que te são enviados! Quantas vezes quis ajuntar os teus filhos,
como a galinha ajunta os pintainhos debaixo das asas, mas deixando ficar
expressa a esperança, de um dia, convertida, disser: Bendito o que vem em nome
do Senhor! (10)
Era daquele jeito a esperança do pai do pródigo. Ele é bom e há-de voltar quando vir o mal
que fez. Ele há-de considerar em todos os bens que perdeu.
E ele considerava e via tudo à distância.
Meu pai vai receber-me.
E pôs-se a caminho, num certo dia, levando no
alforge das suas inquietações duas determinações: a primeira, a de pedir perdão
e a segunda, pelo facto, de já não poder fazer parte do resto da fortuna da
casa de seu pai, aceitar de bom grado qualquer lugar que este lhe destinasse,
donde não excluía o lugar de criado.
Levantar-me-ei
e irei ter com meu pai e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o Céu e contra ti, já
não sou digno de ser chamado teu filho, trata-me como um dos teus jornaleiros.
Que bela é esta oração!
Jesus quer mostrar, ao falar deste modo, qual a
atitude que deve ser tomada pelo arrependido no acto da sua conversão, que se não
existe sem a graça de Deus, existe sempre n’Ele a graça de a oferecer a todo o
homem transviado.
Chega, finalmente, o pródigo aos subúrbios da
aldeia.
Relata o texto que o pai o viu ainda longe e se
encheu de compaixão.
Percebeu de imediato que aquele filho desencaminhado
voltava para se retratar e pedir perdão para as suas faltas, perdão que nunca
lhe seria negado, porque era pai e sabia
que para a sua crença era péssima a morte do pecador. Abriu-lhe os braços e nem
ouviu o filho quando ele disse: já não
sou digno de ser chamado teu filho.
Jesus mostra o Coração de Deus: grande e
misericordioso para com todos os homens sinceramente arrependidos.
Há nas atitudes do filho e do pai duas orações
distintas: no filho a de arrependimento e na do pai, de perdão infinito, como
traduções fiéis do que deve ser a oração: a elevação do espírito e do coração a
Deus com o intuito de O glorificar e lhe pedir ou agradecer.
Pedi e
recebereis, era a oração do filho.
Graças vos
dou, Senhor, porque este filho estava perdido e voltou, era a oração
daquele pai que todos os dias olhava o horizonte na esperança de ver o filho em
qualquer vulto que aparecesse ao longe.
Quando tal aconteceu, aquele pai extravasando
alegria manda matar um novilho e preparou tudo para dar uma festa.
Diz o texto que o filho mais velho estava no campo
entregue às tarefas da lavoura e que ao chegar a casa deparando com a alegria
própria do banquete que estava em marcha, chamou um dos servos a quem perguntou
o significado de tanta azáfama: o teu
irmão voltou e teu pai matou o vitelo gordo, porque chegou são e salvo, foi
a resposta a que não faltou o pormenor de ter sido morto um vitelo gordo, logo
um dos melhores das manada.
Cheio de cólera deu sinais de não querer entrar em
casa, o que obrigou o pobre pai a vir fora e pedir-lhe que mudasse de ideias.
Esta impertinência foi a nota discordante daquela
festa, onde o pai queria por o sentido da comunhão, com o aumento da caridade
para com Deus e com o próximo, com a alegria de estar de volta um convertido ao
lar paterno.
Jesus, bem sabia como era preciso inculcar nas
pessoas a caridade onde o Reino de Deus estivesse presente em todo o seu
esplendor, como sendo ela a maior de todas as virtudes e, logo, havia de ter
encontrado no outro dos seus filhos - que não perdoara ao irmão - tamanha
teimosia em aceitar de bom grado o seu regresso.
Jesus apostara num mandamento novo que mandava amar
antes de sermos amados, querendo, por isso, emendar os antigos que haviam
corrompido a lei primitiva e, ao invés, amavam os amigos odiando os inimigos,
grupo de pessoas onde estava o irmão que saíra de casa, pela forma como
respondeu ao pai: Há já tantos anos que
te sirvo sem nunca transgredir uma ordem tua e nunca deste um cabrito para me
alegrar com os meus amigos.
Para ele o irmão era um inimigo.
Havia consumido a fortuna com meretrizes.
Não merecia aquela festa e, logo, com a matança do
vitelo mais gordo.
Filho - disse-lhe o pai - tu sempre estás comigo e o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma
festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e reviveu; estava
perdido e encontrou-se.
Esta é a caridade perfeita, feita de amor imaculado
e que põe Deus a morar dentro do homem e que S. João haveria de registar: Amemo-nos mutuamente, porque o amor vem de
Deus e todo aquele que ama é gerado por Deus e conhece a Deus. (11)
A parábola do filho pródigo é o mais perfeito
exemplo da caridade cristã. Nela fica exposta a grande revolução operada por
Jesus, que desde então queria mudar o sentimento do amor em relação ao próximo,
sobretudo quando ele se arrepende de atitudes impensadas, devendo merecer pelo
seu acto nobre, todo o amor, como aconteceu com o pai da parábola: tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos,
porque este teu irmão estava morto e reviveu; estava perdido e encontrou-se.
Aquele pai queria acabar com o motivo da discórdia: a mim não me deste e a ele, que tudo
esbanjou, deste-lhe mais. Aquele pai percebeu desde logo a inveja do filho
mais velho e o ciúme que lhe corrompia a
alma e tudo fez para ele perceber a razão da festa.
Deus é o Pai da parábola.
Vem, solícito fora de casa rogar ao filho falho de
caridade, que entre para dentro de casa a fim de tomar parte no banquete
prestes a começar.
Jesus responde com esta benevolência a todos os
fariseus que não viam bem o facto d’Ele entrar e comer em casa de pecadores,
fazendo-lhe sentir que todos os homens eram seus irmãos, sendo absolutamente
necessário que o filho mais velho que não encontrou modos de se regozijar com a
alegria do pai tomasse o seu lugar à mesa.
Todos somos chamados a tomar o nosso lugar na festa
de Família para onde o Pai nos chama, sem excepção de nenhum, mas desejando que
todos sejam convivas do mesmo banquete.
A mesa está posta.
Às críticas do filho melindrado, pode dizer aquele
pai extremoso, com modos brandos e apaziguadores: Filho, tu está sempre comigo (...) uma frase lapidar que nos deixa
perceber o quanto havia de grandeza na sua alma daquele pai.
E todos os dias, como acontecia com este pai da
parábola, Deus olha os horizontes, na esperança de ver chegar de longe ou perto
todos aqueles que se perderam por caminhos estreitos, como aconteceu com o
pródigo, filho amado da sua grande misericórdia.
(1) - Col 1, 15-17
(2) - Ecl 7, 20
(3) - Mc 13, 31
(4) - Mt 13, 43
(5) - Dn 12, 3
(6)) - Tg 1, 5-6
(7) - Sl
69, 6
(8) - 1 Jo 1 5-10
(9) - Is 32, 17
(10) - Mt 23, 37
(11) - 1 Jo, 4, 7
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