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terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Os dois Invernos: o do homem e o da Natureza

Inverno na Serra da Estrela
Gravura da Revista "Occidente" de 1 de Abril de 1878

Deus ao fazer o Inverno da Natureza quis que o homem ao ter mais tempo para entrar dentro de si, fizesse o mesmo para com Ele, vendo-O impresso, nas árvores despidas e no gelo dos montes, e dando-lhe tempo para pensar - especialmente, os que vivem a estação da velhice - neste belo conceito muito antigo, mas sempre novo, como se viesse até hoje coma mesma força que o inspirou:

Para o ignorante, a velhice é o inverno; 
para o instruído é a estação da colheita.
  
Este pensamento ou sentença, deve-se a um movimento surgido no judaísmo no tempo do rei Antíoco IV,  II séculos a.C. - quando o hassidismo  - subalternizando a Torá, passou a dar importância a um tipo de oração inspirada no ensino directo de histórias simples e pequenas, mas profundas de que é um exemplo a pequena frase cheia de sentido humano que serve de guia a este apontamento e que, ao ter como motivo lúdico a paisagem nevada da Serra da Estrela, a velha frase do "hassid" se casa com ela.
  • Porque será que a velhice, a data do inverno do homem, para os ignorantes - se torna a estação da colheita, para o homem instruído?
A resposta, podemos encontrá-la no poema CAIS de Fernando Namora, onde, como ele diz, tudo é ténue, a começar pelo cais onde aportou o Inverno frio, mas se é nele que nos diluímos, por nos obrigar a pensar mais em nós nesta estação da aparente paragem da Natureza, ela - faz-nos exactos por dentro - e, assim, vamos beber a sabedoria do hassidismo, pois é nesse estádio da vida que o homem faz, se estiver atento - a estação da colheita - na preparação da alma para o encontro com Deus.

 Cais

 Ténue é o cais
 no Inverno frio.
 Ténue é o voo
 do pássaro cinzento.
 Ténue é o sono
 que adormece o navio.
 No vago cais
 do balouço da bruma
 ténue é a estrela
 que um peixe morde.
 Ténue é o porto
 nos olhos do casario.
 Mas o que em fora nos dilui
 faz-nos exactos por dentro.

Fernando Namora, in 'Marketing'

Ténue é o cais / no Inverno frio... diz Fernando Namora mas é dessa paisagem fria, casada com a sua velhice, que o homem, pela força dos anos ao abrigar-se mais no inverno dos seus dias, encontra no Inverno estacional do calendário, como a gravura sugere, mais um motivo para diluir o seu pensamento na paisagem fria do casario e dos montes para aplanar o seu encontro consigo e com Deus, que o chama para o encontro final, onde o ser exacto por dentro, é condição essencial para chegar, ténue, embora, ao CAIS da vida, de onde todos, um dia havemos de partir! 

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