Jamais algum ser humano explicará, porque nunca o compreenderá - o grande Mistério do Acto Criador do do Universo, onde o homem assume pela sua importância vital a obra-prima de Deus - e isto acontece, porque o Acto da Criação não é uma equação científica onde o erro se explica, mas uma realidade em que os termos resultam sempre num resultado certo, mas cuja certeza por não ter explicação humana, o homem, na finitude das suas capacidades nunca há-de encontrar maneira de ver tal acerto.
Diremos, pois, que estamos perante um insondável Mistério.
Sabemos, efectivamente, muito pouco, mas o pouco que sabemos o que nos diz é que no Princípio quando Deus criou os céus e a terra, a terra
era informe e vazia, as trevas cobriam o abismo e o espírito de Deus movia-se
sobre a superfície das águas, e que este Alto Espírito ao ver-se envolto numa imensa escuridão criou a luz e ao ver como ela era boa separou-a da escuridão e a esta chamou "noite" e à luz deu-lhe o nome de "dia".
E a Obra continuou até se unir o Criador à criatura, havendo-se escrito nisto o primeiro Poema das Origens, trazendo com ele o grande Mistério e para o qual o homem na procura que faz de Deus, ora se afasta - como aconteceu com Miguel Torga - ora se une a Ele, na tentativa de O entender - como aconteceu com Johanh von Goethe - que com o seu poema "Proémio" fez honestamente essa tentativa de que resultou este profundo acto de amor ao Pai da Criação:
Proémio
Em nome daquele que a Si mesmo
se criou!
De toda eternidade em ofício criador;
Em nome daquele que toda a fé formou,
Confiança, actividade, amor, vigor;
Em nome daquele que, tantas vezes nomeado,
Ficou sempre em essência imperscrutado:
Até onde o ouvido e o olhar alcançam,
A Ele se assemelha tudo o que conheces,
E ao mais alto e ardente voo do teu 'spírito
Já basta esta parábola, esta imagem;
Sentes-te atraído, arrastado alegremente,
E, onde quer que vás, tudo se enfeita em flor;
Já nada contas, nem calculas já o tempo,
E cada passo teu é já imensidade.
Que Deus seria esse então que só de fora
impelisse,
E o mundo preso ao dedo em volta conduzisse!
Que Ele, dentro do mundo, faça o mundo
mover-se,
Manter Natureza em Si, e em Natureza
manter-Se,
De modo que ao que nele viva e teça e exista
A Sua força e o Seu génio assista.
Dentro de nós há também um Universo;
Daqui nasceu nos povos o louvável costume
De cada qual chamar Deus, mesmo o seu Deus,
A tudo aquilo que ele de melhor em si conhece,
Deixar à Sua guarda céu e terra.
Ter-Lhe temor, e talvez mesmo — amor.
in "Últimos Poemas do
Amor, de Deus e do Mundo"
Leio este poema de Goethe e se nele me revejo por ver na sua escrita um sinal de encontro e de aceitação do Mistério, de modo algum satirizo a procura de Deus que não deu certezas a Miguel Torga, porquanto Deus não é um problema de Matemática, mas é-o e com toda a profundidade, um problema humano, onde até aos confins dos tempos a figura do homem prefigurada em Jacob na luta que travou com o Anjo - tendo-se na devida conta a cena bíblica - este Anjo, que é Deus, ao deixar-se vencer nada perdeu de Si mesmo.
Deus é assim.
Deixa-se perder, mas é um ganhador, pois só aparentemente é que perde a batalha que trava com o homem e este, julgando-se vencedor é um vencido - mas por amor a Deus que o venceu - razão que O leva a andar por aí a "desafiar " amorosamente todos os Jacob's, que Ele sabe, são filhos dilectos da sua Obra da Criação.
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