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segunda-feira, 11 de maio de 2015

Catolicismo e Capitalismo






Amintore Fanfani (1908-1999) foi um político e ex-Primeiro-Ministro da Itália. Muito conhecido após a II Guerra Mundial, militou na ala mais à esquerda da Democracia Cristã. Economista de formação, licenciado na Universidade Católica de Milão, viu no corporativismo da época um meio para o Estado ideal, tendo escrito obras de relevo sobre a História Económica, onde o capitalismo não podia coexistir sem ser confrontado com a doutrina cristã, que o levou a mostrar o abismo que separava  o ideal católico da conduta dos agentes da economia capitalista.

Este livro "Capitalismo, Catolicismo e Protestantismo" nasce, precisamente, com a sua publicação em 1935 para atingir o capitalismo sem rosto que visava o lucro máximo sem se importar com a natureza social que deve imperar no homem, para que a riqueza por ele adquirida não se concretize numa distorção da dignidade que devia imperar no tecido social, quando sem qualquer pejo faz do assalariado - ou não - uma peça da máquina gigante da sua ganância de atropelo ao ideal católico, centrado na dignidade da pessoa.

No Capítulo "Catolicismo e Capitalismo" (pág. 102) o autor depois de declarar que a riqueza pode afogar a palavra - citando S. Mateus 6, 19 e 13, 22 - fá-lo bem a propósito porque tal doutrina faz parte do Novo Testamento e sobre ela se hão debruçado Doutores e Teólogos de todos os tempos.

Neste passo Amintore Fanfani, escreve assim: 

A doutrina católica sobre a aquisição de riqueza pode resumir-se do modo seguinte: O homem tem necessidades, sensações de carência que tem de satisfazer e, se os bens temporais são idóneos para tal, é obrigatório e legítimo procurar adquiri-los, ainda que essa aquisição deva submeter-se a regras, realizar-se por meios legítimos e não exceder as necessidades. Esta duas regras limitam respectivamente a escolha e o uso dos meios que servem para adquirir a riqueza. Se não respeitarem tais limites, se se esquecerem as regras da justiça, da honestidade, da temperança, e se subverte a ordem divina, que concedeu os bens para as necessidades de todos e não para a cupidez de alguns, arriscando-se, presos pelas preocupações e bens, a esquecer o Criador, ofende-se a Deus.

Merece a pena ler este livro, porquanto ele é, pela sua clareza, profundidade e verdade como o autor põe o problema da avareza e da soberba dos que, passando por cima de regras milenares, agem contra o século que as produziu, fazendo dele tábua rasa para sobre ele erguerem a bandeira do século que em que vivem - que é o nosso - onde o capitalismo impõe a sua lei, sem cuidar dos mais fracos, ou seja, dos que, por um motivo qualquer, económico ou político, se vêem necessitados sem terem para sobreviver senão a submissão indigna de se humilharem perante a força de um capital desumano.

Vale, por isso, e porque o autor não deixa de se valer do papel da Igreja, de chamar à colação a Carta Encíclica "Laborem Exercens" de S. João Paulo II, "sobre o trabalho humano", publicada na comemoração do 90º aniversário da Encíclica "Rerum Novarum" de Leão XIII, onde a dimensão actual da ascendência desenfreada do capital sobre o assalariado ou mesmo, sobre a mão de obra sujeita a contrato - ver nº III - O CONFLITO ENTRE TRABALHO E CAPITAL NA FASE ACTUAL DA HISTÓRIA -  parece nada ter aprendido do ponto de vista humano e social com a estrutura basilar do ensino da Igreja que embora seja muito anterior ao célebre documento de Leão XIII - por brotar da sua origem institucional - levou aquele Papa a repor com mais acuidade a Igreja no campo social, mas sem que tal facto tenha evitado que o capitalismo selvagem, despudoradamente, tenha continuado a sua deriva em defesa das suas prerrogativas anti-sociais, pelo que o texto da "Laborem Exercens" (publicada em 1981) num dado ponto deste capítulo, tendo em conta o ano da publicação da "Rerum Novarum" (1891), fale deste jeito:

(...) É sabido que, durante todo este período, o qual aliás ainda não terminou, o problema do trabalho foi sendo posto no clima do grande conflito que, na época do desenvolvimento industrial e em ligação com ele, se manifestou entre o « mundo do capital » e o « mundo do trabalho »; ou seja, entre o grupo restrito, mas muito influente, dos patrões e empresários, dos proprietários ou detentores dos meios de produção, e a multidão mais numerosa da gente que se achava privada de tais meios e que participava no processo de produção, mas isso exclusivamente mediante o seu trabalho. Tal conflito foi originado pelo facto de que os operários punham as suas forças à disposição do grupo dos patrões e empresários, e de que este, guiado pelo princípio do maior lucro da produção, procurava manter o mais baixo possível o salário para o trabalho executado pelos operários. A isto há que juntar ainda outros elementos de exploração, ligados com a falta de segurança no trabalho e também com a ausência de garantias quanto às condições de saúde e de vida dos mesmos operários e das suas famílias.(...)

Em 1935, como já se disse, Amintore Fanfani, já punha a claro o problema que se veio a agudizar e onde o capitalismo despótico sem atender às regras cristãs impunha a sua lei, que parece, continuar a fazer, com a agravante de actualmente o fazer à escala global enfeudado em Associações Internacionais sem rosto, como convém, porquanto, o grande capital - embora sem rosto - não deixa de fixar os "seus olhos" em tudo o que é economicamente mais rentável, prescindindo dos dons sobrenaturais e religiosos.

Fazer esta denúncia não é um acto irresponsável - penso eu - embora tenha noção de vir a ser um acto perdido que, apesar de tudo, põe a minha consciência de bem comigo.
E isso é o que a actual  "Doutrina Social da Igreja" me impõe que faça.

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