O MEU CONDADO
No campo azul da alada fantasia
Edifiquei outrora, por meu mal,
Castelos de oiro, esmalte e
pedraria,
Torres de lápis-lázuli e coral.
N´uma extensão de léguas, não
havia
Quem possuísse outro domínio
igual:
Tão belo, assim tão belo, parecia
O território de um senhor
feudal...
Um dia (não sei quando, nem dei
d´onde),
Um vento agreste de indiferença e "spleen"
Lançou por terra, ao pó que tudo
esconde,
O meu condado — o meu condado,
sim!
Porque eu já fui um poderoso
conde,
Naquela idade em que se é conde
assim...
Sempre que leio - e quantas vezes o tenho feito! - este soneto do poeta António Nobre, cuja vida foi um ar que passou, fico a pensar na elegia que o compõe palavra a palavra, que mais não são que o relicário profano onde ele guardou a sua vida, na idade em que se é conde assim, ou seja, quando a mocidade almeja condados de extensão de léguas e que se desejam percorrer no fulgor dos sonhos que a todos é concedido ter.
António Nobre foi um plebeu, todos o sabemos, mas foi um "conde" a que a curta vida retirou a possibilidade de ser "rei", mas não é por este facto que no aspecto literário da sua poesia triste, não tivesse merecido os dois títulos: o de "conde" porque o desejou ser e disso nos fala neste soneto e o de "rei", porque em muitas composições fez reinar a sua palavra nas certezas que nos deixou da sua vida breve, aqui e ali plasmada com a agudeza de quem sabia que tinha de ser assim cumprida.
"O Meu Condado" é disso um retrato, pois ele diz a fechar o soneto:
Um dia (não sei quando, nem dei d´onde),
Um vento agreste de indiferença e "spleen"
Lançou por terra, ao pó que tudo esconde,
O meu condado — o meu condado, sim!
Porque eu já fui um poderoso conde,
Naquela idade em que se é conde assim...
- A quantas vidas isto não tem acontecido?
- Quantos "Condados" a vida tem derrubado, mas sem ter dado aos que os perderam o modo de o poder ter dito com a expressão que António Nobre lhe pode dar?
Eis, porque, a Poesia está de parabéns por este "Condado" que suscitou na alma de António Nobre, e fez que ele ficasse na Literatura Portuguesa como um momento daquela verdade que faz do poeta um cultor de sentimentos alegres ou tristes.
Sem comentários:
Enviar um comentário