O
sentido social da expressão: espírito de sacrifício
Vem a propósito recordar a todos, grandes e
pequenos, que o sentido cristão da vida
impõe espírito de sobriedade e
sacrifício. Infelizmente, prevalecem hoje bastante a mentalidade e a
tendência hedonistas, que pretendem
reduzir a vida à busca do prazer e à satisfação completa de todas as paixões,
com grave prejuízo para o espírito e até para o corpo. No plano natural é
sabedoria e fonte de bens a moderação e o domínio dos apetites inferiores. E no
plano sobrenatural, o Evangelho, a Igreja e toda a sua tradição ascética exigem
o espírito de mortificação e penitência,
que assegura o domínio sobre a carne e oferece um meio efïcaz de expiar a pena
devida pelo pecado, do qual ninguém é livre senão Jesus e a sua
Mãe Imaculada.
in, nºs 233 e 234 Carta Encíclica “Mater et Magistra” de Sua
Santidade João XXII - . Nota: os sublinhados são nossos.
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Uma das muitas e brilhantes cogitações do
Padre António Vieira reza assim: Há
homens que são como as velas; sacrificam-se, queimando-se para dar luz aos outros,
afirmação que encaminha o nosso pensamento para Jesus Cristo, porque ao dar
aos homens a verdadeiro sentido da suas vidas
permitiu que o tratassem como se não fosse um homem (cf.Sl 21, 7),
sacrificando-se no Altar do Gólgota para dar Luz ao mundo, porquanto, todos os
sacrifícios antes do d’Ele foram ineficazes na reconciliação do homem com Deus
e só a partir d’Ele a Luz de Deus, efectivamente, chegou a toda a Humanidade.
E isto, foi assim,
porque embora os sacrifícios a. C., lembrassem aos homens as suas iniquidades e
tivessem despertado neles sentimentos de arrependimento, estes por si mesmos
não se podiam purificar dos seus pecados, algo que só passou a acontecer com a
expiação de Jesus Cristo acrescentada com o seu valor infinito, porque trazia
de Deus a filiação e o poder de os perdoar, por forma a que a Luz da sua
divindade desse a todos os homens o sentido cristão para onde deviam tender
todos os passos e, desse modo, dando-lhes o espírito de sobriedade e sacrifício de que nos fala João XXIII.
Se atentarmos que a
sobriedade é a temperança que tem de estar actuante nos modos e nas acções,
isto torna o sacrifício como uma oferta feita a Deus, apresentando-o como algo
de valor que lhe é entregue, dando-lhe o sentido da pobre viúva, que deitou na
caixa do Templo os últimos ceitis que possuía (Mc 12, 43), fazendo no modo e na
acção um sacrifício que ia inteiro, não só na dádiva, como na renúncia que ela
implicava, o que nos conduz e bem perto de nós a Saint-Exupéry, que ao falar do
sacrifício, afirma que (...) Ele é uma
oferta de nós próprios ao Ser a que recorremos.
Infelizmente, diz o texto que nos serve de fonte, na
sociedade frívola que faz do prazer um objecto de vida, este é reprovado por
contrariar - impedindo, até - a assunção da atitude sábia que devia estar
presente, e não estando, acarreta grave
prejuízo para o espírito e até para o corpo, pela imoderação assumida de
actos que não dignificam no homem a ambivalência que o torna, por vontade do
Criador, não apenas matéria, mas também, espírito, sobre o qual Henry Miller
(in "O Mundo do Sexo") nos diz: (…) aos olhos de Deus, tudo é divino. E quando digo tudo, é mesmo tudo o
que quero dizer. Quando olhamos as coisas a tal luz, a palavra «transmutação» adquire
um sentido ainda maior: pressupõe que o nosso bem-estar depende do nosso
entendimento espiritual, do modo como nos servimos da visão divina que
possuímos.
Eis, porque, tem de
ser na troca do hedonismo em que o homem se vê a si mesmo enquanto matéria para
se consumir na fornalha dos prazeres do mundo e, na aceitação da sua vida
centrada no espírito das palavras “ Tudo
posso naquele que me fortalece” (Fil 4, 13), que tem de haver o encontro
com a parte divina que lhe foi dada e com a qual é capaz de realizar todas as
obras, ainda que estas exijam mortificação
e penitência, por ser assim que vencemos o pecado de que apenas estão
livres Jesus e a sua Mãe Imaculada.
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