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sexta-feira, 10 de abril de 2015

Um célebre guindaste marítimo!




Cábrea "António Augusto de Aguiar" a sair da Rocha do Conde de Óbidos
in, "Restos de Colecção" 

(nota: foto parcial do original com o fim de fazer sobressair o colosso mecânico de tão belo e poderoso engenho da engenharia mecânica naval)



A cábrea António Augusto de Aguiar foi um guindaste marítimo imponente.

Recordo-me bem desta enorme barcaça mecânica que não tinha autonomia própria, necessitando de ser deslocada por um ou dois potentes rebocadores.
Era, então, um adolescente - 13/14 anos - e recordo-me de a ver participar com o seu porte colossal no auxílio da construção dos "perrés" que iam da Doca dos Olivais até ao Poço dos Bispo ou na construção das próprias docas, que a minha curiosidade de adolescente viu nascer, a que acresceu o facto da minha moradia se situar nos Olivais, o que me permitiu levar até ali os meus passos e a curiosidade da minha mente.

Sei que esta máquina impressionante - que tanto me entusiasmou - colaborou em toda a grande obra que é hoje o Porto de Lisboa, no que concerne aos restantes "perrés" e docas.

As obras a que tive a felicidade de assistir na minha qualidade de mirone de acordo com as respostas que deram à minha curiosidade, tratava-se, fundamentalmente, de fundar no leito do Rio Tejo as bases para as fundações dos "perrés" - as muralhas que hoje podemos ver - o que acontecia após o saneamento dos lodos que eram removidos através de dragas cujos baldes rotativos - como fossem noras gigantes - iam ao fundo do leito do rio para depois despejar os detritos em batelões de caixa em forma de "V" - que no momento exacto se faziam ao largo devidamente rebocados - para lançar a carga lodosa nas águas profundas, aberto por meios mecânicos o "V" da caixa metálica.

Quando a draga não era utilizável pela condições locais com o fim de sanear os fundos do rio eram utilizados caixões de ar comprimido de estrutura de betão com o topo acima da água, permitindo através duma câmara cilindrica o acessos dos trabalhadores ao fundo de onde a água era expelida pela introdução de ar a uma pressão que igualava a da água exterior o que permitia a execução dos trabalhos de escavação dos lodos nesta câmara pressurizada, sendo as matérias escavadas transportados para a superfície e depois removidas.

Recordo-me de ouvir dizer, que devido à pressão a que os trabalhadores estavam sujeitos este trabalho duríssimo obrigava à substituição dos turnos de duas em duas horas.

O papel da cábrea António Augusto de Aguiar consistia após o saneamento necessário à garantia das fundações, em pegar, suspensos da sua potente lança mecânica de giro em arco, os blocos de cimento rectangulares que eram fabricados em estaleiro bem perto da margem do rio, e que eram lançados na directriz dos "perrés", com o auxílio de mergulhadores que os conduziam ao lugar certo e em cujas cavidades laterais - quatro por bloco, que na união com o bloco adjacente formavam quadrados - onde eram lançados sacos de serapilheira cheios de cimento pozolânico, pelos mergulhadores. com a finalidade de os ligarem e manterem unidos, através da reacção com a água das pozolanas, formando silicatos de cálcio estáveis e de grande capacidade ligante.

Sobre o enrocamento irregular de pedra tosca submersa, nasceu, como hoje se pode ver toda a muralha (perrés) do Porto de Lisboa, em pedra aparelhada que os pedreiros cortavam, no local, com geometria pentagonal ou hexagonal, que são um hino ao trabalho esforçado daqueles valorosos  e artísticos canteiros que ali trabalhavam em condições de equilíbrio tal, que muitas vezes os vi amarrados pela cintura a um poste seguro na margem.

Tive a graça de ter assistido a isto e de muito perto, mercê de ser de família de dois Encarregados Gerais da Empresa que adjudicara aquelas obras, tendo na retina e para sempre a imagem daquele poderoso guindaste marítimo que não estando em acção mantinha o quadrado metálico da sua enorme estrutura a um nível constante acima da linha de água, o que não acontecia com a proa - que se inclinava quase até à linha de água -  quando a lança levava suspensos os grandes blocos de cimento até os largar no sítio indicado pela equipa de mergulhadores.

Largado o peso e enrolados os poderosos cabos de aço no cabrestante, ao voltar à posição normal deixava em redor as ondas que vinham morrer nas margens num marulhar que ainda hoje, parece ressoar nos meus ouvidos, como a imagem ainda se não perdeu de todo na minha retina.
Como isto se faz presente na minha lembrança!
Como isto é uma memória feliz de um tempo que lá vai e me fazia correr - nos tempos livres do estudo - para a beira do rio Tejo, onde tanto aprendi, sobretudo a ter respeito pelo trabalho dos homens que ergueram tão bela obra.


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