Páscoa
sentir no corpo a Ressurreição
Um dia de poemas na lembrança
(Também meus)
Que o passado inspirou.
A natureza inteira a florir
No mais prosaico verso.
Foguetes e folares,
Sino a repicar,
E a carícia lasciva e paternal
Do sol progenitor
Da primavera.
Ah, quem pudera
Ser de novo
Um dos felizes
Desta aleluia!
Sentir no corpo a ressurreição.
O coração
Milagre do milagre da energia,
A irradiar saúde e alegria
Em cada pulsação.
Miguel Torga
in, Diário XVI
Comove-me este poema do grande Poeta transmontano!
E esta comoção muito minha vai buscar dentro de mim o que sei da relação difícil em que se tornou, um dia, a aceitação de Deus por MIguel Torga, que o trazia bem perto do coração mas fugidio na perguntas que fazia à sua razão.
Comove-me este desabafo que muito longe de ser feito num mero enquadramento poético, é um grito de alma sentido e profundamente memorial de um tempo vivido com o influxo religioso que recebera no berço:
Ah, quem pudera
Ser de novo
Um dos felizes
Desta aleluia!
E comove-me, porque neste pequeno trecho desta sentida Poesia da Páscoa da Ressurreição, o que sentimos viver é o menino de São Martinho de Anta - a sua terra natal - e, onde, fora feliz ao crer na Ressurreição de Jesus, para depois, quando se viu batido pelos ventos agrestes dos tempo que vieram, ter posto dúvidas à velha crença dos seus maiores.
Houve, efectivamente um problema religiosos que Miguel Torga nunca resolveu, que não fosse à sua maneira desempoeirada e franca como foi toda a sua vida de Médico e Poeta, basta que leiamos esta prosa:
Houve, efectivamente um problema religiosos que Miguel Torga nunca resolveu, que não fosse à sua maneira desempoeirada e franca como foi toda a sua vida de Médico e Poeta, basta que leiamos esta prosa:
Enquanto o meu corpo e o meu espírito puderem esbracejar,
nunca farei o jogo sujo de erguer as mãos por cálculo diante de nenhum altar.
Mas dado que sim, que exista um Deus cioso que a minha miopia me não deixa ver
claramente, quero crer que é esta mesma atitude de rebeldia que espera de mim.
Tragicamente postas num pé de dúvida irremediável, as nossas relações teriam de
ser, e foram sempre, difíceis mas viris. De potestade a potestade. A
omnipotência divina enfrentada pela inconformação humana”
(in, Diário, Lisboa,
Hospital de S. Luís, 22 de Junho de 1972
Que o Senhor Jesus tenha aquele que lhe fez tão bela poesia no seu regaço!
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