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terça-feira, 14 de novembro de 2017

"O Convertido" - Um soneto de Antero de Quental


Medalha comemorativa do centenário 
do falecimento de Antero de Quental
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      O Convertido

                                                              A Gonçalves Crespo

                                                        
Entre os filhos dum século maldito
Tomei também lugar na ímpia mesa,
Onde, sob o folgar, geme a tristeza
Duma ânsia impotente de infinito.

Como os outros, cuspi no altar avito
Um rir feito de fel e de impureza
Mas um dia abalou-se-me a firmeza,
Deu-me um rebate o coração contrito!

Erma, cheia de tédio e de quebranto,
Rompendo os diques ao represo pranto,
Virou-se para Deus minha alma triste!

Amortalhei na Fé o pensamento,
E achei a paz na inércia e esquecimento
Só me falta saber se Deus existe!

1861
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Não sei por quantas vezes já li e meditei sobre este soneto de Antero de Quental e não sei já, por quantas vezes dei comigo a interrogar-me - sabendo o que é dado saber a todo aquele que se tem debruçado sobre o drama íntimo de Antero, relativamente ao encontro que ele travou na aceitação de um Deus em cuja essência divina foi criada a sua infância - se, neste soneto a que ele chamou: O CONVERTIDO, existe, plena e esplendorosa a sua aceitação de um Deus presente no seu caminho, tendo presente o sentido ascético dos 13 versos que antecedem a dúvida do último verso: 

Só me falta saber se Deus existe!

Que a sua conversão é genuína, essa é, quando ele diz com palavras duras mas cheias de arrependimento:
Entre os filhos dum século maldito
Tomei também lugar na ímpia mesa,
Onde, sob o folgar, geme a tristeza
Duma ânsia impotente de infinito.

Foi este infinito que ele procurou sempre, de um modo que embotou, algumas vezes na procura do Nirvana budista que lhe encheu grande parte da vida, mas manda a verdade dizer que Antero de Quental foi um deísta, como todos os que creem na religião natural, objectivando, porém, a Revelação e o sentido - natural - de nela estar implícito o próprio Deus incarnado na Segunda Pessoa da Trindade.

Mas, perpassando toda a sua obra encontramos aqui e ali, e às vezes, profusamente, poemas a Nossa Senhora, Mãe d'Aquele que trouxe aos homens a Revelação de Deus e é. por isso, que sempre que leio este notável testemunho literário de Antero de Quental, inscrito nos 14 versos deste soneto, fico a pensar, que dentro do grande Poeta, muito no fundo da sua alma inquieta e ardente, Deus existia, invisível como é, mas pujante na mente filosófica de Antero de Quental

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