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sábado, 22 de novembro de 2014

"Vós sois o sal da terra"



O Sermão de Santo António aos Peixes - Azulejo do século XVII
in, "Revista Municipal" (Lisboa) - 1º trimestre de 1985




Esta célebre peça oratória do Padre António Vieira data de São Luís do Maranhão (Brasil) em 1654 e tem como fulcro a disputa entre os jesuítas e os colonos, por causa da escravidão a que os índios eram sujeitos.

Trata-se duma alegoria em que o grande jesuíta se dirige aos peixes dado o facto de não ser ouvido pelos homens, que deviam comportar-se como o sal, quanto ao tempero que era preciso haver nas relações humanas, servindo-se da alegoria para louvar os peixes virtuosos e na inversa, repreendendo os que o não eram.

O sermão começa com uma frase retirada do Evangelho de S. Mateus (5, 13): Vós sois o sal da terra ( Vos estis sal terrae), e começa o insigne pregador a perorar sobre o longo sermão do seguinte modo:

Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. 

Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. (...)




Que é isto de ser o sal da terra?

É uma frase atribuída a Jesus e captada por um dos seus evangelistas, precisamente para nos relatar o ensinamento divino entroncado na nossa actuação na vida concreta da sociedade em que estamos inseridos, no sentido de lhes dar sabor, agindo assim como um dever humano.

E das duas uma quando tal não acontece, pois como disse o Padre António Vieira ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar, motivo suficiente que nos leva a admitir que se a terra - que em sentido figurado é entendida como sendo a sociedade no seu todo - se é avessa a deixar-se salgar o que é preciso fazer é que o sal, ou seja a pessoa em si mesma ou as estruturas sociais, precisam de rever a atitude como se estão a comportam para melhorar o conjunto, que em termos gerais é entendido como a necessidade que existe em dar sabor ao modo com se actua, individual ou em grupos devidamente estruturados.

Que belo e profundo é o velho e sempre actual "Sermão de Santo António aos Peixes" de tal ordem que é, no campo das ideias e da observação dos homens, que deveria ser de leitura obrigatória.



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