Na "Conversação Preambular" da autoria de António Feliciano de Castilho, que antecede a explanação poética dos nove cantos do livro D. Jaime sobre este livro de Tomás Ribeiro que tinha então 31 anos, Castilho diz o seguinte:
São as honras tardias como as
drogas que envelheceram na botica: já não curam. Venham frescas e farão milagres;
façam do D. Jaime um poema familiar á mocidade, e reconhecido como bom por quem
tem essa obrigação. (...) e ao tecer sobre o autor e o seu livro o que este merecia da lusitanidade cantada em versos, sentencia: que este luxo da linguagem chamado versos, provém, não de um principio inventado
pelo homem, senão da sua tendência natural para o ritmo. Quando tudo no
universo obedece ao ritmo, como nos havíamos de subtrair nós aos seus encantos?
E o verso uma consociação da musica e da palavra, um feitio particular e
elegante dado á dicção. Por qualquer vaso tosco se pode beber; mas Falerno e agua
pura que seja, sabe melhor por uma bela âmfora etrusca, ou por um vaso
esmerado da Saxónia ou da Vista-Alegre; assim, o pensamento e o afecto por
qualquer prosa se tomam e aproveitam: mas com delicias, com voluptuosidade,
mastigando o sabor, só pela taça das Musas.
O livro D.Jaime causou, efectivamente, uma viva impressão, logo a começar pela sua primeira estrofe que muitas gerações de portugueses declamaram:
D. Jaime é um longo poema e constitui um livro onde se presente um propósito: tornar mais evidentes as rivalidades entre os dois Países ibéricos, tendo o poeta subido alto mercê do texto de Castilho no Prefácio da obra, que a considerou mas útil para o ensino do português, nas Escolas, que os "Lusíadas" - onde houve exagero - algo que não foi aceite de boa mente pelos intelectuais do tempo, tendo sido aliás, embora com outro protagonista, que neste passo começou a germinar a "Questão Coimbrã", um conflito literário entre a escola do Romantismo com a do Realismo.
Apesar desta questão se prender com o "Poema da Mocidade" de Pinheiro Chagas, o livro de Tomás Ribeiro - no estertor final do Romantismo - esteve na baila dos acontecimentos, por força de ter sido apadrinhado por Castilho, tendo merecido o olvido dos novos expoentes da escola Realista que ingloriamente esqueceram que Tomás Ribeiro, no seu livro falava do Portugal nacionalista contra as ideias internacionalistas que já no seu tempo se vinham consolidando.
Este facto não deixou de crescer até hoje e o que dele vai resultar esconde-se num "lugar" qualquer de que um dia daremos conta, mas esta perda contínua de nacionalismo a que estamos a assistir é um fenómeno que não deixa de ser inquietante, pelo que reler o livro D. Jaime, no tempo actual, é tomar uma lufada de um "ar" que existiu e foi puro e, hoje, já o não é, porque qualquer Pátria que não se importa de perder a memória condena-se a ela mesma, levando na hecatombe todos os seus filhos.
Eis, porque, num dado passo, Tomás Ribeiro no poema "O Castelo e a hera", tece um retrato em que imaginação romântica se casa admiravelmente com o amor que Portugal lhe merecia - e nos devia merecer - e, onde o "Castelo" e a "Hera" são apenas figurantes de uma realidade humana em que os mais velhos - como suporte - são representados pelo primeiro e os mais novos - como aqueles que precisam de se agarrar ao suporte - pelo segundo, imbricando-se assim, um no outro, tal como o nosso sentir se deve agarrar a Portugal, sendo este o "Castelo" e cada português a "Hera" que se devia fortalecer à volta dele,
O livro D.Jaime causou, efectivamente, uma viva impressão, logo a começar pela sua primeira estrofe que muitas gerações de portugueses declamaram:
Meu Portugal, meu berço de
inocente,
lisa estrada que andei débil
infante,
variado jardim do adolescente,
meu laranjal em flor sempre
odorante,
minha tarde de amor, meu dia
ardente,
minha noite de estrelas rutilante,
meu vergado pomar dum rico outono,
sê meu berço final no último sono!
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D. Jaime é um longo poema e constitui um livro onde se presente um propósito: tornar mais evidentes as rivalidades entre os dois Países ibéricos, tendo o poeta subido alto mercê do texto de Castilho no Prefácio da obra, que a considerou mas útil para o ensino do português, nas Escolas, que os "Lusíadas" - onde houve exagero - algo que não foi aceite de boa mente pelos intelectuais do tempo, tendo sido aliás, embora com outro protagonista, que neste passo começou a germinar a "Questão Coimbrã", um conflito literário entre a escola do Romantismo com a do Realismo.
Apesar desta questão se prender com o "Poema da Mocidade" de Pinheiro Chagas, o livro de Tomás Ribeiro - no estertor final do Romantismo - esteve na baila dos acontecimentos, por força de ter sido apadrinhado por Castilho, tendo merecido o olvido dos novos expoentes da escola Realista que ingloriamente esqueceram que Tomás Ribeiro, no seu livro falava do Portugal nacionalista contra as ideias internacionalistas que já no seu tempo se vinham consolidando.
Este facto não deixou de crescer até hoje e o que dele vai resultar esconde-se num "lugar" qualquer de que um dia daremos conta, mas esta perda contínua de nacionalismo a que estamos a assistir é um fenómeno que não deixa de ser inquietante, pelo que reler o livro D. Jaime, no tempo actual, é tomar uma lufada de um "ar" que existiu e foi puro e, hoje, já o não é, porque qualquer Pátria que não se importa de perder a memória condena-se a ela mesma, levando na hecatombe todos os seus filhos.
Eis, porque, num dado passo, Tomás Ribeiro no poema "O Castelo e a hera", tece um retrato em que imaginação romântica se casa admiravelmente com o amor que Portugal lhe merecia - e nos devia merecer - e, onde o "Castelo" e a "Hera" são apenas figurantes de uma realidade humana em que os mais velhos - como suporte - são representados pelo primeiro e os mais novos - como aqueles que precisam de se agarrar ao suporte - pelo segundo, imbricando-se assim, um no outro, tal como o nosso sentir se deve agarrar a Portugal, sendo este o "Castelo" e cada português a "Hera" que se devia fortalecer à volta dele,
O Castelo e a Hera
Um dia... quando, não sei,
fui ver as gastas ruínas
d’um velhíssimo castello,
que ao desamparo encontrei,
mas que apesar de esquecido
na solidão era belo.
Achei-o todo vestido
de tenaz hera viçosa;
e ornado de verde brilho,
lembrou-me um velho casquilho
que espera noiva formosa.
Vi-lhe os muros corcovados
sobre o abismo
pendurados,
porém suspensos no ar.
Barbacãs, desamparadas ;
as torres, desconjuntadas;
como folhas desligadas
da flor que se vai finar.
E perguntei : "Que portento,
pedras que balouça o vento
já sem prumo, e sem cimento,
vos têm suspensas no ar?
"
A hera, filha do muro,
foi-se encostando, e cresceu;
a cada cantinho escuro
cada raiz se prendeu;
entre cada fenda estreita
uma vergôntea se ajeita ;
do muro em toda a largura
contorce a activa espessura
gira, enrosca-se e venceu!
E vai recebendo alento,
redobra em viço e vigor,
nem já rajadas do vento
lhe podem causar temor;
seus rebentões melindrosos
já são braços musculosos
que ensaiam força e valor;
e conhecendo seus brios,
aos largos muros adustos
meteram ombros robustos,
ergueram rochas ao ar.
Subiram as barbacãs;
recurvaram as ameias,
ligaram rijo pilar,
com mil adustas cadeias.
E o castelo hospitaleiro
já sem medo ao paroxismo,
viu, vê, verá sobranceiro
as profundezas do abismo;
que a hera robustecida
de lembrada e generosa,
dá vida, a quem lhe deu vida
força, a quem lhe deu vigor.
- São como a hera viçosa
os filhos do nosso amor.
in, D. Jaime (Canto I)
Muita pena que não dá para copiar tão belo poema.
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