Pregões matinais
Passo ás vezes na cama um dia
inteiro
de papo para o ar, como um
madraço ...
fumando qual filósofo ou
palhaço,
- sem mulher ... sem cuidados
... sem dinheiro!
É de manhã então que me é
fagueiro
ouvir trinar no cristalino
espaço
um pregão mais macio que um
regaço,
que se esvai a carpir ... como
um boieiro ...
De manhã é que passa a leiteirinha,
com seu pregão chilrado de
andorinha,
passam varinas de gargantas sãs
..
E ao escutar tais cantantes semifusas,
eu creio que oiço ao longe as
frescas Musas
- a vender uvas e apregoar
maçãs.
Gomes Leal
Mefistófeles em Lisboa
in, Revista "Argus"
Maio de 1907
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Ainda me recordo de alguns pregões de antigamente que, eram costumes de uma certa Lisboa desaparecida.
Tinham eles a graça de encher as ruas e de lhes dar no bulício rotineiro o tom àlacre daquele modo característico como os comerciantes ambulantes anunciavam a mercadoria que traziam para vender, pelo que, neste pormenor citadino, Gomes Leal se parece a Cesário Verde pelo mesmo amor às coisas da Lisboa de então, que são hoje, para os que, ainda as viveram, um grata recordação.
Também eu me recordo da minha leiteirinha - a D. Sara que Deus lá tem - que vinha todas as manhãs a minha casa, numa rua que ainda existe, lá para as bandas dos Olivais, vender o leite ainda morno da ordenha, de uma quinta - que já não existe e onde pastavam vacas - e que ela anunciava com seu pregão chilrado de andorinha, como diz Gomes Leal, para ser o meu primeiro regalo da manhã.
Também eu me recordo da minha leiteirinha - a D. Sara que Deus lá tem - que vinha todas as manhãs a minha casa, numa rua que ainda existe, lá para as bandas dos Olivais, vender o leite ainda morno da ordenha, de uma quinta - que já não existe e onde pastavam vacas - e que ela anunciava com seu pregão chilrado de andorinha, como diz Gomes Leal, para ser o meu primeiro regalo da manhã.
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