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Se não se parte da convicção de que o
Evangelho é um livro biológico, que corresponde às exigências fundamentais do
ser e que, portanto, é de necessidade ontológica; se não se aceita a eterna
escala de valores, com o valor da vida em primeiro lugar; do valor do homem,
que vem ainda antes da própria vida, é inútil cansarmo-nos a procurar respostas
que não existem.
David Maria Turoldo
In, Deus Tem Coração
Levo milhares de
páginas lidas ao longo da vida sobre o Evangelho de Jesus e pela primeira vez
li um autor que chamasse este Livro divino por este nome, impressionando-me pela
forma como apresenta a questão, apontando a necessidade de se partir para a sua
leitura, para além de vir a recolher nele os ensinamentos divinos enquanto
Missão messiânica, o devêssemos entender como um “livro biológico”.
É evidente que
Jesus não inspirou um qualquer tratado de Biologia para ser estudado nas
Escolas, mas antes, uma Mensagem da Boa Nova que Ele trazia para os homens.
Mas ser o seu
Evangelho um “livro biológico” deu-me que pensar, razão, porque, o significado
de “biologia” ganhou todo o sentido: é,
como se sabe, o estudo dos seres vivos
através das características e do comportamento dos organismos.
Debruça-se sobre a
origem de espécies e indivíduos e a forma como estes interagem uns com os
outros e com o seu ambiente e destina-se a estudar a vida nas mais variadas
escalas, das quais, uma só me bastou para entender o pensamento do autor – a etologia – que é como se sabe um dos
ramos da ciência biológica e cujo fim é
estudar o comportamento dos indivíduos, o que bastou a Turoldo para a
denominação que deu ao Evangelho, onde se cumprem por vontade de Jesus acções
comportamentais inseridas na ordem social que tendem chegar às alturas do
divino, uma das condições naturais com que o Criador doou o homem.
Jesus nunca pensou
que vinte séculos depois, alguém se atrevesse a tanto, como o fez Turoldo, mas
a verdade é que ele o faz com todo o sentido quando nos apresenta a “parábola
do samaritano”, que é toda ela, um estudo de Jesus sobre o comportamento de
pessoas reais, que Ele apresentou num quadro dramático, onde imergem – para
além dos salteadores e do hospedeiro – as quatro personagens principais.
Vejamos parte do
texto: (Lc 10, 30-35)
Um homem descia de Jerusalém a Jericó, e caiu nas mãos
de salteadores, os quais o despojaram e espancando-o, se retiraram, deixando-o
meio morto. Casualmente, descia pelo mesmo caminho certo sacerdote; e vendo-o,
passou de largo. De igual modo também um levita chegou àquele lugar, viu-o, e
passou de largo. Mas um samaritano, que ia de viagem, chegou perto dele e,
vendo-o, encheu-se de compaixão; e aproximando-se, atou-lhe as feridas,
deitando nelas azeite e vinho; e pondo-o sobre a sua cavalgadura, levou-o para
uma estalagem e cuidou dele. No dia seguinte tirou dois denários, deu-os ao
hospedeiro e disse-lhe: Cuida dele; e tudo o que gastares a mais, eu to pagarei
quando voltar.
Visto sobre este
prisma, o Evangelho, para além de ser o Livro da Revelação de Jesus aos homens,
é, neste episódio um tratado de biologia no campo etológico.
Obrigado, Jesus,
por teres dado tanta doutrina, a par de tanta ciência aos homens.
Pena é, que eles –
onde eu mesmo me incluo – não entendamos, verdadeiramente, o teu antigo e
eterno Livro à luz das novas ciências, fazendo dele a parte que falta à muita
sabedoria académica, onde está actuante – sem o parecer - a doutrina evangélica
que preside à lei comportamental dos homens entre si mesmos.
Pena é, portanto,
que a sabedoria dos homens – ou, melhor dizendo – a sua vaidade encapotada no
saber do materialismo das sebentas não lhe diga, como afinal, tudo já está
estudado e apresentado, para além do que diz a Academia, daquilo que dia a
linha espiritual, fonte de partida de todos os ensinamentos que estão ligados à
vida do homem.
Por isso, se não
aceitamos o Evangelho, como propõe Turoldo, como algo que corresponde às exigências fundamentais do ser imbricado na
ontologia, enquanto realidade que estuda a existência dos entes e das questões
metafísicas, é inútil cansarmo-nos a
procurar respostas que não existem fora do que está escrito, foi dito ou
explicado por Jesus através de parábolas e dos seus sermões nos tempos em que calcorreou as estradas
poeirentas da Galileia e da Judeia.
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