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quarta-feira, 11 de março de 2015

Auto-Retrato - Um poema de Natália Correia




AUTO-RETRATO    
   

Espáduas brancas palpitantes:
asas no exílio dum corpo.
Os braços calhas cintilantes
para o comboio da alma.
E os olhos emigrantes
no navio da pálpebra
encalhado em renúncia ou cobardia.
Por vezes fêmea . Por vezes monja.
Conforme a noite. Conforme o dia.
Molusco. Esponja
embebida num filtro de magia.
Aranha de ouro
presa na teia dos seus ardis.
E aos pés um coração de louça
quebrado em jogos infantis.


Fica-nos deste "auto-retrato" uma certeza. Natália Correia que todos conhecemos como um lídima representante do inconformismo nacional que se opôs ao Estado Novo era, afinal, um coração de louça/quebrado em jogos infantis, mas foi esse coração que ela retratou a seus pés que a levou a travar as batalhas duríssimas de uma vida em que, tendo sido, como nos diz - fêmea e monja - fizeram dela um ser excepcional onde o mundo secular e o espiritual se fundiram.

Da fêmea ficou o seu amor pela Liberdade, o que a fez revoltar quando viu Portugal em 1974 - saído de uma Ditadura e na iminência de abraçar uma outra liderada pelo Partido Comunista Português, alinhando, politicamente, com as forças que se lhe opunham -  pelo que Natália Correia é um símbolo, onde brilha o "auto-retrato" que nos deixou para podermos lembrar o seu coração de louça, que teve o dom de ser de pedra firme na actividade secular de que encheu a sua vida.

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