Pesquisar neste blogue

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Em memória do Poeta Afonso Lopes Vieira




Faz, hoje, 73 anos que nos deixou o Poeta Afonso Lopes Vieira, esse ilustre leiriense cuja acção sócio-política se centrou no Renascentismo que fez escola entre os séculos XIV a XVII.

O Poeta com um pé assente nesse Movimento cultural, económico e político inspirado na Antiguidade Clássica, viu no Humanismo o seu principal valor centrado na única Verdade irrefutável, aquela que Jesus trouxe ao Mundo, e teve o outro pé assente na Pátria que o viu nascer e na qual viu uma realidade natural que esteve presente em muitas das suas obras poéticas, como se pode perceber neste poema:

O Segredo do Mar

A “Flor do Mar” avançando
Navegava, navegava,
Lá para onde se via
O vulto que ela buscava.

Era tão grande, tão grande
Que a vista toda tapava.

E Bartolomeu erguido
Aos marinheiros bradava
Que ninguém tivesse medo
Do gigante que ali estava.

E mais perto agora estão
Do que procurando vão!

Bartolomeu que viu?
Que descobriu o valente?
- Que o gigante era um penedo
que tinha forma de gente?

Que era dantes o mar? Um quarto escuro
Onde os meninos tinham medo de ir.
Agora o mar é livre e é seguro
E foi um português que o foi abrir.

 in 'Antologia Poética'

 Ou, ainda, neste outro extenso e belo poema:

Saudades Trágico-Marítimas

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.
Na praia, de bruços,
fico sonhando, fico-me escutando
o que em mim sonha e lembra e chora alguém;
e oiço nesta alma minha
um longínquo rumor de ladainha,
e soluços,
de além...

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

São meus Avós rezando,
que andaram navegando e que se foram,
olhando todos os céus;
são eles que em mim choram
seu fundo e longo adeus,
e rezam na ânsia crua dos naufrágios;
choram de longe em mim, e eu oiço-os bem,
choram ao longe em mim sinas, presságios,
de além, de além...

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

Naufraguei cem vezes já...
Uma, foi na nau S. Bento,
e vi morrer, no trágico tormento,
Dona Leonor de Sá:
vi-a nua, na praia áspera e feia,
com os olhos implorando
- olhos de esposa e mãe -
e vi-a, seus cabelos desatando,
cavar a sua cova e enterrar-se na areia.
- E sozinho me fui pela praia além...

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

Escuto em mim, - oiço a grita
da rude gente aflita:
- Senhor Deus, misericórdia!
- Virgem Mãe, misericórdia!
Doidos de fome e de terror varados,
gritamos nossos pecados,
e sai de cada boca rouca e louca
a confissão!
- Senhor Deus, misericórdia!
- Misericórdia, Virgem Mãe!
e o vento geme
no vulcão
sem astros;
anoitecemos sem leme,
amanhecemos sem mastros!
E o mar e o céu, sem fim, além...

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

Ah! Deus por certo conhece
minha voz que se ergue, branca e sozinha,
- flor de angústia a subir aos céus varados
p'la dor da ladainha!
Transido, o clamor da prece
do mesmo sangue nos veio
Deus conhece os meus olhos alongados;
onde o mar e o céu deixaram
um pouco de vago anseio
nesse mistério longo do seu halo...
Rezam em mim os outros que rezaram,
e choraram também;
há um pranto português, e eu sei chorá-lo
com lágrimas de além...

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

Ó meu amor, repara
nos meus olhos, na sua mágoa clara!
Ainda é de além
o meu olhar de amor
e o meu beijo também.
Se sou triste, é de outrora a minha pena,
de longe a minha dor
e a minha ansiedade.
Vês como te amo, vês?
Meu sangue é português,
minha pele é morena,
minha graça a Saudade,
meus olhos longos de escutar sem fim
o além, em mim...

Chora no ritmo do meu sangue, o Mar.

in 'Ilhas de Bruma'
......................................................................

Sintetizando, temos que em Afonso Lopes Vieira a ideia renascentista foi um modo como ele viu e sentiu naquele Movimento uma missão orientadora que desejou não ver morrer por ver nela linhas sociais e políticas que deveriam ser guias para o seu tempo e na Pátria, viu e sentiu uma Entidade fundamental, de cariz natural e linguística, donde lhe é atribuído o seu carácter activo e multifacetado que grandemente lhe influenciaram a existência, dando-lhe inspirações, quer fossem para a sua pena literária, quer para as muitas conferências a que se sentiu chamado e que ilustrou em  nome de valores artísticos e culturais de índole nacional.

Recolheu tudo isto no volume: "Em Demanda do Graal" - 1922 - e de novo com o título: "Nova Demanda do GraaL" - 1942 -  apontando-se-lhe, o facto de se ter desmarcado do Estado Novo a partir do seu despontar com o livro "Éclogas de Agora", mantendo-se fiel ao "Integralismo Lusitano".

Este Movimento ou Agrupamento sócio-político influente entre 1914 a 1932,  é pena que não ressurja com a renovação dos seus ideais para o tempo presente, porquanto a República, tal qual a conhecemos devia ser refundada, por ter um peso demasiado no erário público para desempenhar as funções que lhe cabem, assim como a centralização do Estado num Parlamento donde tudo dimana, deveria ser mais descentralizado em favor do municipalismo, como já o havia advogou, no seu tempo, Alexandre Herculano

Sem comentários:

Enviar um comentário