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segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

O acto e a consequência



Estamos ligados aos nossos actos como um fósforo à sua chama. Eles consomem-nos, é verdade, mas são eles que nos dão o nosso esplendor. E, se a nossa alma valeu alguma coisa, é porque ardeu com mais ardor do que outras.
 (André Gide)
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Todos os actos do homem são produzidos pela sua dualidade biológica e cultural pelo facto de conterem dentro de si os sentimentos fraternos e de compita que se desenvolvem de um modo que é possível a uma só criatura assumir em tempos diversos – ou em simultâneo -  a amizade ou a hostilidade para com o outro, assumindo, assim, a cultura positiva ou negativa do meio onde eles são exercidos.

Razão fundamental que levou o pensador a dizer que se estamos ligados aos nossos actos como um fósforo à sua chama, torna-se um dever de ordem cívica no âmbito biocultural da sociabilidade  humana, que todos eles, ainda que nos consumam é que nos dão o nosso esplendor, ou seja, o caminho capaz de nos conduzir à aceitação dos outros, ganhando assim todo o sentido o facto da nossa alma, pela sua valia, ter ardido com mais ardor do que outras, como uma consequência directa dos actos praticados.

André Gide ao colocar a alma como sujeito da sua tese não o fez por mero acaso ou por querer emprestar àquela forma literária um valor acrescentado, mas, porque a alma significa vida  e ao representar a própria criatura é por ela se anima e é, só por ela, que é capaz de se valorizar através dos seus actos.

O acto, é assim, uma execução cognitiva repartida em acções falhadas ou consequentes, onde se entrecruzam bioculturalmente os destinos do homem.
Fazê-lo e assumi-lo tendo em cada um deles a alma inteira na imaterialidade da sua substância, é, um dever social que cumpre a cada homem na tarefa que lhe cabe de alindar um pouco mais o mundo por onde passa.

No tempo actual, não raro topamos aqui e ali com actos de homens públicos – ou não - cujas consequências nem sempre primam pela compostura e brilhantismo, razão de que se queixa a sociedade doente que temos, onde a própria lei pelos alçapões que contém deixa campo aberto às diatribes dos menos respeitadores.

Até no campo da palavra que devia conter em si um acto consequente, o que acontece – não rato – é a constatação de muito embora se distinguirem as que se dizem das que se escrevem, se as primeiras podem voar como pardais ao vento que passa, as segundas deviam assumir sempre a coragem de quem as escreveu, o que nem sempre acontece, porquanto, muitas vezes, como temos assistido, ouvimos como resposta terem sido mal interpretadas, quando elas falavam direito e eram claras como a água da nascente.

Mas há, temos de o afirmar, homens que no cumprimento de valores mais altos, vivem assumidamente a palavra dita, dando-lhe igual ou mais valor que a palavra escrita.
São os que vivem o acto e a consequência, tendo como mira dentro do seu ínfimo metro quadrado a intenção garbosa de mudar o mundo, ao comprometerem-se com as palavras que dizem, porque conhecem o seu valor e ao invés, conhecem o desvalor e as trapaças dos mentirosos.

Eis, porque, ainda que os nossos actos – se tenderem ao bem colectivo – ainda que nos consumam, no dizer de André Gide, tem de ser por eles que devemos atingir o esplendor, na certeza que a alma que assim procede se vale alguma coisa, é porque ardeu com mais ardor do que outras.

Neste dia de Ano Novo é meu propósito assumir com frontalidade que ele será  o reflexo dos meus actos e é meu desejo que as suas consequências sejam benignas, por ser daí que advém o segredo da felicidade temporal, sabendo que vivo como se os meus actos fossem um fósforo ligado à sua chama.

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