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sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

"Raízes" Um poema do exílio de Sidónio Muralha


Canta Amália Rodrigues

Raízes

Velhas pedras que pisei
saiam da vossa mudez
venham dizer o que sei
venham falar português
sejam duras como a lei
e puras como a nudez.

Minha lágrima salgada
caiu no lenço da vida
foi lembrança naufragada
e para sempre perdida
foi vaga despedaçada
contra o cais da despedida.

Visitei tantos países
conheci tanto luar
nos olhos dos infelizes
e porque me hei-de gastar?
vou ao fundo das raízes
e hei-de gastar-me a cantar.

Sidónio Muralha

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Amália Rodrigues com a sua voz ímpar deu vida a este poema inspirado do Poeta Sidónio Muralha, que viveu numa sociedade marcada pela pobreza e desigualdade social a que se agigantava o autoritarismo imposto pelo Estado Novo a partir de 1933.

Por esse tempo como aconteceu com outros intelectuais Sidónio Muralha exilou-se voluntariamente e acabou por se fixar no Brasil.

Ao sentir muito difícil o seu retorno a Portugal, o exílio e a saudade ditaram o poema "Raízes" que é na sua temática um grito de alma que o leva a desafiar as pedras dos caminhos que pisou em Portugal para que falassem e o fizessem em  português antigo, longe da ditadura que o levou a verter a sua lágrima salgada, caída no lenço da vida, como aconteceu com tantos outros homens da cultura.

Vale a pena ler e ouvir este poema de desgosto pátrio cantado por Amália Rodrigues em cuja voz a saudade do Poeta é um ariete lançado contra um tempo padrasto que Portugal viveu, e como diz o poema, foi uma vaga despedaçada / contra o cais da despedida, porque, como aconteceu com o Poeta nascido no bairro da Madragoa, em plena Lisboa que o não soube acarinhar se finou. exilado, em terras do Paraná, desse Brasil que o acolheu.

Lembro, pois, com todo o carinho, Sidónio Muralha e atrevo-me a pedir a quem me ler que vá atrás da escrita que ele nos deixou e, com ela, reviva um homem grande do século XX português atiçando a memória dos que o esqueceram.

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