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sábado, 27 de janeiro de 2018

Dois sonetos de Virgínia Vitorino


Renúncia

Fui nova, mas fui triste... Só eu sei
Como passou por mim a mocidade...
Cantar era o dever da minha idade,
Devia ter cantado e não cantei...

Fui bela... Fui amada e desprezei...
Não quis beber o filtro da ansiedade.
Amar era o destino, a claridade...
Devia ter amado e não amei...

Ai de mim!... Nem saudades, nem desejos...
Nem cinzas mortas... Nem calor de beijos...
Eu nada soube, eu nada quis prender...

E o que me resta?! Uma amargura infinda...
Ver que é, para morrer, tão cedo ainda...
E que é tão tarde já, para viver!...




Eu que cheguei a ter essa alegria

Eu que cheguei a ter essa alegria
de junto ao meu possuir teu coração!
Eu que julgava eterna a duração
do voluptuoso amor que nos unia,

sou ‒  apagada a última ilusão,
morto o deslumbramento em que vivia,
—  um cego que ao lembrar a luz do dia
sente mais negra ainda a escuridão.

Tu me deste a ventura mais perfeita,
perdi-a e dei-te a chama insatisfeita
dessa imensa paixão com que te quis…

Hoje, o que eu sinto, inútil, revoltada,
não é mágoa de ser desgraçada,
—  é pena de  ter sido tão feliz.
.....................................................................................

Ante estes dois sonetos dessa ilustre filha de Alcobaça que a Literatura Portuguesa conhece pelo nome de  Virgínia Vitorino, apetece fechar os olhos, reflectir na sua mensagem e render silenciosamente uma homenagem sentida à poetisa e dramaturga, agraciada pelo Governo português em 1929 e 1932 e pelo Governo espanhol em 1930 e, hoje, indevidamente esquecida por um Poder que não preza a Cultura nem o nome dos que lhe deram a Verdade do seu nome.

Deus que é bom e conhece todas as criaturas que passaram e souberam escrever o seu Nome, tenha no assento etéreo e no lugar devido a chama da sua alma que foi um lume que se apagou no tempo que lhe foi dado viver, mas cujo calor continua a viver nas suas poesias, como estas que são um marco existencial que continua a marcar caminhos.

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