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quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Em memória de Antero de Quental


Fac-simile da capa da  Revista "O Ocidente" de 1 de Outubro de 1891
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Esta famosa publicação que se publicou entre o último quartel do século XIX  e findou ao fim dos primeiros catorze anos do século XX, com esta sugestiva moldura homenageou o notável Poeta português, natural da Ilha de S. Miguel (Açores) no acto da sua morte inesperada e cruenta que ele mesmo causou, em Ponta Delgada, no dia 11 de Setembro de 1891, após anos de uma luta existencial que lhe não resolveu a procura da sua mente, cujo estado de depressão permanente nos últimos anos de vida o conduziram até ao Campo de S. Francisco, onde num banco adjacente ao Convento de Nossa Senhora da Esperança, com dois tiros acabou com a vida.

Aconteceu isto ao findar o dia, ou seja, aconteceu quando pondo-se no ocaso a claridade do dia, com ele também se pôs no ocaso a esperança que lhe restava, deixando para os vindouros a dúvida se a escolha do local do Convento denominado "da Esperança" não fora escolhido propositadamente, para dizer com a mudez da sua morte violenta que naquele edifício eclesial, onde se falava de "Esperança", a sua morrera para sempre.

E morreu.

O que não morreu foi a memória dos seus versos, como este:

Na Mão de Deus

Na mão de Deus, na sua mão direita,
 Descansou afinal meu coração.
 Do palácio encantado da Ilusão
 Desci a passo e passo a escada estreita.

 Como as flores mortais, com que se enfeita
 A ignorância infantil, despojo vão,
 Depois do Ideal e da Paixão
 A forma transitória e imperfeita.

 Como criança, em lôbrega jornada,
 Que a mãe leva ao colo agasalhada
 E atravessa, sorrindo vagamente,

 Selvas, mares, areias do deserto...
 Dorme o teu sono, coração liberto,
 Dorme na mão de Deus eternamente!

 "Sonetos"


Sempre que leio e medito neste soneto de Antero de Quental o sentimento que desce até ao mais íntimo de mim mesmo é a sua crença no Deus Eterno, onde não soube encontrar respostas que satisfizessem a sua alma interrogativa, que andou pela vida a fazer perguntas à sua ânsia de uma verdade que nunca lhe deram, nem o homens nem os livros sacros, mas que ele, crente num Deus que sabia existir, não pode abjurar, deixando em memória desse Alto Espírito o seu poema - NA MÃO DE DEUS - que é uma confissão da esperança existencial que não tendo resolvido em vida, ali, junto ao Convento da Esperança, naturalmente sentiu que o Deus que morava lá dentro - e ele não achou fora - o levou pela mão e o conduziu a caminho da Esperança da vida imortal.

Antero de Quental foi doente dos médicos Sousa Martins e Curry Cabral por volta de 1874, tendo-os consultado com o fim de lhe debelarem uma doença do foro neurológico de que nunca se restabeleceu, e esta nevrose aliada a projectos que ruíram e sobre os quais se pôs o grande problema de existência - para ele vã e incompreensivel - não lhe tendo bastado a filosofia panteísta voltou-se para a aspiração do Nirvana budista na procura de encontrar satisfação nos estóicos e no livro das máximas de Epicteto, o que o levou a admitir que a fé não era património do cristão, porque ela existia na Filosofia idealista e foi neste marulhar de sentimentos que gravitou a sua doença de saber respostas às verdades existenciais.

Eça de Queirós, num certo dia apelidou-o de "Santo Antero" e eu fico a pensar que o fez porque ele assim o merecia, pela lutas sociais que travou em prol dos mais desvalidos e para os quais desejou que sobre eles raiassem  os novos ventos de liberdade que havia noutros locais mais abertos a um tempo mais solidário da sociedade esquecida pelos poderosos que em Portugal tardaram a abrir a esse ideal as suas mentes tacanhas, supostamente liberais, mas afectas a princípios de totalitarismos bacocos.

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