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quinta-feira, 3 de outubro de 2013

João Lúcio (1880-1918)

 

in, opúsculo "Biografia" do Poeta João Lúcio, por Edgar José Pires Cavaco
 
 
Em subtítulo, no trabalho que dedica a João Lúcio,  Edgar José Pires Cavaco, assinala: "Do imerecido esquecimento ao ignoto desconhecimento" o que não deixa de constituir, pela crueza das palavras a verdade que em Portugal, por uma omissão intelectual de um Órgão, que, ora, sem nunca ter existido na orgânica do poder instituído, ora, quando existiu, nem sempre dedicou a atenção devida aos fautores da palavra que se faz verso.
O Poeta de seu nome completo João Lúcio Pousão Pereira nasceu em Olhão no ano de 1880 e faleceu em 1918, vitimado pela "gripe pneumónica".
A sua primeira composição poética viu a luz do dia, tinha ele 12 anos de idade e foi publicada pelo jornal "O Olhanense".
Em 1897 matriculou-se na Universidade de Coimbra, onde se formou em Direito, vindo a exercer esta profissão na sua terra natal, tendo dirigido o jornal "O Sul" que se publicava em Faro.
Em 1906 é eleito para a Câmara dos Deputados integrado na ala que apoiava João Franco, tendo por este sido nomeado Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Olhão.
Caído o regime franquista por força do assassinato do rei D. Carlos, conservando, embora o seu pendor monárquico, com a Implantação da República abandonou a vida política.
Em 1914, a convite de Teixeira de Pascoaes que o convence a tomar assento na "Renascença Portuguesa" passa a colaborar no jornal "A Águia".
O Algarve é um dos temas preferidos da sua poesia.
A obra conhecida resume-se aos seguintes livros:
"Descendo" (1901) ; "O Meu Algarve" (1903) ; "Na Asa do Sonho" (1912) e postumamente, em 1921 apareceu o livro: "Espalhando Fantasmas", tendo-se encarregado da sua publicação vários admiradores do Poeta.
Em 1925 os seus conterrâneos, em sua memória erigiram uma estátua, no Jardim que tomou o seu nome, situado na Av. da República.
Amante da Natureza, em muitos passos a sua poesia melódica, de pendor saudosista, age directamente da decorrência da sua atitude perante o mundo e por aquilo que o rodeava.
É, disso um exemplo, o poema intitulado A DOR DAS PEDRAS, do seu livro: "Descendo".

Ó pedras a sofrer, em ânsias nas calçadas,
Ninguém vos sabe amar, ninguém de vós tem dó,
Ninguém sabe entender, ó pedras desgraçadas,
Que há lágrimas também dentro do vosso pó!

Passam, por sobre vós, tanta dor e alegria,
Olhos em que há prazer, olhos em que há tormento,
E ninguém vos consola e queima-vos o dia
E quási sempre a rir, insulta-vos o vento!
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Não deixa de haver aqui, com efeito, um pendor nostálgico e subjectivo, advindo de um certo saudosismo advogado por Pascoaes, do tempo em que João Lúcio esteve ligado ao movimento da "Renascença Portuguesa" onde  burilou a sua criação poética, espiritualizando-a, e de que nos dá um exemplo na "vida" que dá ao corpo inanimado da pedra da calçada, onde retrata a dor, como se fosse humana.
Mas é, no naturalismo que João Lúcio encontrou, verdadeiramente, o sentido profundo da sua poesia, mergulhando-a no espaço que tinha debaixo dos seus sentidos e, em que, o belo poema NA TARDE DE LEITE E ROSA, OUVINDO A FLORESTA, nos dá a grande dimensão da alma ao deixar inscrito num quadro rústico, a beleza vivida numa determinada tarde, em  que apresenta, como se fosse um hino fundado na elevação dos seus sentidos apurados, o amor que o faz cantar no pensamento.


Tarde de leite e rosas. Cada aresta
Tinha um rubi tremente:
Fomos ouvir o canto da floresta,
O seu canto de amor, ao sol poente.

Tu querias sorver os poderosos
Lamentos de saudade e comoção
Que as raízes, dos fundos tenebrosos,
Mandavam, pelo ramo, para o chão.

Opalescera já, o ar. O vento,
Correndo atrás da sombra, murmurou...
Sentiu-se um fechar de asas. Num momento
A floresta cantou.

Em cada ramo um violino havia;
Cada folha vibrava ágil, sonora.
Par'cendo que escondia uma harmonia
Nas sombras das ramagens, a Aurora.

Como a floresta, meu amor, eu tento
Atirar o meu canto para a altura;
Para a fazer cantar, toca-lhe o vento,
P'ra me fazer cantar, no pensamento,
Passa o sopro da tua formosura.

in, "Na Asa do Sonho"

João Lúcio foi ceifado pela morte em plena produção literária, mas o que ficou dele bem merecia ser lembrado.
O que aqui fica é uma tímida lembrança, mas é um testemunho do homem, que afinal, tem de continuar "vivo" na memória dos homens e do tempo que passa.
 


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