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quinta-feira, 19 de abril de 2018

"Quando vier a Primavera"

CANÇÕES DE PRIMAVERA
Quadro de W. Bouguereau - in, Revista "Serões" - Março de 1906
                             
Quando Vier a Primavera

 Quando vier a Primavera,
 Se eu já estiver morto,
 As flores florirão da mesma maneira
 E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
 A realidade não precisa de mim.

 Sinto uma alegria enorme
 Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

 Se soubesse que amanhã morria
 E a Primavera era depois de amanhã,
 Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
 Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
 Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
 E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
 Por isso, se morrer agora, morro contente,
 Porque tudo é real e tudo está certo.

 Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
 Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
 Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
 O que for, quando for, é que será o que é.

Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
 Heterónimo de Fernando Pessoa
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A Primavera está aí e este poema lembra-nos que "está connosco" a lembrança Fernando Pessoa com os seus heterónimos inventados pelo seu génio, para nos darem na beleza da poesia, momentos como este, em que numa canção que parece ser triste, sem o ser, porque ela é um reflexo da verdade existencial de cada homem e da sua finitude temporal e, por isso, depois da vida ceifada "tudo está certo", e à volta da sua lembrança - porque já não há "preferências" - tudo continuará igual, porque a vida na sua canção eterna jamais deixará de cantar a melodia da sua existência e da sua morte.

E é, por isso, que "o que for, quando for, é que será o que é" e as "flores florirão da mesma maneira", assim acaba e começa este poema para dizer a todos os mortais que no usufruto da vida devem  compor o canteiro das flores mais olorosas...

Depois, elas continuarão a florir em cada Primavera no fruir constante e inexorável da Grande Roda da Vida...

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