DE NOITE
Desceu de há muito a noite
silenciosa.
A lua, como um lírio imaculado.
Abre o cálix d'amor, uma saudosa,
No azul d'astros serenos
cravejado.
Quem me dera sonhar o meu noivado
Naquela estância doce e misteriosa,
E aspirar-te os perfumes, branca
rosa,
Longe das garras cruas do Pecado.
Talvez que se eu vivesse nesses
mundos.
Calados, cheios de segredos
fundos.
Te seguisse do alto dos espaços,
E estrela ou nuvem solitária, um
dia
Cairá inerte, inanimada e fria
No abismo luminoso dos teus
braços...
Joquim de Araújo
Lisboa, 1878
in, "Portugal Pitoresco" - Vol. I (Grafia actual)
Neste meu peregrinar pelas riquezas bibliófilas que o século XIX nos deixou, aconteceu, hoje, pousar os olhos e a minha atenção sobre este soneto assinado por Joaquim de Araújo, um ilustre filho de Penafiel e cuja arte poética encheu páginas como esta de um conceituado cunho lírico, onde o Poeta, um visionário da NOITE dando asas ao seu sonho, consegue "ver" No azul d'astros serenos cravejado, todo um romance idílico em que - se fosse possível, feito estrela - havia de seguir do alto dos espaços para cair No abismo luminoso dos braços da sua musa.
É poesia como esta, em que o estro vai solto e puro a criar quadros de beleza que se podem pendurar nas paredes da alma, que o Poeta atinge a aura que o distingue do vulgar dos mortais.
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