Preclaro, como acontece nas suas crónicas, o escritor Miguel Sousa Tavares deixa entrever na sua prosa acutilante e cheia de sentido social o facto da assunção das diferenças de gostos marcar a baliza entre o autoritarismo e a liberdade de pensar e agir, com o seu texto: "O Suicídio da Esquerda Democrática" publicado no primeiro caderno do Jornal "Expresso" de 10 de Novembro de 2018, que é na sua análise assisada um aviso sério àquilo que está a acontecer ante os nossos
olhos, em que, paulatinamente, a coberto da democracia, a imposição de gostos de
satisfação pessoal - como aquele que tomou de assalto a actual ministra da Cultura fazendo-os valer para o colectivo como regra - são um despautério, porque se escondem neles imposições radicais de uma opinião pessoal para impor
uma política de tom moralista e civilizacional contra os que
não pensam como a detentora da pasta da Cultura e todos fossem - onde me incluo - uns incivilizados.
Vem tudo isto a propósito da ministra ter dito, a propósito da tauromaquia que "não é uma questão de gosto, é uma civilização", donde se pode concluir que a imposição na generalidade de uma ditadura de gosto é descriminatória e, logo, violadora da letra da Constituição, pelo que ao não querer baixar o IVA para a tauromaquia para os 6% - admitindo-o para os outros espectáculos ao ar livre - disse "alto e bom som" que "todas as políticas públicas têm na sua base valores civilizacionais que partilhamos e as civilizações evoluem".
E, mais à frente com a argúcia que o caracteriza, diz mais isto:
"Mas o que não podia nunca era ter invocado o seu gosto
e a sua opinião pessoal sobre as touradas para justificar uma política fiscal
sobre os espectáculos — e se ela não gostar de circo ou de ballet? E,sobretudo,
não podia nunca tê-lo feito num tom moralista e ‘civilizador’ sobre os que têm
opiniões diferentes da sua e que arrogantemente despachou como incivilizados,
bárbaros, selvagens — e que por ora castiga fiscalmente e que amanhã, em
podendo, tratará como foras-da-lei e perseguirá criminalmente. Manuel Alegre
tem toda a razão: são atitudes destas que fazem nascer os Bolsonaros. Mas eu
vou ainda mais além: não vejo diferença alguma entre atitudes destas — só
porque, alegadamente,vêm de uma esquerda urbana e auto declarada civilizada — e
as atitudes de um Bolsonaro. Em ambas existe a mesma fé na missão de educar o
povo, de lhe impor uma ditadura de comportamento e de gostos e de lhe impingir
as novas ‘verdades’, sejam as das redes sociais, sejam as do politicamente
correcto — que mais não são do que expressões de um terrorismo ideológico, que
dispensa as pessoas de pensar por si próprias".
Atenção, pois.
Não é admissível que o Partido Socialista - de génese
fundacional livre e respeitador dos gostos de todos os portugueses - para
agradar aos seus parceiros da esquerda totalitária, mormente o BE e o PAN,
cujos votos lhe podem fazer falta numa futura eleição, entre por esta deriva de
querer impor o gosto de um qualquer dos seus ministros ao colectivo da Nação,
que é lá que se têm de arranjar as amas para os combates contra os extremismos
por demais emergentes, na actualidade, pelo que neste ponto sirvo-me de novo da
prosa viva, sentida e muito firme da parte final da brilhante crónica de Miguel
Sousa Tavares, quanto à defesa que é preciso fazer e é tarefa de todos nós:
O nosso Partido Socialista pode pensar que nada disto o deve
preocupar. Que a classe média está encantada com os indicadores económicos da
conjuntura, com as Web Summits, os ALD, o crédito barato e tantas outras
ilusões que no passado nos saíram tão caras. Pois, talvez sim e talvez não. E
se estiver apenas adormecida e um dia acordar virada para a direita? E a única
direita que houver para a acolher for a que por aí abre caminho?
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