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terça-feira, 6 de agosto de 2013

A Suprema Felicidade

Foto de um diaporama da qual desconheço o autor
e a quem agradeço a benevolência de alguma ilicitude cometida
  
 Cabra-Cega
 
À volta de incerto fogo
 Brincaram as minhas mãos.
 ... E foi a vida o seu jogo!

 
 Julguei possuir estrelas
 Só por vê-las.
 Ai! Como estrelas andaram
 Misteriosas e distantes
 As almas que me encantaram
 Por instantes!

 
 Em ritmo discreto, brando,
 Fui brincando, fui brincando
 Com o amor, com a vaidade...

 
— E a que sentimentos vãos
 Fiquei devendo talvez
 A minha felicidade!
 
 
Pedro Homem de Mello, in "Jardins Suspensos"
 
 
Victor Hugo para além do grande escritor que foi, deixou-nos máximas onde o seu pensamento voou até às profundezas do seu ser para nos dizer tal como se expressa, que "a suprema felicidade da vida é a convicção de ser amado por aquilo que você é; ou, mais correctamente, de ser amado apesar daquilo que você é".
O Poeta Homem de Melo no poema que vai acima, colocou o estro da sua poesia adulta e eivada de um lirismo pagão na segunda parte da máxima de Victor Hugo, ao referir que no jogo da vida, o homem - depois de ter brincado com o amor, com a vaidade... não hesita em declarar, que foi, até, a sentimentos vãos que ficou devendo a sua felicidade, ou seja, apesar da inconstância ou imperfeição de alguns sentimentos - que, possivelmente, pediam mais atenção e pureza - sentiu-se amado, pesasse embora o jogo da cabra cega vivido e que dá o nome ao poema.
Temos assim, que a suprema felicidade se pode residir, naturalmente, em nos sentirmos amados por aquilo que fazemos - dentro da "perfeição" possível à nossa humanidade que carrega consigo o selo do imperfeito - também pode existir e com a mesma intensidade, no dizer de Victor Hugo, quando nos sentimos amados apesar das nossas imperfeições, recebendo a amizade ou o amor do semelhante, descontados que são na balança dos sentimentos os passos mal dados ou faltas de gentilezas cometidas.
Pode parecer desconexo falar deste jeito, mas não é.
A inconstância humana - que pode levar alguém a refrear o modo amistoso dos princípios da amizade ou do amor - não raro, começou por ser uma constância quase perfeita de actos e atitudes, que o outro, no tempo em que se dá o arrefecimento dos sentimentos,  quantas vezes, sem se aperceber, põe a render  o espirito paulino da Carta aos Colossensses (3,14) que nos recomenda: e sobre tudo isto revesti-vos do amor que é o vinculo da perfeição e, continua com o mesmo ardor a considerar ou a amar, quem aos olhos do mundo pouco merece.
La Rochefoucauld, nas suas "Reflexões" escreveu isto:

Não pretendo justificar aqui a inconstância em geral, e menos ainda a que vem só da ligeireza; mas não é justo imputar-lhe todas as transformações do amor. Há um encanto e uma vivacidade iniciais no amor que passa insensivelmente, como os frutos; não é culpa de ninguém, é culpa exclusiva do tempo.
No início, a figura é agradável, os sentimentos relacionam-se, procuramos a doçura e o prazer, queremos agradar porque nos agradam, e tentamos demonstrar que sabemos atribuir um valor infinito àquilo que amamos; mas, com o passar do tempo, deixamos de sentir o que pensávamos sentir ainda, o fogo desaparece, o prazer da novidade apaga-se, (...)

Observa bem a natureza humana o estimável escritor.
Felizes pois, são todos aqueles que depois de terem arrefecido a chama do princípio e, até, de terem vivido com sentimentos vãos, como diz o Poeta Homem de Melo, apesar de tudo isso, ficam a dever a sua felicidade a causas que podiam ser adversas e só o não são, porque tiveram a felicidade de encontrar no semelhante algum perdão compreensivo para faltas cometidas ou sentimentos frívolos que se viveram.



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