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quinta-feira, 18 de abril de 2013

O NOVO BOI ÁPIS

Gravura publicada no Jornal "O António Maria" de 6 de Janeiro de 1881

Merece a pena recordar aos mais distraídos a história resumida do boi Ápis.
Situemo-nos em Mênfis, no antigo Egipto. Numa vereda erguiam-se as ruinas de um templo onde se encontrava embalsamado o boi Ápis, que passava por ser um animal merecedor da maior reverência, por ser o símbolo da força e virilidade, dividindo uma estranha parentela com o poderoso faraó, ostentando uma parte animal e outra de deus, tendo merecido o culto do povo devido ao seu invulgar conjunto de sinais, que em vida lhe mereceram ostentar-se num santuário, espalhando a crença que a sua essência divina era transferida para outro boi, quando morria.
A gravura que reproduzimos deve-se à pena genial de Rafael Bordalo Pinheiro, a quem prestamos o dever de o honrar com carinho e admiração, pedindo licença à sua memória ilustre para o transportar para este pequeno apontamento, ilustrando, porventura com pouca arte o que ele caricaturou.
Não podemos, porém, deixar sem uma crítica que julgamos construtiva, a denúncia do que se passa com a actual Constituição que vai regendo o nosso povo e que, à semelhança do boi Ápis, alguns julgam que, - pesem embora os ajustes que tem tido - não se pode tocar, embalsamando-a, como aconteceu com o velho animal de Mênfis e sendo-lhe, por isso, merecidas todas as honras, como se ela fosse objecto merecedor de um santuário quando se impõe revê-la mais uma vez.
É quase um culto, o que acontece por parte de uns bem pensantes, segundo o seu ângulo de visão dos acontecimentos - que não é o meu -  mas que, parece, não deram pela passagem do tempo, com a agravante dela ser lida, julgada e seguida por homens que não podem fazer outra coisa senão a de seguir a lei dos parlamentares, mas com o defeito, em nosso entender,  de serem escolhidos pelos mesmos que a criaram num tempo bem diferente, chamando por nomes feios aqueles que dizem que ela deve ser revista na hora que passa.
Mas... não senhor.
Ela é um novo boi Ápis, num tempo em que os deuses morreram e o Deus Eterno que devia agir em todas as consciências não merece uns momentos de pausa de alguns no agnosticismo que os conduz, ainda que a sua teimosia os leve a não ver no dia claro a noite em que Portugal se afunda.
Não esqueçamos, porém, olhando a gravura do mestre Bordalo Pinheiro que o Zé Povinho está de joelhos implorando a revisão que tarda aos que conduzem num andor o boi Ápis que foi criado em S. Bento e só lá é que tem de ser revisto à luz de um tempo novo, pois é nele que mora a esperança do Zé Povinho deixar a sua incómoda posição de joelhos em cima do chão duro da vida.

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