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quarta-feira, 4 de junho de 2014

O fascínio do olhar!





Seus Olhos

Seus olhos - que eu sei pintar
O que os meus olhos cegou -
Não tinham luz de brilhar,
Era chama de queimar,
E o fogo que a ateou
Vivaz, eterno, divino,
Como facho do Destino.

Divino, eterno! - e auave
Ao mesmo tempo: mais grave
E de tão fatal poder,
Que, um só momento que a vi,
Queimar toda a alma senti…
Nem ficou mais de meu ser,
Senão a cinza em que ardi.

Almeida Garrett, in “Folhas Caídas”


Passada a sua fase revolucionária que perdurou pelos anos 20 a 30 do século XIX, Almeida Garrett deixou para a posteridade uma vida tão cheia, como cheia de encanto é a sua obra literária, donde sobressai a parte poética, uma das riquezas de que se pode orgulhar a geração de que ele fez parte e importante.

Pode afirmar-se convictamente que o poema "Seus Olhos" foi dedicado à Viscondessa da Luz, Rosa Montufar com quem Garrett se relacionou a partir de 1846, tendo feito dela  a musa inspiradora das "Folhas Caídas", o livro admirável que o ajudou a tomar o assento firme que justamente goza nas Letras Portuguesas.

O poema, com efeito, faz parte do acervo que informa tão célebre livro, num tempo em que o Poeta andava perdido de amores pela bela andaluza, com quem viria a romper na Primavera de 1849, ao que se conta, roído de ciúmes, tendo-se acolhido em casa de Alexandre Herculano, então morador na Ajuda.

Falecido em 1854, em pleno cemitério dos Prazeres, atribui-se a Rodrigo da Fonseca Magalhães - o politico liberal  e uma das primeiras figuras da "Regeneração" - o chiste que ficou famoso, até pela sua crueldade: Morreu abraçado à Cruz com os olhos na Luz, querendo assim demonstrar o drama amoroso que se abateu sobre a sensibilidade de Almeida Garrett, mas falando sem pudor sobre algo que ele viveu arrebatadamente, em nome de um ideal de amor que viu espelhado nos olhos ardentes e fatais da Viscondessa da Luz.

Valha a verdade dos dois últimos versos que nos dão a imagem verdadeira da amargura que tomou conta da sua vida e, através dos quais, podemos aquilatar sobre o que ele considerou ser a cinza de uma brasa que viu arder e o viria a queimar


Nem ficou mais de meu ser,
Senão a cinza em que ardi.


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